Um jovem médico curitibano recebeu uma bolsa de especialização na Inglaterra. Numa reunião de um clube de serviços que patrocinava seus estudos no Reino Unido, foi indagado por um dos britânicos presentes sobre o Brasil. As perguntas eram em geral idiotas. Outras, apenas de ignorante. Pacientemente, o curitibano ia explicando coisas do Brasil, até que perdeu a paciência. “Como é que vocês resolveram o problema dos índios? A gente vê nos filmes de faroeste que nos Estados Unidos aconteceram muitas batalhas entre os brancos e os peles-vermelhas?”, indagou o inglês. Sem ignorar problemas que ainda temos com os índios, ou melhor, os índios com os brancos, mas entendendo que a pergunta presumia que vivíamos numa imensa selva, entre feras e cobras, como selvagens, o médico paranaense ironizou:
“Nós resolvemos facilmente o problema com os índios. Nós assamos e comemos.”
Pois lá fora, nos países chamados desenvolvidos, onde se sedia a maioria dos grandes bancos e organismos de financiamento multinacionais e ainda os maiores investidores, o Brasil é algo assim. Um imenso e exótico país onde abundam traseiros no Carnaval e escasseiam recursos financeiros. É comum confundirem o nosso País com qualquer outro da América Latina ou até pensar que é tudo a mesma coisa. Quando se mostra uma foto de São Paulo, com seus imensos arranha-céus, logo dão uma risadinha incrédula e dizem que é Nova York. Só não mofam com o presidente Fernando Henrique Cardoso, que de fato tem no exterior bom conceito, nem de sua equipe econômica, considerada de alto nível.
Entende-se porque FHC vai reunir-se nesta segunda-feira, amanhã, com os presidenciáveis para fazer-lhes um apelo à “responsabilidade patriótica”. Quer ele que todos os contendores neste pleito eleitoral tenham uma noção adequada do que é a crise que estamos sofrendo, fruto de problemas verdadeiros, especulações, temores infundados e ignorância. Quer que os nossos candidatos não reforcem a impressão de que somos selvagens e que entendam que existem acordos e compromissos assumidos e uma crise que pode ter solução, mas que deslizes e declarações impatrióticas só servem para agravá-la. A simples atitude de convocar para uma conversa os candidatos, expondo-lhes a situação do País, o acordo com o Fundo Monetário Internacional, as causas e o perfil da dívida e o que este governo está fazendo (ou deixando de fazer ) para terminar seu mandato sem comprometer o do próximo presidente, já soará, no exterior, como uma atitude civilizada. Ajudará a mostrar ao mundo, aos nossos credores e aos investidores que o Brasil não é o paraíso, mas também não é nenhuma republiqueta de bananas. É grande, tem um grande povo e merece respeito. Respeito inclusive de seus presidenciáveis.
Quem quer que seja o vitorioso em outubro só poderá ter proveito do encontro de amanhã. Ouvirá e opinará, deixando de lado, por momentos, as divergências calorosas de campanha para pensar serenamente no País. Somos uma democracia, com alternância no poder. Os políticos vêm e vão, mas o Brasil fica e não pode ser vítima de incompreensões e perder-se por falta de diálogo. Vemos a atitude do presidente Fernando Henrique Cardoso, não importa quantas vezes dele discordamos, e não foram poucas, como um gesto civilizado e patriótico, sem conotações eleitoreiras e, como disse Lula, seria impatriótico não atender ao seu convite.