Já não se fazem petistas como antigamente. Aqueles homens barbudos e mulheres rubras de ira, lutando por causas socialistas, se possível organizadamente. Na base de seja-o-que-deus-dará, se necessário. Tinham uma espécie de chama santa que lhes fazia ferver o sangue.

Eram os que não mediam conseqüências, nem as que pudessem sofrer nem as que o Brasil devesse enfrentar, se sua pregação um dia viesse a transformar-se em realidade. Eram revolucionários e aspiravam o poder com eleições, se possível, sem ela se não houvesse outro meio senão a luta de classes. Na esquerda brasileira, formaram o partido mais autêntico, porque tinha massa, militantes, segmentos numerosos da população. Os demais eram apenas siglas ou fantasias. A senadora alagoana Heloísa Helena, do PT, é antiga militante. Tão antiga quanto o próprio partido.

Participou de todas as suas lutas ao lado de trabalhadores do corte de cana, dos operários, fosse em passeatas ou mesmo greves, agüentando a reação dos patrões, da polícia, dos governos sustentados pela burguesia, que ela e seus companheiros consideravam retrógrada, conservadora.

Ela e a maioria dos petistas sempre foram coerentes com as idéias que pregavam na busca do poder. Muito poucas vezes pararam para pensar seriamente se eram só protestos ou verdadeiras propostas.

Os petistas de ontem eram coerentes com a ideologia abraçada. Abraçada e abandonada logo que conseguiram chegar ao poder com a eleição de seu líder maior, Lula, ele também um petista da primeira hora, militante disciplinado, ideologicamente identificado com o partido e o seu discurso esquerdista eloqüente, bem intencionado e não raro inconseqüente.

No poder, diante da realidade brasileira e da obrigação de governar vencendo os reais problemas, o PT fez esdrúxulas coligações com partidos de centro e de direita. Aceitou apoio dos inimigos de suas idéias, mas amigos do poder. Fez coligações inimagináveis para o Partido dos Trabalhadores. Apenas uma meia dúzia de petistas da cúpula do partido, se tanto, continuou fiel às bandeiras sempre antes desfraldadas e à ideologia que era a alma da agremiação.

Dentre eles estão o deputado federal Babá, do Pará; a deputada Luciana Genro, do Rio Grande do Sul, filha de um dos ministros do governo Lula; o deputado João Fontes, de Sergipe e, mais no papo que nos atos, o senador Paim, vice-presidente do Senado Federal, e o senador Suplicy, sempre uma voz ponderada na agremiação e nas hostes governistas.

Desse grupo, a senadora Heloísa Helena sempre esteve à frente, dando a cara para bater. Votou, em qualquer ocasião, em favor das idéias petistas, o que incluía ser contra disposições das reformas, notadamente a da Previdência. Foi contra a cassação de direitos do funcionalismo e dos trabalhadores aposentados; contra a cobrança de contribuição previdenciária destes, e colocou sua ideologia petista acima da disciplina partidária, dominada agora pelos petistas indisciplinados. É condenada à expulsão do partido, o que lhe tem valido protestos públicos e lágrimas. E uma corrente de solidariedade que já começou, reunindo inclusive não petistas. O slogan é “Coerência, PT, expulsar por quê?”. Talvez esse movimento não ocasione um racha expressivo no partido, pois é governo e pouca gente quer abandonar as benesses do poder. Mas demonstra que, se o povo achava que a maioria dos partidos não era confiável, tem aí mais um a incluir na sua lista.

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