O senador Joaquim Roriz (PMDB-DF) renunciou ao seu mandato. Comunicou essa decisão ao Senado por carta cheia de lamentações, queixumes, invocações de santidades. Enfim, um documento risível, não fosse tão triste o fato e as razões que o levaram a abandonar um mandato de senador ainda em início. Roriz é um daqueles fenômenos da política brasileira que, apesar de colecionar comportamentos suspeitos e não conseguir sustentar fama de honesto, é eleito e reeleito sucessivas vezes. Foi quatro vezes governador do Distrito Federal. Teria sido um bom governador ou um bom tapeador?
Há no seio do nosso povo, amargurado com tantos problemas e injustiças, uma parcela de cidadãos que tende a ser indulgente com políticos simpáticos. E Roriz é simpático, falastrão, vendendo uma imagem populista que sempre lhe valeu sucessivos cargos públicos. Outros há por aí que são bons exemplos do mesmo fenômeno. No Congresso estão de volta Paulo Maluf e Fernando Collor.
Só que desta vez a coisa foi mais feia. A polícia gravou um telefonema dele para o ex-presidente do Banco de Brasília, Tarcísio Franklin de Moura, no qual negociava um cheque de R$ 2,2 milhões. Tal cheque, dizia o senador, deveria ser partilhado no escritório do empresário Nenê Constantino, presidente do Conselho de Administração da Gol. Lá, cada um da turma iria pegar a sua parte. A gravação foi feita pela Operação Aquarela, que desbaratou um esquema de desvio de dinheiro do Banco Regional de Brasília (BRB). O presidente do banco, interlocutor de Roriz, acabou preso.
A defesa de Joaquim Roriz foi elaborada com argumentos difíceis de engolir. Disse, depois de invocar Deus e muitos santos, que ficou com apenas R$ 300.000,00 do dinheiro, um empréstimo que tomou para comprar uma bezerra. Não explicou se era alguma bezerra de ouro, tal o preço revelado. O resto do dinheiro ficaria com seu dono ou donos. Não colou. Afinal de contas, para que sacar um cheque de R$ 2,2 milhões, levar o dinheiro para a casa de um empresário amigo e lá cada um ir pegar o seu naco em dinheiro vivo? Obviamente, ninguém acreditou.
Já desgastados com o episódio de Renan Calheiros, que teima em ficar na presidência do Senado quando é certo que merece ser investigado e passar pelo crivo da Comissão de Ética da Casa, senadores não ousaram dar cobertura a Roriz. Este, vendo que não tinha aliados, pois ninguém iria se queimar para sustentar uma história da carochinha como a que contou, renunciou ao mandato. Isso o livrou da condenação na Comissão de Ética, cassação do mandato, perda de direitos políticos por oito anos e, em seguimento, processo cível e penal para dar conta do dinheiro que a revista Veja denuncia ter servido para comprar juízes do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal em processo contra Roriz nas eleições do ano passado.
A renúncia não foi uma atitude heróica, mas uma malandragem. E o ex-governador do DF ainda queria que seus dois suplentes renunciassem com ele, pois, interpretando a legislação eleitoral, entendia que tal fato levaria a uma nova eleição. E ele seria candidato de novo e voltaria para o Senado.
Só que o primeiro suplente Gim Argello (PTB-DF), que vai assumir no lugar de Roriz, não topou a manobra. Quer ser senador, não obstante tenha uma ficha gigantesca, com mais de uma dezena de processos de toda ordem nos quais figura como réu. É acusado de negociatas sucessivas e comportamentos outros, indignos de um vereador, quanto mais de um senador. Como diria a tia Zulmira, ?isto é Brasil?. E ele vai assumir. Assim, estaremos trocando seis por meia dúzia. Sai um suspeito e entra outro, para não arriscarmos afirmar que sai um corrupto e entra outro, o que só poderá ser proclamado quando houver julgamento e condenação. Haverá?
