Soou como uma bomba a proposta do ministro da Previdência, Amir Lando, de aumentar a carga tributária de trabalhadores e empresas para pagar a correção de aposentadorias do INSS. Afinal, cogitou-se a elevação em três pontos percentuais da alíquota da contribuição previdenciária, a partir de 2005 e por um período de cinco anos. Uma solução drástica em qualquer época, mas, principalmente, em tempos de arrocho na economia, apesar das reiteradas promessas de não elevar a carga sobre salários e folha de pagamentos.
É inacreditável que ainda se considere a possibilidade de resolver um problema como esse com um recurso que o País não tem mais: o aumento da carga tributária. Não há argumento a favor da transferência da responsabilidade pelo pagamento apenas para a iniciativa privada, até porque não foram esgotadas todas as alternativas que justifiquem a medida. Sob o ponto de vista atuarial, por exemplo, o regime previdenciário dos trabalhadores brasileiros, administrado pelo INSS, está bem-estruturado.
Ou seja, as contribuições pagas pelos empregadores ao Instituto são compatíveis com a regra de concessão das pensões e das aposentadorias. E, parte do desequilíbrio que no ano passado atingiu R$ 25 bilhões decorre de concessões de natureza não-previdenciária criadas por lei e pagas pelo INSS. Entre elas, o subsídio implícito aos trabalhadores rurais, aos portadores de deficiência e aos idosos acima de 65 anos de idade.
Contribui, também, de forma substancial para esse déficit o tamanho do mercado de trabalho informal, que já abrange quase 50% dos trabalhadores do País. Considerando que o “regime” financeiro no qual se baseia a Previdência dos que estão na iniciativa privada é o de repartição, isso significa que os que trabalham contribuem para pagar os benefícios daqueles que, por qualquer razão, não podem trabalhar. Fica claro que para a manutenção do equilíbrio financeiro e para não sobrecarregar apenas quem contribui é fundamental que todos que trabalham paguem a conta.
Por isso, é necessário trazer os trabalhadores do mercado informal para ajudar a pagar a conta previdenciária (e serem beneficiados no futuro), antes de se propor um aumento da alíquota de contribuição. Qualquer discussão que deixe de fora esse segmento é doutrinariamente errada, pois, além de sobrecarregar patrões e empregados, trará conseqüências danosas à economia.
Aliás, medidas administrativas no INSS têm uma repercussão muito grande no cotidiano dos trabalhadores brasileiros. Todos recordam o desastre que foi o recente recadastramento de segurados acima de 90 anos de idade, bem como a greve dos serviços da perícia médica. Não é exagero afirmar que os atos gerenciais do Instituto precisam ser melhor analisados, assim como considerados os efeitos de uma administração inadequada do sistema previdenciário.
Ressalto em cada palestra, em cada artigo e em cada entrevista que participo que a previdência social tem suas especificidades, sendo uma atividade técnica fundamentada na matemática, estruturada de acordo com a doutrina universal, com princípios e fundamentos bem-definidos. Além disso, o INSS, como uma grande empresa de seguros, deve ser estruturado e gerenciado de forma profissional por servidores de carreira ou por executivos com capacitação adequada.
Uma empresa da amplitude do INSS, da qual dependem milhões de brasileiros, não pode sofrer influência externa em sua gestão como vem acontecendo. È público que, cada vez mais, na escolha de seus dirigentes predomina a indicação de políticos e de sindicalistas sem nenhuma qualificação previdenciária ou administrativa. Essa recomendação faz com que a administração previdenciária esteja hoje muito mais perto do caos do que do profissionalismo requerido.
O conhecimento mais profundo da Previdência evitaria situações constrangedoras como essa proposta de aumento de alíquota de contribuição, que foi capaz de desagradar a todos.
Aqui, chamo a atenção para uma pergunta: por que o déficit previdenciário, em apenas sete anos, passou de R$ 2,5 bilhões para R$ 25 bilhões – e com a perspectiva de chegar a R$ 30 bilhões neste ano? È possível que na resposta, além do aumento do mercado informal, a ineficiência gerencial represente um alto valor, sendo preciso investigar com muito critério essa questão.
Com certeza, uma boa administração elevaria a eficiência da arrecadação, aí incluída a recuperação de dívidas. Ainda como exemplo, a reestruturação dos serviços de perícia médica, nos traria como retorno pelo menos a metade do valor que o ministro propôs conseguir com o aumento da alíquota.
Muitas lições ficam desse episódio. A mais óbvia é que, antes de pedir sacrifícios à população, o poder público tem que fazer sua parte. Minha sugestão é que, antes de discutir aumentos de contribuição, se deva incluir na agenda da Previdência questões fundamentais, como a melhoria gerencial e a inclusão do mercado informal no sistema previdenciário. Não se tratam de soluções mágicas, mas, sem dúvida, são as mais adequadas.
Reinhold Stephanes é secretário de Administração e Previdência do Paraná e ex-ministro da Previdência Social