Neste momento, em que novamente surgem notícias sobre o mal da vaca louca no Hemisfério Norte, é importante lembrar que, em 2000, no âmbito dos esforços para o controle da doença, a União Européia estabeleceu a rastreabilidade da carne bovina, inclusive importada, como requisito obrigatório para a sua comercialização nos países membros. Essa regulamentação exigiu dos exportadores rápida implantação de sistemas de rastreabilidade que garantissem a origem do produto, desde o nascimento dos animais de corte. Dentre os principais países participantes desse mercado está o Brasil. Aqui, o Sisbov (Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina) foi estabelecido no início de 2002, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Já no final do ano passado, uma nova regulamentação da Comunidade Européia determinou que, a partir de 2005, todos os produtos alimentícios comercializados em seus países membros deverão ter sua rastreabilidade assegurada. Seguindo caminho semelhante, mas com outra motivação, os Estados Unidos publicaram recentemente uma série de medidas sobre segurança alimentar, visando ao combate ao bioterrorismo. Ou seja, as nações, empresas e cadeias produtivas que desejarem continuar exportando alimentos – mercado, aliás, de fundamental importância para a economia brasileira – não podem mais adiar a implantação de sistemas eficazes de rastreabilidade, independentemente da existência ou não de legislação interna sobre o tema.

Exemplo importante de consciência setorial sobre essas questões é a área de saúde. Apesar de o País não ter legislação específica para a identificação das unidades de consumo de medicamentos e materiais médicos no ambiente hospitalar, o setor tem desenvolvido e adotado de forma independente – e muito bem estruturada – algumas recomendações de boas práticas para o aumento da segurança de seus pacientes. Dentre essas, está a identificação dos medicamentos em suas doses unitárias já pelo laboratório farmacêutico, evitando-se o manuseio e a reetiquetagem dos produtos, o que normalmente é realizado pelos hospitais. Essa recomendação, dentre outras relacionadas à logística interna de distribuição dos medicamentos, está descrita em guia elaborado por um grupo de trabalho formado por profissionais do setor e técnicos da EAN Brasil.

A rastreabilidade e a conseqüente segurança que essa prática gera dependem da identificação única e exclusiva dos produtos e da qualidade das informações registradas e armazenadas por todos os elos ou empresas participantes de seu processo produtivo e de distribuição. A qualidade de um produto e de um sistema de rastreabilidade, em cada cadeia de suprimentos, é proporcional aos controles existentes em todos os elos. Ou seja, um insumo fora das especificações é o suficiente para que o produto final também esteja comprometido. Sob o ponto de vista da rastreabilidade, de nada adianta a indústria saber de quem comprou os insumos utilizados na produção de um determinado lote de produto se o seu fornecedor não tem conhecimento sobre onde o adquiriu. Quando isso ocorre, a rastreabilidade perde-se nesse ponto da cadeia.

Assim, na construção de sistemas de rastreabilidade envolvendo toda a cadeia de suprimentos, a manutenção de registros estruturados do histórico dos produtos e a perfeita comunicação de dados entre todos os elos são fatores críticos para a qualidade. Esses requisitos têm de ficar muito claros na questão das cadeias produtivas do setor alimentício, pois a eficácia na implantação de sistemas de rastreabilidade delimitarão a participação brasileira na exportação aos principais mercados compradores do planeta. A boa notícia é que o País, por meio da EAN Brasil, entidade multissetorial sem fins lucrativos, apóia a disseminação da rastreabilidade por meio da automação. Grande parte desse conhecimento vem da participação da entidade, por meio da EAN International, sediada em Bruxelas, da qual a organização brasileira é membro, nos diversos fóruns de discussão e projetos desenvolvidos pelas principais instituições mundiais relacionadas à segurança de produtos, como os comitês específicos da ONU e da Comunidade Européia. Estes, de forma geral, recomendam para as aplicações de rastreabilidade o emprego dos padrões do Sistema EAN.UCC, adotados em todo o mundo.

Isso é fundamental, pois no mundo globalizado, uma cadeia de suprimentos não se limita mais ao território de cada nação. Muitas vezes, inicia-se numa longínqua fazenda do interior do Brasil e tem seu elo final num supermercado de Cingapura. E as aplicações que garantem a rastreabilidade dos produtos dependem da interação entre várias empresas em posições diferentes – no mundo!

Ricardo Yugue é assessor de soluções de negócios da EAN Brasil  (Associação Brasileira de Automação).

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