Quinze quilos mais magro, Palocci volta à cena política

Acusado pela Polícia Federal de ordenar a violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos Costa, o Nildo, o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci retorna à cena política nesta semana com sorriso de candidato, disposto a conquistar mandato de deputado e foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF) para responder às denúncias que pesam contra ele. Quinze quilos mais magro, Palocci inicia a campanha por uma vaga na Câmara como se estivesse na ativa, carregando na bagagem, agora, a "Carta ao Povo de São Paulo".

Com dez receitas para o País "crescer mais e reduzir a desigualdade", o texto obtido pela Agência Estado, que será distribuído por ele em palestras, prega uma trégua no tiroteio político para continuar as reformas estruturais, mas tem ingredientes apimentados. Motivo: ao defender o ajuste fiscal de longo prazo e a autonomia operacional do Banco Central, ressuscita a polêmica travada com o PT e pedaços do governo.

Livre da quarentena que o impediu de falar sobre economia por quatro meses, mas sempre cauteloso no trato, o homem que foi o segundo mais poderoso da República diz, no entanto, que sua intenção não é comprar briga com ninguém. "Não quero atrito com o PT nem com setores do governo, mas quero fazer o bom debate. E penso que essa é uma discussão saudável", ameniza Palocci, em conversas reservadas com amigos.

O receituário é inspirado na "Carta ao Povo Brasileiro", que ele próprio ajudou a redigir há quatro anos, quando era coordenador do programa de governo do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Divulgado em junho de 2002, o documento foi um divisor de águas na campanha petista e ajudou a tranqüilizar o mercado financeiro.

A nova cartilha também tem o objetivo de acalmar, só que agora os demônios políticos. Foi produzida sob medida para que o eleitor esqueça o passado de denúncias envolvendo o ex-ministro e lembre apenas de seu nome associado aos bons resultados na economia.

"A política não é meu único oxigênio: ela cobra um preço muito alto das pessoas", afirma Palocci, que nega ter mandado bisbilhotar a conta de Francenildo. "Eu não guardo mágoas, não acho que fui perseguido, mas entrei no meio de uma tempestade, que começou no ano passado. Em dezembro, avisei ao presidente Lula: isso não vai parar. Pensei em sair, ele não deixou. Agora é olhar para a frente", desabafa, resignado.

Desde que foi demitido, em 27 de março, Palocci dedica cinco horas por dia para escrever um livro sobre sua experiência na Fazenda e a "parte humana de ser governo". Foi a forma que ele, médico, encontrou para enfrentar a depressão aos 45 anos. No laptop sobre a mesa de seu escritório há material suficiente para cem páginas.

A narrativa começa na campanha de 2002. Palocci garante, porém, que não lançará nenhuma linha antes da eleição. Não quer abrir brecha para que seu livro seja usado na disputa.

"Não se preocupem: é um livro do bem. Não quero expor pessoas nem fazer críticas", diz aos amigos do governo. Na tentativa de mudar de assunto, começa a falar sobre a dieta de Atkins, rica em gordura e proteína e pobre em carboidrato, que iniciou ainda no carnaval, antes de ser defenestrado da Esplanada. Atualmente, faz um regime hipocalórico, que, na sua definição, consiste em "fechar a boca". "Já ganhei do Lula por um quilo", compara ele, numa referência aos 14 quilos perdidos pelo presidente.

A rotina do Palocci candidato também vai mudar a partir desta semana, quando ele começará a viajar mais para São Paulo. Trocará as palestras sobre gripe aviária por encontros com empresários e reuniões com grupos de eleitores.

Para expor assunto tão árido, foi obrigado a ler muito. Pior: a maioria dos textos era em inglês, seu ponto fraco. "Mas artigo sobre gripe aviária eu lia com facilidade. Descobri, então, que o meu problema não é o inglês. É a economia.

Do programa de governo para a campanha à reeleição Palocci não diz palavra. "Estou afastado", justifica. Poucos acreditam. Seu livro de cabeceira – Quem é John Galt?, de Ayn Rand – mostra que o rumo econômico ainda é uma obsessão. No romance, a esquerda está no poder, o país entrou em decadência e a economia caminha para o colapso.

Se Palocci for eleito deputado, voltará a ter foro privilegiado no Supremo. Nesse caso, os inquéritos não serão arquivados, mas deslocados para a competência do STF. Até agora, pesquisas encomendadas por ele indicam que é grande sua chance de retornar à Câmara.

Em conversas privadas, Palocci revela preocupação com a imagem. No seu diagnóstico, a situação do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu – com quem teve duros embates – piorou por causa de sua "cara de mau". Não quer seguir o mesmo exemplo.

No escritório de sua casa, uma foto escondida no fundo da estante lembra os tempos de glória: Lula, o ex-ministro Jaques Wagner e ele, com os braços estendidos, apontam para a mesma direção. Hoje, apenas 14 quilômetros separam sua casa – alugada no elegante condomínio Forest Lake – do Ministério da Fazenda. Mas a Esplanada, para ele, é só uma vista de cartão postal.

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