Na nossa cultura, o crime reclama punição. Punição e não recuperação, embora esta figure nos compêndios como o fim último das penas. Na prática, o nosso sistema prisional fabrica criminosos e potencializa ainda mais os que já cometeram delitos. Reclamamos de uma polícia ineficiente, mal preparada e mal equipada, que se mostra incapaz de prevenir e combater a criminalidade.

Nos últimos tempos, em grandes centros como Rio e São Paulo, vêem-se criminosos atacando a polícia e não mais esta àqueles, numa verdadeira guerra urbana em que são muitas as vítimas, inclusive civis, cidadãos que não pertencem a nenhum dos dois grupos. No cruzar de fogo entre a polícia e os bandidos, caem inocentes, não raro crianças.

Na busca de causas da criminalidade, estudiosos e teóricos vão encontrar problemas sociais. Têm razão, mas a sociedade não se conforta com isso, exigindo a prevenção e a punição enquanto as causas sociais não se resolvem. E elas se eternizam em nosso País e na maioria dos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento. Mais recentemente, surgiram componentes outros a instigar o aumento da criminalidade, como a licenciosidade, o uso abusivo e não controlado de armas, o seu contrabando e o tráfico de entorpecentes. Por exigência da sociedade, o governo federal tem sido chamado a intervir, já que os sistemas policiais são, para a maioria dos crimes, estaduais. E para participar do combate ao crime, o governo da União assina convênios com estados e municípios, formando forças-tarefas, participando com alguns recursos e prometendo aumentar o contingente de sua própria polícia, a Federal.

Equipar as polícias parece, para muitos, a solução milagrosa. Ela é necessária, mas estudos recentíssimos do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) demonstram que os investimentos são incapazes de reduzir a criminalidade nos próximos anos. Tais estudos demonstram que nem mesmo o aumento do Produto Interno Bruto diminui a criminalidade, pois isso só cria condições mais favoráveis à solução do problema social. Mas não é a solução requerida. Esta se traduz por melhor distribuição de renda. O crescimento, seguindo a concentração nas mãos de poucos, enquanto multiplicam-se os desempregados, favelados, analfabetos, desatendidos no sistema de saúde pública, enfim, os excluídos, só faz com que aumente a criminalidade.

No trabalho do Ipea fica demonstrado que no Estado de São Paulo, por exemplo, uma redução de 2% ao ano na desigualdade de renda faria o número de homicídios cair 11,6%, de 2001 a 2006. Um crescimento de 10% ao ano nos investimentos destinados à polícia resultaria em mais 26,42% de homicídios no mesmo período. O trabalho revela que, no Rio, com a redução da desigualdade, os homicídios baixariam 12,8%, num total de 7.210 casos em 2006. Mas, se apenas ocorrerem gastos em segurança pública, haverá um aumento de 54,1% nos registros de assassinatos, totalizando 12.745. Se nada mudar, a previsão é assustadora. Só com o crescimento populacional, o número de homicídios irá aumentar 34% em São Paulo e 88% no Rio, até 2006.

Esse estudo deve servir, nas mãos das autoridades, para uma revisão total da política contra a criminalidade, pois estamos seguindo o caminho errado. Não estamos crescendo, estamos gastando com as polícias, embora pouco, e a distribuição de renda é cada vez mais iníqua.

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