Questão de vergonha

Um parlamentar gazear o serviço é uma falta grave, mas há coisas piores. Pior é comparecer e aproveitar-se do cargo para se locupletar, praticar maracutaias, receber mensalão ou simplesmente ocupar o cargo, ganhando altos salários, para ficar apresentando propostas ridículas ou outras bajulações para agradar cabos eleitorais.

Isso tudo acontece nos parlamentos brasileiros, das câmaras de vereadores à Câmara Federal e ao Senado, passando pelas assembléias legislativas. É certo que há parlamentares decentes. Muitos outros são é condescendentes, pois mesmo que não costumem se comportar mal, não se preocupam quando seus pares agem contra os interesses do povo ou se omitem na defesa dos direitos dos cidadãos. E há os que conspurcam o bom nome dos parlamentos. No Congresso Nacional, comprometem o conceito daquele poder e laboram contra a consolidação do regime democrático.

A tudo temos assistido, ano após ano, e ultimamente muito mais, ou porque surgiu uma epidemia de imoralidade na política e no poder público, ou em razão de que ficamos mais atentos. E mais atentos estão os meios de comunicação, denunciando com destemor, o que tem provocado ataques à sua liberdade, como se ela não fosse um dos componentes essenciais do regime democrático.

A autoconvocação do Congresso Nacional, para funcionar em período que seria de recesso, está dando o que falar. Não porque inexistisse uma importante pauta a ser cumprida e que não foi apreciada no período regular de funcionamento da Câmara e do Senado. Mas porque, convocando-se, os parlamentares passaram a ter direito de embolsar quase R$ 100 milhões de pagamentos extras. E o pior: a grande maioria não apareceu para trabalhar.

O advogado Pedro Eloi Soares, interpretando a indignação de milhões de brasileiros, entrou na Justiça com uma ação popular pedindo a notificação dos presidentes da Câmara e do Senado, mandando que eles cortem o ponto dos faltosos e não se paguem os dias não trabalhados. Para um trabalhador comum, o corte do ponto é um fato corriqueiro e parece mais do que justo que se exija a mesma punição para os representantes eleitos do povo.

Acontece que na democracia deve haver harmonia e independência entre os poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Por isso, entendeu o desembargador federal Carlos Augusto Pires Brandão, do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, que devia cassar a liminar concedida na ação popular impetrada pelo advogado.

A independência e harmonia entre os poderes não pode sofrer atentados, nem que estes sejam contra assaltos aos cofres públicos praticados por representantes eleitos do povo.

Felizmente, como alerta o desembargador federal, existem outros meios para que não sejam remunerados os congressistas que não trabalham. Os regimentos da Câmara e do Senado têm normas rigorosas sobre a matéria. Pelo menos o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, promete cumpri-las.

Melhor do que esta situação em que se invoca a independência e harmonia entre os poderes para justificar esse assalto ao erário é o que já está proposto e poderá ser aprovado: acabar de vez com os pagamentos extras nas convocações extraordinárias.

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