O presidente Evo Morales foi uma das personalidades mais badaladas pela mídia durante a Cúpula União Européia-América Latina, em Viena. Ofuscado pelos refletores, protagonizou atos de irrefletida bazófia em relação às empresas transnacionais que exploram gás e petróleo em território boliviano, desfechando também algumas farpas aos governantes dos países-sede das ditas organizações.
Foi o caso do presidente do governo da Espanha, José Luis Zapatero, primeiro mandatário europeu a receber Morales no périplo que empreendeu logo após a eleição, a quem inclusive hipotecou solidariedade e compromisso de plena colaboração. Em troca, o estabanado presidente da Bolívia teceu comentários pouco diplomáticos ao referir-se à Espanha. Contudo, o brilho fugaz obtido pela performance diante dos jornalistas, imediatamente anotado em La Moncloa, sede do governo espanhol, depressa foi substituído por uma carta cheia de mesuras formulando o pedido de desculpas pelo tropeção da véspera.
A acidez das críticas de Morales atingiu também o governo brasileiro e, em particular, a Petrobras, considerada a maior empresa em funcionamento na Bolívia, onde realizou investimentos de US$ 1,6 bilhão para viabilizar a exploração de gás natural e sua exportação para o Brasil, tornando-se a maior produtora e compradora do referido combustível.
Informado do teor das declarações fantasiosas do colega ao desembarcar em Viena, Lula mostrou-se chocado e passou a trabalhar com a hipótese de dar a Morales uma resposta enérgica, atitude exigível de um líder conseqüente, mesmo ocorrendo num encontro de raras testemunhas. Não se descartava na bolsa de especulações instalada em Viena, tão ou mais procurada pelos repórteres que a própria cúpula vienense, a hipótese da retirada do embaixador brasileiro da Bolívia.
Afinal, não seria nenhum disparate ou gesto gratuito à vista da aguda crise gerada pelas declarações de Morales, que não se fez de rogado ao lançar contra a Petrobras a insólita acusação de operar ilegalmente na Bolívia, sonegar impostos e, mais grave, dedicar-se à prática do contrabando. Não é esta a linguagem adequada a um chefe de governo ao se referir a país amigo merecedor de respeito, sobretudo, quando as relações bilaterais se caracterizam pela predominância de uma das partes, como é flagrante no volume exponencial do gás comprado pelo Brasil, a rigor, único mercado disponível na América do Sul para o produto boliviano.
Observadores há que manifestam sério temor quanto ao futuro das reações políticas da cidadania boliviana e, por extensão, do país com a comunidade internacional. O escritor peruano Mario Vargas Llosa, segundo o diário espanhol El País, alertou esta semana em Bruxelas que o ?indigenismo desembocará na violência e as nacionalizações resultarão em conflitos?. Llosa acrescentou que na Europa existe o mito de que a eleição de governantes indígenas representa um movimento de pobres contra ricos. Para o famoso novelista, o correto seria não empregar o termo ?indigenismo?, que só ajuda a aumentar o racismo, a exclusão social e a revolta na América Latina.
Tampouco o escritor vê méritos na nacionalização de empresas estrangeiras, pois o ato jamais resolveu os problemas crônicos de exploração e marginalidade. Além de constituir sério risco à preservação da democracia.