A situação econômico-financeira do Brasil, em meio à tempestade desencadeada pelo mercado, é mais de ótica do que de ética, como supuseram alguns oposicionistas. Há os que pensam que a corrupção é o mal maior, o que, no campo econômico-financeiro, é um equívoco. A corrupção, quando pequena, é como a maçã podre que, se não extraída, pode estragar todo o cesto. Quando em volume ponderável, gera insegurança nos negócios e serve como exemplo que muita gente passa a seguir. Quando generalizada, aí sim, prejudica as finanças e a economia de um país em termos globais, em percentual significativo, porém não absoluto. E beneficia sempre a minoria que detém o poder. Daí ser mais comum nas ditaduras que nas democracias.
No caso brasileiro há corrupção em alguns níveis de governo e na iniciativa privada. Seu nível merece atenção redobrada. Mas está longe de ser a causa da tempestade. A tempestade que enfrentamos é mais uma questão de ótica.
Na ótica de muitos investidores estrangeiros, existe o risco do calote ou da quebra por falta de capacidade de pagamento da dívida. Risco que se torna mais presente, na medida em que pesquisas levam a crer na vitória de algum oposicionista mais radical. Analistas, e inclusive candidatos à sucessão de FHC, sustentam que há também um risco sistêmico. A dívida estaria chegando ao ponto de impagável.
Há também a ótica dos especuladores. Estes querem crise porque ganham com ela. O dólar nas alturas prejudica a muitos e beneficia a outros mais. Visão isenta vamos encontrar no Financial Times, edição de ontem. O prestigioso jornal, analisando a situação brasileira, conclui que o declínio continuado dos mercados brasileiros está se transformando em pânico, especialmente com a debilitação do real frente ao dólar. O problema imediato é que o País está perdendo o acesso aos mercados internacionais, com o corte de suas linhas de crédito e financiamento comercial pelos bancos. As empresas brasileiras, que precisam rolar US$ 2 bilhões por mês em obrigações em dólar, vêm adquirindo a moeda norte-americana a fim de amortizar suas dívidas. Isso força a desvalorização do real e torna mais pesado o serviço da dívida externa brasileira.
A queda de José Serra nas pesquisas e a moratória argentina são também lembradas pelo Financial Times como motivos adicionais à aversão crescente dos investidores aos riscos que dimensionam de acordo com sua ótica. Conclui o prestigioso jornal, entretanto, que “os fundamentos macroeconômicos e financeiros do Brasil são muito melhores do que os da Argentina – o País tem cumprido as metas de seus acordos com o FMI e há alguns anos registra superávit primário em seu orçamento fiscal. Refere-se, ainda, às desastrosas declarações do secretário do Tesouro americano Paul O’Neill, dando a entender que a Argentina e o Brasil estão no mesmo barco, como altamente prejudiciais ao Brasil.
Aconselha o artigo do jornal que, para solucionar o problema, o FMI deveria permitir que o Brasil usasse parcela maior de suas reservas, pois no atual acordo está obrigado a mantê-las num mínimo de US$ 15 bilhões. E que os candidatos de oposição, Lula, Ciro e Garotinho, deveriam considerar seriamente um novo acordo com o FMI que sustente a estabilidade do País durante o período de transição política. A segunda cartada, um exame menos apaixonado e mais conseqüente de um novo acordo, começa a ser lançada sobre a mesa.