O brasileiro já estava saturado. Havia perdido a paciência com a sucessão de governos de centro-direita, inclusive uma longa ditadura militar, sem que os problemas mais graves da nação encontrassem solução. Não se dispunha mais a tolerar um ?gigante deitado eternamente em berço esplêndido?, decidindo corajosamente pela derrubada dos que no poder se sucediam, sem ideologia nem programas, para experimentar, sem medo de ser feliz, o Partido dos Trabalhadores. Este sim tinha ideologia, se bem que programas conseqüentes jamais havia apresentado. Mas não chega ao entendimento das massas identificar, do que era proposto e prometido, o que era possível e realizável. E ainda surgia como candidato do PT e seu líder máximo um torneiro mecânico, trabalhador e líder sindical, nordestino que veio para o sul e aqui fez nome e fama. E ousava desafiar as forças conservadoras que sempre detiveram o poder e mantiveram o Brasil como um dos países do mundo de maiores diferenças sociais e mais profundas carências.
Exatamente por ter apresentado uma ideologia socialista e de esquerda e um candidato que não pertencia aos círculos que vinham comandando o Brasil, é que o PT, engolfado numa das mais sérias crises já atravessadas pela administração e a política brasileiras, resiste e ainda mantém uma parcela ponderável da confiança do povo.
Enquete recente revela que o conceito do governo caiu; que o do PT também, e igualmente o de Lula, este em menores proporções. Mas há forças de resistência que ainda não permitiram que os que hoje detêm o governo do País despenquem, chegando até a um ?impeachment? do presidente, como aconteceu com Collor. Essas forças de resistência são a militância do PT, amalgamada ao longo de 25 anos de existência do partido. Militância que não se limitou a ir às urnas. Também participou das lutas partidárias. Há uma ideologia e, embora digam que as ideologias morreram, o fato é que o povo tem necessidade delas. O mundo sempre foi conduzido primeiro por idéias e depois pela ação dos que as abraçam.
Os demais partidos brasileiros em geral nunca tiveram ideologia nem programas. O PT tem – ou tinha – ideologia e programas. Verdade que programas muitas vezes não factíveis e irrealizáveis. Ou irrealizados. Os escândalos que se repetem, se acontecessem num governo de alguém que pertencesse às forças reacionárias que sempre governaram o País, já teria caído. Mas o povo ainda tem esperanças. Não muitas e se desfazem com sucessivas decepções. Mas não encontra sucedâneo. Imagina que se é ruim com o PT, pior sem ele. Que se é ruim com Lula, pior sem ele.
Sobre esse colchão de esperanças ainda se sustentam as forças deste governo.
Por quanto tempo, ninguém sabe, pois os escândalos espoucam no PT, no governo e rodeiam Lula todos os dias. As oposições já traçaram seus objetivos. Querem que Lula termine este mandato e não mais se reeleja, seja pela extinção da reelegibilidade, seja por não contar mais com confiança suficiente do eleitorado. O difícil será convencer os brasileiros a voltar aos amorfos partidos sem ideologia nem programas, que mantiveram o Brasil por séculos deitado em berço esplêndido.