Problema da superlotação

Cerca de mil presos já fugiram das carceragens de delegacias do Paraná só em 2017

Foto: Átila Alberti.

“Deveríamos caminhar rumo à solução, mas estamos caminhando cada vez mais rumo ao caos”, define João Ricardo Képes Noronha, presidente da Associação de Delegados da Policia Civil (Adepol). O comentário veio depois que a entidade denunciou que quase mil presos fugiram das delegacias do Paraná só em 2017 e que as carceragens das delegacias estão abarrotadas de gente: 9,7 mil presos, em espaços onde caberiam 4.370.

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Para o presidente da Adepol, a situação está piorando cada vez mais, sem nenhuma sinalização de melhora, a não ser promessa política. “É uma situação que está atingindo um nível de insuportabilidade. Por um lado, temos os policiais comprometidos com a guarda de presos e desviados de suas funções, que é investigar crimes. Por outro, as delegacias que não oferecem estrutura básica para os presos cumprirem suas penas”, reclama.

Com o comprometimento da mão de obra dos policiais, o serviço de investigação tem sido cada vez mais prejudicado. “Isso faz com que os delegados tracem um movimento sem trégua para que essa questão seja solucionada. Queremos que o preso cumpra sua pena conforme a lei e que a sociedade tenha o atendimento que merece, que hoje está comprometido”.

Sobre os prédios das delegacias, a situação é precária. Conforme o presidente da Adepol, estes locais são antigos, que passaram por reparos nas carceragens, mas não têm condição de permanência. “Além disso, não existe guarda externa, nem treinamento próprio para que os policiais desempenhem a atividade de guarda de presos. Não temos sequer acomodação para que advogados tenham contatos com os clientes. É tudo na base de improviso”.

Concordando com Noronha, Isabel Krugler Mendes, presidente do Conselho da Comunidade na Execução Penal, lamenta sobre a estrutura das delegacias. “Se o sistema prisional já é ruim, as carceragens das delegacias são mil vezes piores. Sem nenhuma condição. Mas sabemos que a situação está caótica para todos os lados”, considera.

Existe solução?

“As pessoas costumam pensar que querem que o preso se lasque na cadeia, mas elas esquecem que os presos voltam ao convívio social uma hora ou outra. Por isso que estes presos precisam ter o atendimento necessário”, definiu o presidente da Adepol. Para Noronha, enquanto os presos estão sendo mantidos nas delegacias, a melhora não vem. “Eles estão em condições sub-humanas, com dificuldade até para as necessidades básicas, como dormir, obvio que só vão pensar em fugir”.

O delegado comenta que a solução seriam as obras de reforma de presídios e construção de novos prédios, que segundo uma comissão criada pela Adepol, estão paradas. “Foi por isso que entramos com uma ação na Justiça, comunicamos a Corte Interamericana dos Direitos Humanos e notificamos o governador e secretário de segurança para que cumpram suas obrigações. Algo precisa ser feito, em caráter de urgência”.

Para a presidente do Conselho da Comunidade na Execução Penal, a solução seriam os mutirões. “É uma forma de fazer com que os presos que estão com pouco tempo para saírem da cadeia possam sair, ainda que usando tornozeleira eletrônica. Isso faria abrir mais vagas no sistema penitenciário e, de alguma forma, aliviaria para as delegacias com as transferências”, explicou Isabel Krugler Mendes.

Segundo o Ministério Público do Paraná (MP-PR), o Estado é o único da região sul que abriga presos em delegacias. Por causa da situação crítica, o MP entrou com 60 ações, em várias cidades, obrigando o governo a retirar os presos e melhorar a estrutura dos prédios. Em um termo de ajustamento do MP, os promotores pedem ainda a transferência de 90% dos presos até o final de 2018 e que as vagas do sistema prisional aumentem.

Sesp nega

Em nota, a Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária do Paraná (Sesp-PR) alega desconhecer os termos da proposta de Termo de Ajuste de Conduta (TAC) do Ministério Público. A Sesp informa ainda que o tema é tratado pelo Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do Paraná, supervisionado pelo desembargador Ruy Muggiati.

Sobre as 14 obras para ampliação da capacidade no sistema prisional, a Sesp nega que estejam paradas. Segundo a secretaria, tanto a construção como as obras de ampliação estão em andamento e, quando finalizadas, vão abrir quase 7 mil vagas no sistema. Nas próximas semanas, começam as obras na Penitenciária Industrial de Cascavel e na Penitenciária Estadual de Piraquara 2. Ainda neste semestre está previsto o início das ampliações da Casa de Custódia de Piraquara e da Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu 1 e também a abertura das licitações para a Penitenciária Estadual Piraquara 1 e do Centro de Integração Social de Campo Mourão.

Até o fim deste ano, segundo a Sesp, vão ser abertas 598 vagas com o término das obras da Cadeia de Campo Mourão (já consta com 25% da obra executada) e do Centro de Integração Social de Piraquara (que será retomada nos próximos dias). A promessa é de que até o meio do ano que vem serão abertas mais de 2,4 mil vagas e, até o fim de 2018, todas as quase 7 mil novas vagas.

A Sesp explica também que a transferência de presos para o sistema prisional é de competência do Comitê de Transferência de Presos (Cotransp), que é composto também por membros da Justiça e do próprio Ministério Público. Por semana, conforme a secretaria, são transferidos até 150 presos das delegacias para o sistema prisional, somente em Curitiba e região metropolitana.

Fazendo o que pode

Sobre o compromisso de que os presos vão ser retirados das delegacias até 2018, o presidente da Adepol mostra desconfiança. “Vejo com muita dúvida. Isso porque já existe um decreto, de 2016, que proíbe os presos em delegacias. Vamos fazer o que é possível, mas essa questão tem que ser pelo menos gradativa, mostrando que estamos caminhando para solução. Enquanto isso, vamos fazendo o que conseguirmos, mas caminhando rumo ao caos”, finaliza Noronha.

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