Depois de 12 anos de debates, finalmente saiu a reforma do Judiciário. Lamenta-se que tenha sido parcial e que muito pouco tenha sido feito para a primeira instância. Os tribunais superiores, com a súmula vinculante (um determinado entendimento do STF, aprovado por 8 votos, passa a valer com força definitiva frente a todos) assim como com a impeditiva de recursos (esta ainda pendente de deliberação pela Câmara dos Deputados), certamente terão menos processos.
Em nossa opinião a súmula vinculante viola a independên- cia (funcional) do juiz. No fundo, é uma interpretação de um órgão superior imposta a um órgão inferior. De qualquer maneira, é preciso saber o que a súmula vinculante representará em termos de engessamento do Direito e de autoritarismo. Espera-se que a Corte Suprema (STF), com sua sabedoria e prudência de sempre, não se valha da súmula vinculante para impor aos magistrados de todo país o que é desarrazoado (ainda que partidariamente correto).
Já era tempo de se aprovar o Conselho Nacional de Justiça, que será o órgão de controle e administração do Judiciário. Finalmente haverá um órgão que falará em nome do Poder Judiciário. Como está assegurada a presença de pessoas de fora desse poder, espera-se que cumpra bem suas funções, que sirva de "parabólica" das reclamações, que corrija maus procedimentos dos juízes, que evite que o orçamento do Judiciário não seja destinado a coisas supérfluas etc.
A ampliação da competência da Justiça do Trabalho, que passa a julgar todas as causas pertinentes ao trabalho, e não apenas ao emprego, parece salutar. A especialização quase sempre significa acerto e rapidez nas decisões. A quarentena dos magistrados (não podem atuar como advogados, depois de aposentados ou exonerados, por três anos, nos mesmos locais ou tribunais onde atuavam) é medida que pode evitar favorecimentos. Não é, entretanto, muito eficaz, porque pode tal magistrado perfeitamente atuar usando o nome de outra pessoa.
A extinção dos Tribunais de Alçada era medida já reivindicada há muito tempo. A divisão (funcional, administrativa e orçamentária) não ajuda muito em termos de prestação jurisdicional rápida. O que importa para o jurisdicionado é a rapidez na solução dos litígios. Divergências internas entre tribunais só atrapalham o bom andamento da Justiça. Com um só comando em cada Estado o Judiciário pode ser mais ágil.
Mas fundamental agora é não ficar só nisso. Os dirigentes desse poder devem contar com assessorias técnicas permanentes e, sobretudo, com tudo que um planejamento nacional, do Conselho Nacional de Justiça, possa representar de avanço. Agora a tendência é a adoção de soluções nacionais. Muitos Estados negligenciaram totalmente, por exemplo, na criação dos Juizados Especiais. Certamente isso doravante vai ser solucionado em termos nacionais. Idiossincrasias locais já não podem prosperar.
Outro ponto salutar da reforma foi a previsão de criação das Defensorias Públicas em todo País. Alguns estados resistiam muito. Suas tarefas são muito relevantes: defendem gratuitamente as populações carentes, que não podem contratar advogado. Que sejam uniformizados os procedimentos de atuação dessas Defensorias, de modo a facilitar o acesso à jurisdição de muita gente que até hoje nunca soube o que é Justiça.
Luiz Flávio Gomes é doutor em Direito penal pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri, mestre em Direito penal pela USP, secretário-geral do Ipan (Instituto Panamericano de Política Criminal), consultor e parecerista e diretor-presidente da TV Educativa Ielf (1." Rede de Ensino Jurídico Telepresencial da América Latina com cursos ao vivo em SP e transmissão em tempo real para todo país – www.ielf.com.br).