O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço foi criado como um substituto da indenização por demissão sem justa causa e para a formação de um pecúlio para o trabalhador. Constitui-se de 8% do salário pago, depositado mensalmente pelo empregador no fundo gerido pela Caixa Econômica Federal, com um conselho curador no qual têm assento patrões e empregados.
Seu saque é condicionado a acontecimentos como a demissão sem justa causa, a morte do trabalhador e a destinação parcial de parte do depositado para pagamento de prestações vincendas da casa própria financiada pelo Sistema Financeiro da Habitação. A remuneração desse fundo é ínfima. Correção monetária mais 3% de juros ao ano. A menor do mercado.
Sempre houve pressões para alargar as oportunidades de saque e isso se deve ao fato de o nosso trabalhador ganhar salários muito baixos, que geralmente não cobrem suas necessidades mínimas. Também porque o pecúlio que o FGTS forma tem se mostrado insuficiente para garantir, somado com a aposentadoria, bem-estar após o período de atividade. Agora, o trabalhador é surpreendido com uma notícia boa, embora esteja longe de ser ótima, como soa.
Será permitido usar o FGTS para pagar também parte das prestações vencidas da casa própria. É boa porque é dinheiro do trabalhador que está preso, enquanto a inadimplência o ameaça de perder o imóvel financiado, que pode ir a leilão para saldar a dívida. Não é ótima porque revela que há um enorme aumento na inadimplência. A cada dia, mais trabalhadores devem e não podem pagar sequer as prestações de suas casas. Um levantamento da Caixa revela que de 3,2 milhões de contratos do Sistema Financeiro da Habitação atualmente ativos, 1,14 milhão está em atraso, o equivalente a 35% do total de mutuários.
Nem todos os mutuários em atraso poderão beneficiar-se do levantamento antecipado do Fundo. Somente os inadimplentes com atrasos apurados até 31 de agosto deste ano. E terão de solicitar o benefício até o dia 27 de fevereiro de 2004. Mais restrições existem. O Fundo só cobrirá até 80% dos pagamentos em atraso. O mutuário terá de arrumar os outros 20%, o que para muitos não será uma tarefa fácil.
A medida é de se aplaudir, mas não com muito entusiasmo, uma vez que revela mais um aspecto do processo recessivo. Há redução do poder aquisitivo do trabalhador, além de desemprego crescente, nem sempre caracterizado como por justa causa, o que permite o levantamento total do Fundo de Garantia. A medida é, na verdade, raspar o fundo do tacho, dando-se ao trabalhador parte do que é seu, de forma condicionada, porque ele praticamente nada mais tem para cumprir com obrigações, como saldar as dívidas com o financiamento da casa própria. O ideal seria que o FGTS permanecesse depositado e recebendo depósitos, o que significaria que o trabalhador estaria gozando do pleno emprego. E que se estaria formando o pecúlio substitutivo da indenização, para que dele aproveitasse quando se retirasse da atividade laboral.
Mas o quadro recessivo prossegue ao longo de todos os meses do atual governo e a repetição, mês a mês, de que se trata de herança do governo passado, começa a cansar e perder credibilidade. É hora de multiplicar empregos e preocupar-se com a queda do poder aquisitivo dos trabalhadores. Permitir-lhes, de forma parcial e temporária, sacar o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço para pagar prestações da casa própria é um remendo, não uma solução.