Motivo de euforia num primeiro momento, o anúncio de crescimento econômico medido pelo Produto Interno Bruto (PIB) de 5,4% passou a ser preocupação. Como já comentamos, esse considerável crescimento deu-se principalmente pelo aumento do consumo interno e este, em grande parte pela concessão ampliada de crédito. Longos prazos e juros baixos estimularam a população a consumir principalmente bens duráveis, dentre eles computadores, geladeira, televisores e automóveis.
Os estímulos concedidos ou permitidos pelo governo ao consumo tendem a gerar um desequilíbrio entre a oferta e a procura. E a lei da oferta e da procura o governo não pode revogar nem por iniciativas legislativas, nem com suas costumeiras medidas provisórias. É uma lei econômica que funciona independentemente da vontade dos governantes e, não raro, no sentido contrário dos objetivos que se busca alcançar.
Com efeito, os prazos dilatados de financiamento e os juros baixos levaram a esse desequilíbrio, assustando o presidente Lula que chegou a declarar, publicamente, que via o fantasma da inflação se aproximando e que é preciso exorcizá-lo.
A primeira idéia para desatar esse nó é o aumento dos juros, providência que, aliás, é insinuada na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central.
Se for esse o caminho percorrido, volta-se ao ?stop and go? no caminho dos juros que, em 2004, por motivos semelhantes ao de agora, pararam de cair e voltaram a subir. Juros mais altos desestimulam o consumo e, na teoria, produzem uma melhor equação com a massa de bens ofertados.
O governo e, em particular, o presidente Lula, querem evitar essa solução. O presidente prefere a manutenção dos juros básicos no patamar onde está e soluções que, de outra forma, busquem o equilíbrio entre a oferta e a procura. Entre elas está a redução dos prazos de financiamentos e estímulos às exportações, substituindo uma provocada retração no mercado interno por uma majoração das vendas no mercado externo.
Entre os bens a terem sua comercialização dificultada estão principalmente os automóveis. Atualmente é possível, a juros baixos, comprar um automóvel financiado em até oito anos. Chama a atenção o fato de que, nesse longo prazo, o bem adquirido, o automóvel, vai perdendo valor pelo decurso de prazo e seu uso. E a certa altura já não cobre mais o saldo devedor, tornando a operação carente de garantias. Mas restringir a três anos, como se cogita, o financiamento de automóveis é uma operação complexa, pois envolve todo um mercado de matérias primas, inclusive o aço.
O governo deve tratar o problema com cautela. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, já nos próximos dias deverá iniciar reuniões com as lideranças empresariais e com os dirigentes do sistema financeiro, notadamente os banqueiros, para ouvir suas opiniões e buscar evitar medidas precipitadas e erradas.
O que tal situação nos ensina é que é preciso fazer crescer a economia, mas não a qualquer preço. Que crescimento sustentado é mais do que uma afirmação retórica. Tem de se basear em sólidos fatos e palpáveis perspectivas.
Crescer por crescer oferecendo créditos em prazos a perder de vista e microscópicos juros não é um milagre econômico. Milagre seria poder sustentar essa situação evitando os malefícios que dela podem advir, o principal dos quais é a indesejada inflação.
Pode ser que a resistência do presidente Lula ao aumento dos juros torne letra morta as ameaças contidas na última ata do Copom. Mas uma coisa é certa: se os juros não subirem, baixar é que não vão. E as medidas ora cogitadas de redução dos prazos de financiamento e incentivos às exportações, embora mais desejáveis, serão apenas tentativas que oxalá dêem certo. Senão, será de se esperar um pacote paradoxal: um pacote contra o crescimento econômico anunciado e tão festejado pelo governo. O crescimento econômico tem de estar embasado na sustentabilidade e o que o Brasil ora experimenta tem todas as características de bolha inflada com o ar do consumismo.