A presença das Forças Armadas – Exército, Marinha e Aeronáutica – no combate ao crime transborda as funções constitucionais das forças subordinadas ao Ministério da Defesa. Mas se há de olhar a situação com realismo e encontrar, sempre, mecanismos legais que não façam com que os nossos militares não pertencentes às forças policiais sejam desviados ao mesmo tempo de suas funções precípuas e dos mandamentos constitucionais que lhes cabe defender. Esses mecanismos existem e um deles é um convênio firmado com o governo do Estado do Rio de Janeiro que já fez, anteriormente, que tropas do Exército fossem usadas contra o crime organizado.
Os resultados não foram os esperados. Em primeiro lugar, porque as Forças Armadas não foram nem são treinadas para esse tipo de ação; e, em segundo lugar, porque o crime organizado não age como o inimigo que os nossos militares conhecem, seja na teoria (felizmente), ou na prática, em caso de nos envolvermos em conflitos armados. Mas valeram, pois tudo o que se fizer hoje contra o crime, por menos que adicione à luta diária que a sociedade organizada trava para não ser vítima ou refém da criminalidade, é reforço bem-vindo.
A sociedade está amedrontada enquanto os criminosos, em especial os ligados ao tráfico de armas e drogas, agem com tanto destemor que comandam suas ações de dentro dos presídios, corrompem policiais e chegam à suprema ousadia de atacar postos policiais e quartéis das Forças Armadas. A última de suas ações, o roubo de armas de um estabelecimento do Exército no centro do Rio de Janeiro, foi a gota d´água. Para contornar o desvio das funções constitucionais das Forças Armadas, há o convênio firmado com o estado, a cuja polícia cabe combater o crime. Para suprir a falta de especialização, reuniram-se aos soldados e oficiais, colocados nas favelas cariocas em busca das armas roubadas e dos ladrões, veteranos das forças de paz da ONU no Haiti. Estes já estão acostumados a um ambiente, no país caribenho, que, além dos problemas políticos, tem fortes traços de desequilíbrio social e exploração da pobreza pelos chefes da criminalidade. Como nas nossas favelas.
De outro lado, se há de compreender que as Forças Armadas foram atacadas, subtraídos armamentos que são de seu uso e militares foram agredidos pelos bandidos. Uma ofensa ao patrimônio, aos militares profissionais e à dignidade da instituição. As ordens que os soldados têm é de só interromper a operação quando obtiverem os resultados desejados, que são a recuperação dos armamentos roubados e a prisão dos responsáveis. A sua missão já ultrapassa os limites das favelas para atingir as entradas do Rio de Janeiro, diante da notícia de que os malfeitores buscam fugir daquele estado com o fruto do roubo. Falta, sim, adequar melhor as Forças Armadas a esse tipo de ação. Tudo se justifica, mesmo a improvisação de soldados do Exército, Marinha e Aeronáutica como coadjuvantes no combate ao crime, quando as forças que servem são vítimas da ousadia dos bandidos. Que seja uma situação provisória, a menos que se eternizem essas ações de ousadia criminosa de que foram vítimas, como está sendo vítima, há muito tempo, toda a sociedade carioca.
