Tirando as idas e vindas do dólar, o Brasil está normal dentro de suas dificuldades, problemas, esperanças e inseguranças. Os que detêm o poder, em todas as esferas, foram eleitos democraticamente, as instituições inclusive a Justiça – funcionam dentro da normalidade e o povo ganha a vida trabalhando. Brevemente haverá eleições, mas os candidatos fazem suas campanhas com toda a liberdade. Dizem, no palanque e na TV o que querem; prometem o que entendem e vão aonde pretendem, a pé, de carro, de helicóptero ou de avião.
Daí já seria estranho alguém levantar dúvidas e suspeitas mais sérias sobre o momento que vivemos. Mas quer o ex-ministro, ex-governador, ex-prefeito e ex-deputado Ciro Gomes, na condição de pretendente ao cargo de presidente da República, que as coisas não sejam bem assim. Depois de cair para o terceiro lugar na lista dos mais cotados pelas sondagens de opinião (com sério risco de não entrar no segundo turno, portanto), o candidato está vendo lacraias na parede. E afirmou que, pela primeira vez desde a redemocratização, “poderemos não ter eleições limpas”. Na seqüência de suas considerações, lembrou Alberto Fujimori, o defenestrado presidente do Peru, hoje vivendo no Japão.
A suspeita é tão forte que, em suas hostes, Ciro alimenta (até agora não desautorizou categoricamente) outra ação no mesmo sentido: um de seus coordenadores de campanha, o deputado João Hermann, repete que já pediu a presença no País de observadores internacionais (da Organização das Nações Unidas). Na raiz do problema estão suas desconfianças de que será vítima de uma arapuca montada pela Justiça Eleitoral, sob o comando de alguém a serviço do concorrente José Serra, candidato apoiado pelo governo.
O candidato, que reduziu as funções da companheira e atriz Patrícia Pilar às suas mal-dormidas noites para, depois, arrependido, pedir-lhe desculpas, não consegue manter a serenidade diante da mínima evidência de sua possível derrota. A conspiração é seu fantasma. Repete, por exemplo, o que já dissera em desvario paterno o ex-presidente José Sarney, para defender a filha então pré-candidata envolvida nas apurações de desvios de recursos da extinta Sudam (Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia). O que não passa de um caso policial, normal numa democracia que funcione de fato, para os que têm nas veias o germe do coronelismo político passa a ser uma ameaça à Nação. Confundem danação pessoal com catástrofe nacional.
É mais sábio, com todo o ensinamento que obteve de sucessivas derrotas, o candidato Lula da Silva, que continua liderando as pesquisas. Ele que, em tese, teria iguais motivos para temer uma virada, ensina que “o Brasil não é uma republiqueta” e que os partidos e as entidades de classe têm condições de criar sistemas de apuração paralela para garantir a lisura do pleito. Ciro, na republiqueta que imagina governar, confunde direito de crítica com o levantamento de suspeitas sem fundamento ou provas robustas. É, no mínimo, uma tentativa de desestabilizar um processo que até aqui só merece encômios. Isso, com certeza, desserve à República que nós outros queremos.
