Quando falam do Brasil no exterior, principalmente se através de meios de comunicação, em geral sentimos revolta porque distorcem a realidade. E muitas vezes as distorcem para pior ou dão interpretação errônea ou ridícula a situações e fatos que vivemos. Exemplo recente é o filme premiado nos Estados Unidos, que aponta o Brasil como um país onde a exploração sexual e a criminalidade dominam, apresentando-nos como o quinto dos infernos. O enredo exagera com mau gosto problemas que vivemos, porém sem aquela conotação de filme de terror apresentada. Talvez porque os realizadores da película pouco nos conheçam. Ou nós estejamos incapacitados de fazer uma auto-análise que evidencie as mazelas que vivemos e eles transportaram para a ficção. Achamos que falar mal do Brasil é privilégio nosso. Quando outros o fazem, nos parece interferência indébita em nossos assuntos internos.
Há, entretanto, comentários e análises sobre o Brasil que saem na grande imprensa estrangeira, em especial no campo da economia, que nos indicam verdades que ou não percebemos ou desleixamos. O motivo é que a economia é globalizada, a despeito dos esforços de regionalizá-la ou nacionalizá-la. E olhando o Brasil de fora, analistas sérios vêem realidades que, por estarem encostadas nos nossos narizes, ficam por nós pouco reconhecíveis.
O jornal inglês Financial Times acaba de analisar as reformas pretendidas pelo governo Lula, através do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, que já empaca no Congresso, entupido por mais de setecentas emendas. Em editorial, o jornal londrino diz que as reformas econômicas propostas pelo presidente são tímidas. Reconhece que as recentes medidas anunciadas para estimular os investimentos em infra-estrutura são ?muito necessárias?, mas estão ?longe de ser suficientes?.
Tal conclusão corrobora o que pensam analistas daqui mesmo, que apontam as dificuldades para levantar dinheiro para as obras de infra-estrutura, as fontes inadequadas de financiamento pretendidas e as omissões. ?O Brasil deve reformar seu ?sistema de saúde absurdamente injusto? e as ?antiquadas leis trabalhistas?, se desejar alcançar outros países emergentes, principalmente os asiáticos?, diz o artigo. Tem razão o Financial Times. E mesmo que não quiséssemos alcançar os demais países em desenvolvimento, o nosso sistema de saúde continuaria sendo um ponto fraco nas reformas. No que respeita às ?antiquadas leis trabalhistas?, precisamos de fato adaptá-las ao mundo moderno. Elas são velhas, oneram demais os empregadores e, por isso, inibem tanto a formalização de empresas quanto a sua criação e crescimento, inibindo a criação de mais empregos. A flexibilização é um assunto mais complexo do que possam imaginar os analistas estrangeiros, pois as conquistas sociais obtidas a partir da CLT são difíceis de modificar ou abolir enquanto o Brasil for um país de diferenças tão gritantes e absurdas de faixas de renda.
O jornal britânico elogiou ?elementos do programa?, como as medidas de expansão do crédito, incentivos fiscais e facilitação do registro das empresas, mesmo que disso resulte uma pequena redução do superávit primário, mas condenou o nosso sistema de aposentadoria, que onera o INSS e o Tesouro, lembrando que aqui há quem se aposente com pouco mais de 50 anos de idade. O jornal acredita que, dadas as condições dos mercados financeiros e o forte apoio popular que Lula recebeu nas urnas, ?o presidente poderia ter sido mais corajoso?. Sem dúvida!