Quem estuda, passa. Esta é a lição, aparentemente óbvia mas convicta, transmitida por Airton da Costa, recém-aprovado no Exame de Ordem da OAB aplicado pela Seccional da entidade de São Paulo, que aprovou apenas 6,6% dos bacharéis conforme resultado divulgado na última semana. ?Estudei e passei?, diz ele, orgulhoso em sua simplicidade. Airton é o próprio testemunho de que seu ensinamento é sério: filho de uma família desestruturada e extremamente pobre, com pai alcoólatra, ele atravessou quase toda sua infância vivendo na rua, trabalhando em depósito de lixo e catando papelão. ?Só assim arrumava um dinheirinho para ter o que comer – e quando sobrava algum ainda ajudava minha família.?
Além de queimar pestana nos livros nas horas vagas, estudando com afinco desde o primário, o curso secundário e a faculdade particular onde se formaria bacharel em Direito, em Diadema, no ABCD paulista, o ex-menino de rua Airton da Costa adicionou a essa disciplina pessoal um sonho, como ele mesmo conta. ?Ser advogado um dia era um sonho de criança. Sonhava tanto que, enquanto meus amigos jogavam bola, eu brincava de advogado de acusação?. Seu depoimento continua: ?Até os meus dez anos fiquei nessa situação de catar papelão e dormia na rua. Meu alimento, a maioria, vinha do lixão. Depois, passei a trabalhar capinando quintal, fazia limpeza em residências?.
Formado em 2004, aos 40 anos – paga prestações da faculdade até hoje e reclama dos elevados aumentos -, Costa conta que aos 14 conseguiu um emprego em uma empresa de transformadores elétricos, em Birigüi (SP), seu primeiro emprego fora da luta pela sobrevivência com o lixo. Ali, aos 15 anos, num acidente de trabalho, perdeu um dos dedos da mão direita numa guilhotina. Este é mais um ponto na vida de Airton que lembra a do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Costa fez também o curso de torneiro mecânico, aos 16 anos, no Senai de Araçatuba (SP), e com essa formação, voltaria à região do ABC nos anos 80.
Ele afirma que passou no vestibular sem fazer cursinho, mesmo porque não dispunha de dinheiro para bancá-lo. Estudou sozinho. O curso de Direito, lembra ele, foi feito com muita dificuldade, porque trabalhava à noite e estudava durante o dia.
?Eu trabalhava a noite inteira e corria para a aula, pois cursava a faculdade de manhã?, recorda Airton da Costa. ?Muitas vezes tive que dormir dentro de carro no pátio da escola. No primeiro Exame de Ordem que tentei, passei na primeira fase, mas não obtive aprovação na segunda fase. Fiz o segundo exame e, novamente, passei na primeira prova e fiquei reprovado na segunda. Não passei por pouco. Era a tal cautelar de arresto que nunca tinha visto na vida; fui muito bem na peça, tirei cinco de nota, mas nas questões não fui muito bem por pura falta de experiência.?
Para sustentar sua observação de que quem estuda é aprovado, Airton da Costa ressalta que para ser aprovado no último Exame de Ordem teve que se desdobrar. Isto porque, além de estudar para ele, dedicava-se simultaneamente a um concurso para o Conselho Tutelar da Infância e Adolescência de Diadema – no qual também foi aprovado. ?Quase não tive tempo de estudar para esta última prova da Ordem, porque disputei uma vaga no Conselho Tutelar de Diadema e, devido à minha condição muito humilde, não pude priorizar o Exame de Ordem.?
Agora, seu sonho está prestes a se tornar realidade: com a inscrição na OAB, Airton da Costa poderá finalmente exercer a advocacia, melhorar sua condição de vida, de sua família e, ainda, ajudar o próximo nessa profissão – outro objetivo de vida que sempre perseguiu.
?Quando era menino de rua, tínhamos um pequeno clube com atividades esportivas, culturais, tudo era organizado pelos moleques da rua e eu sempre puxava para o lado do advogado?, lembra. ?Fazíamos brincadeiras e quando algum garoto infringia alguma regra, havia o julgamento. Ninguém queria ser advogado de acusação. Eu tinha de oito para nove anos e não conhecia as regras do Direito, mas gostava de agir como se fosse advogado. Era um sonho que persegui a vida toda; hoje, tenho 42 anos e, graças a Deus, consegui realizar o meu sonho: sou advogado?, conclui o doutor Airton da Costa.
(Fonte: www.oab.org.br)