(IPC – 84,32%) ou (BTNF – 41,28)

Em março de 1990 experimentamos o amargo seqüestro das nossas aplicações bancárias através do desastrado “Plano Collor”, além de outras medidas governamentais que até hoje vêm maltratando a população brasileira nos mais diversos segmentos.

Dentre outras discussões judiciais podemos citar o debate relativamente à correção dos depósitos bancários retidos (seqüestrados), das contas do FGTS, dos salários, dos empréstimos em geral, aí incluídos aqueles mútuos nos contratos regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação, etc.

Em relação ao reajuste dos empréstimos tomados sob as regras do sistema financeiro da habitação, inicialmente pelo andar das decisões de nossos Tribunais parecia que a tese vencedora seria aquela que aceitava a correção através do IPC (84,32%), e não do BTNF (41,28%), até que a jurisprudência passou a mudar seu entendimento, chegando, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, através de reunião do seu Pleno, por dez votos a oito, decidir que o reajuste do saldo devedor nos contratos do SFH aplica-se o BTNF (41,28%).

Dentre os principais fundamentos lançados pela maioria vencedora, o voto condutor baseou-se no fato de que deve prevalecer as mesmas regras aplicadas para correção da poupança, que foi o BTNF, tendo-se que ser visto como o verso e o reverso de uma mesma moeda. (Resp. 268707). Portanto, não é possível aplicar-se dois pesos e duas medidas para situações judicialmente idênticas.

A minoria vencida motivou posição contrária ao argumento segundo o qual a correção do saldo devedor dos contratos sob as regras do SFH não se confunde com a correção da Caderneta de Poupança e do FGTS.

Ao nosso ver, cuida-se de questão idêntica quando se fala em correção de valores relativamente à inflação do mês de março/1990.

Por isso, cremos que mais correta seja a posição segundo a qual a correção do saldo devedor dos contratos regidos pelas regras do SFH deve-se aplicar o BTNF.

Sobre esta questão, adicionamos aos argumentos já existentes também o fato de que aos salários dos trabalhadores não foi reconhecido pela Justiça o direito o reajuste pelo IPC, cuja matéria inclusive restou sumulada pelo Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, através do enunciado 315. Verbis: “A partir da vigência da Medida Provisória n.º 154/90, convertida em Lei n.º 8.030/90, não se aplica o IPC de março de 1990, de 84,32% (oitenta e quatro vírgula trinta e dois por cento) para a correção dos salários, porque o direito ainda não se havia incorporado ao patrimônio jurídico dos trabalhadores, inexistindo ofensa ao inciso XXXVI do artigo 5.º da Constituição Federal.”

Assim, se para a correção dos salários o poder Judiciário superior (Tribunal Superior do Trabalho) não admitiu a aplicação da correção através do IPC, não é admissível que este mesmo poder Judiciário (Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal) venha decidir que na correção do saldo devedor dos contratos do SFH incida o índice do IPC.

Veja-se que na hipótese do Judiciário aceitar a variedade de aplicação de índices de correção para o mês de março/90, onde o IPC incide para o saldo devedor dos contratos do SFH e não para os salários, estará por sua conta determinando a ocorrência do desequilíbrio do contrato entre as partes, cujas conseqüências serão sempre danosas ao mutuário.

Para melhor compreensão, tomemos o exemplo de um contrato de mútuo firmado pelo plano de equivalência salarial, onde o saldo devedor em março/90 era de R$ 10.000,00 (dez mil reais), e para quitação faltassem ainda cem prestações, cujo valor mensal da prestação fosse R$ 300,00.

No caso de ser corrigido o valor da prestação pelo BTNF, considerando que para o salário não foi admitida a aplicação do IPC, teremos o valor da prestação em R$ 423,84.

Já o saldo devedor no caso de correção pelo BTNF iria para R$ 14.128,00, enquanto pelo IPC seria de R$ 18.432,00.

Assim, enquanto para quitação do contrato no prazo estipulado, aplicando-se a correção pelo BTNF a prestação teria que ser de R$ 423,84, sendo que para os casos de incidir o IPC o valor seria de R$ 552,96.

E o pior, considerando que o valor da prestação corrigida pelo plano de equivalência salarial será completamente insuficiente para amortizar a dívida no caso de correção do saldo devedor pelo IPC, teremos o desequilíbrio contratual, onde em face de diferença entre o necessário para quitação de cada prestação, ao invés de amortização da dívida, haverá mensalmente aumento da mesma.

Veja-se que para dito desequilíbrio o mutuário não tem qualquer participação, cuja circunstância é alheia à sua vontade, tanto no momento da firmação do contrato quanto posteriormente, por ocasião de seu cumprimento.

Por isso, é inconcebível a admitir o desequilíbrio das regras do contrato, por circunstâncias alheiras à vontade do mutuário, e em seu efetivo prejuízo, a ponto de em muitas hipóteses condená-lo à perda da casa própria.

A questão é de fato, de direito e lógica, onde não vemos razões para deixar de fazer e aplicar a justiça, a qual ocorrerá caso haja a determinação do desequilíbrio do contrato com aplicação do IPC para correção do saldo devedor, cujo índice não foi reconhecido para correção dos salários dos mutuários.

Vicente Paula Santos é advogado de empresas em Curitiba/PR, membro do Instituto dos Advogados do

Paraná.vps@jurídicoempresarial.com.br
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