O presidente Luiz Inácio Lula da Silva experimenta, sem a menor dúvida, momentos auspiciosos da administração que se aproxima dos meados do segundo mandato, contabilizando índices invejáveis de aprovação popular. Poucos presidentes, desde que os brasileiros voltaram a eleger pelo voto direto o supremo mandatário após o encerramento do ciclo de eleições indiretas pelo Congresso Nacional, tiveram a ventura de ostentar índices tão elevados de popularidade, resultantes em grande medida do atrelamento a uma conjuntura econômica mundial que infelizmente começa a trazer preocupações aos observadores, mas também ao sucesso de programas sociais lançados pelo governo, dentre eles o Bolsa Família, responsável pela melhoria flagrante do nível de vida de milhões de pessoas carentes.
Decerto não foi outra a motivação do deputado Devanir Ferreira (PT-SP), entusiasta declarado do terceiro mandato para o presidente Lula, que em mais de uma ocasião tentou convencer o presidente da Casa, o também petista Arlindo Chinaglia, a colocar na ordem do dia a proposta de emenda constitucional instituindo o direito do titular da Presidência da República a disputar o cargo pela terceira vez consecutiva. Até aqui, o deputado Chinaglia tem resistido aos arreganhos insistentes de Devanir e outros defensores da proposta, além de comentar em privado que enquanto for presidente da Câmara, matéria desse naipe nunca será colocada em discussão e votação.
A posição de Chinaglia é coincidente com a reação esboçada pelo próprio presidente Lula tão logo foi informado da intenção do antigo companheiro de lutas sindicais no ABC, reiterando que a idéia jamais passara por sua cabeça e que qualquer movimento nesse sentido só trará prejuízos à democracia. Mesmo tendo se referido ao assunto inúmeras vezes, sempre deixando clara a sua indisposição com o tema, o presidente não conseguiu convencer a brigada de condoreiros do terceiro mandato a botar a viola no saco.
Com efeito, a intensa aprovação popular estimula arroubos de autoconfiança e bajulação, como o ocorrido na viagem de Lula a Manaus no começo da semana. Ele ouviu do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, uma versão derivada da tese do terceiro mandato. A proposta, é de reconhecer, não deixa de ter seu fascínio, mas como as demais que estão em pauta, para dizer o mínimo, elevou em alguns graus o termômetro que mede o constrangimento do presidente da República. De acordo com o ministro, a altíssima popularidade de Lula garantirá a tranqüila eleição do sucessor em 2010, abrindo as portas para o retorno triunfal em 2014. Testemunhas da conversa que ocorreu durante o vôo revelaram mais tarde aos jornalistas que Lula interrompeu a digressão de Nascimento, afirmando não ser homem de criar esse tipo de embaraço ao sucessor. Quem for eleito em 2011 terá o direito legítimo de pretender governar também por oito anos, doutrinou, dando plena quitação ao instituto que lhe possibilitou o segundo mandato. Integrava também a comitiva presidencial a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, sabidamente a pré-candidata mais credenciada do lulismo à sucessão, numa chapa que provavelmente terá na vice-presidência o deputado Ciro Gomes (PSB-CE). Dizem que ela permaneceu em completo silêncio.
A catilinária presidencial vale tão-somente no caso de vitória dos candidatos apoiados por sua coligação. A iniciativa por enquanto é isolada e tem origem nos setores do PMDB sempre prontos a incentivar a marcha para a candidatura própria. É difícil avaliar, entretanto, o grau de confiabilidade da proposta e o nível de controle sobre a estrutura partidária da parte dos que se inclinam a seguir nessa direção. Na verdade, eles teriam de medir forças com Sarney, Jucá, Barbalho, Geddel e Hélio Costa, entre outros, nem um pouco dispostos a abrir mão dos dividendos obtidos da íntima relação com o governo.
Perdendo em 2010, aí sim Lula fará das tripas coração para voltar quatro anos depois.
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