O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse em entrevista que os juros no Brasil em breve chegarão a um dígito. Referia-se a juros reais, descontada a inflação. Uma meta ambiciosa, já que a Selic, taxa básica dos juros da economia brasileira, ditada pelo Conselho de Política Monetária (Copom) do Banco Central, estava em 26,5% e na semana passada baixou apenas meio ponto percentual, ficando em 26%. Pouco antes, o ministro da Fazenda, Antônio Palocci Filho, falou em esquartejar a inflação. E as armas para isso seriam as taxas de juros, que, no Brasil, sobem como foguetes destinados a fazê-la em pedaços.

Logo depois de falar em juros de um dígito, Lula corrigiu, dizendo que se tratava de um objetivo, uma meta, um sonho a ser alcançado e não uma efetiva promessa. E acentuou que seriam de um dígito os juros reais, descontada a inflação, para que não se pensasse que cairia de 26% para 9, 8, 7 ou talvez até menos. Pessoas e instituições respeitáveis consideram que, pelo menos através dos caminhos que o Brasil tem percorrido, essa baixa da taxa de juros é impossível. Que os juros são mantidos altos para evitar a quebradeira dos bancos. Esta a conclusão de estudo do economista Alberto Borges Matias, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP (Universidade de São Paulo), de Ribeirão Preto.

Matias calcula que “se o governo baixar a Selic para 10% ao ano, de uma vez, o sistema bancário nacional quebra em um ano e meio”. Com a Selic nesse patamar, teríamos um juro real em torno de 2%, média praticada pelos demais países emergentes.

O nosso governo garante que mantém os juros altos para “esquartejar” a inflação, manter o câmbio controlado e garantir a entrada de capitais no País. O professor da USP assegura que “nenhuma dessas afirmações tem comprovação científica”. Ao contrário, seu estudo mostra que, quando aumenta a taxa Selic, a inflação sobe junto, numa correlação de 53%. As empresas repassam o aumento dos custos financeiros aos preços. A alta do dólar também não pára. Após a liberação cambial, a correlação entre juros e câmbio foi insignificante, de menos de 8%. Sobre os juros altos evitarem a evasão de capitais, Alberto Borges Matias lembra que “no mundo inteiro as taxas de juros são bem inferiores às brasileiras e não há evasão de capital”.

O estudo afirma que os bancos brasileiros dependem de juros altos para sobreviver, porque têm uma estrutura de custos, em relação às suas operações de crédito, muito acima dos padrões internacionais. As despesas com pessoal e administrativas correspondem a menos de 5% da carteira de crédito dos bancos, a nível internacional. No Brasil, vão de 15% a 38% da carteira de crédito, dependendo do banco. Conclui o professor que isso ocorre porque, historicamente, os bancos brasileiros oferecem pouco crédito.

Ele acrescenta que, no mundo inteiro, os bancos vão buscar lucros em suas operações ativas, de empréstimos, mas no Brasil o governo considera que os empréstimos são inflacionários, geram consumo e pressão sobre os preços. Os bancos também são vítimas dessa política, pois são atingidos por elevados depósitos compulsórios no Banco Central e levados a emprestar as suas disponibilidades ao próprio governo.

Pouco depois de divulgado esse estudo do professor brasileiro, o Fundo Monetário Internacional divulgou documento criticando o setor bancário do Brasil por ser muito concentrado e pouco eficiente. E, em seguida, fez o mesmo o subsecretário do Tesouro norte-americano, Randal Quarles.

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