A obstrução, nos organismos colegiados em que as decisões são tomadas quando há uma presença mínima de membros deliberantes, é considerada um direito das minorias. Direito que mais deve se afirmar nos parlamentos, seja na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, assembléias Legislativas ou Câmaras de Vereadores.
O processo da obstrução é simples: provoca-se a redução do número de presentes, negando quorum ou, se reduzido já está, a sua verificação através da contagem. Este último expediente evita que decisões sejam tomadas por maiorias fictícias e, a primeira, obstaculiza o rolo compressor das maiorias.
Mas há obstruções que, praticadas hoje na Câmara dos Deputados, são procedimentos suspeitos e parecem buscar impedir a descoberta do trânsito de dinheiro, via ?valerioduto?, de fundos de pensão de estatais para o PT. E o destino último seria os ?mensalões? ou caixas 2 que financiaram ilegalmente campanhas políticas e garantiram, para o governo, uma base parlamentar de maioria falsa. Falsa, porque comprada.
O deputado paranaense Osmar Serraglio, do PMDB, que se vem destacando pelo trabalho aplicado e honesto que realiza como relator da CPMI dos Correios, bem como outros parlamentares interessados na busca da verdade, fez protestos públicos porque o PT estava impedindo as investigações.
?Toda reunião que fazemos é truncada e não avançamos. Há mais de 20 dias temos dificuldade em relação a coisas mínimas para investigações?, queixou-se Serraglio.
Essa CPMI investiga, entre outras pessoas e instituições, onze corretoras que, aplicando dinheiro de fundos de pensão de estatais, colheram prejuízos de R$ 9 milhões. Este número não parece exagerado, mas é possível que, indo a fundo no assunto, descubra-se que essas e outras aplicações desastrosas foram feitas com o objetivo de beneficiar este ou aquele partido político.
A gravidade da suspeita resulta no fato primeiro de serem aplicações de fundos de pensão estatais, formados com a contribuição de empregados dessas empresas do governo e também das próprias empresas. Vale dizer, dinheiro do povo. Resulta também do fato de que as aplicações e os ganhos dos fundos de pensão destinam-se a bancar a complementação das parcas aposentadorias dos empregados. Manobras para desvio desse dinheiro para um partido ou bases políticas de um governo não é só imoral. É crime.
Através de obstruções têm conseguido jogar o assunto para as calendas e já há quem ache que, neste ano, nada será verdadeiramente esclarecido.
Imaginemos a hipótese de que irregularidade nenhuma exista nessas operações e as perdas sejam resultantes apenas de aplicações de risco malsucedidas. Não haveria imoralidade, embora pudesse existir inabilidade, incompetência. Daí, para que impedir as investigações?
Nada justifica a obstrução, pois esta faz suspeitar que, nesse negócio, há realmente maracutaias. O PT e o governo, que já estão enterrados até o pescoço em acusações e suspeitas, arriscaram-se à presunção de que não queiram que se esclareça onde está indo o dinheiro reservado, pelos fundos de pensão, para sustentar, na velhice, os empregados das empresas estatais. A força da pressão da opinião pública e as denúncias da imprensa fizeram, felizmente, com que o PT e o presidente Lula retrocedessem. E, afinal, o quórum ressurgiu. Vamos ver por quanto tempo?