O Código Tributário Nacional (CTN) completa 40 anos. Editado sob a égide de um regime de exceção, traz, em vários de seus dispositivos, marcantes traços daquele período. Embora elaborado por especialistas consagrados fato que proporcionou uma elevada qualidade técnico-legislativa, para os fins a que se propunha o texto seu conteúdo, frente à exigência de um Estado moderno, eficiente, justo e democrático, tornou-se de tal forma ultrapassado, que a beleza da forma não contrabalança o peso de sua obsolescência.
Mas há de se ter cautela. O risco de se precipitar na substituição de uma lei que está em vigor há relativamente bastante tempo é o de trocá-la por algo pior. Quando o ranço ideológico rouba a cena e toma o lugar do espírito público e da precisão técnica, há grandes chances de que o que poderia ser um grande avanço tornar-se um triste retrocesso. Os poderes constituídos ainda não produziram um texto que pudesse substituir à altura o atual CTN, de tal modo a atender as exigências dos tempos atuais possibilitando um nível de arrecadação razoável, logo não excessivo, para custear os serviços públicos, além de alargamento da base contribuinte, eliminação dos problemas que levam à informalidade e promoção da consciência geral de cooperação entre a sociedade e o Estado.
Há de se mudar certas idéias, que se tornaram paradigmáticas. O próprio conceito de tributo consagrado no CTN tem-no como uma prestação compulsória, pura e simplesmente, sem dispor sobre sua destinação ou sobre qualquer contraprestação do Estado para com o cidadão. Ainda mais principesca é a regra de que qualquer situação, desde que definida em lei, e atendidos certos requisitos, pode gerar a obrigação de pagar imposto, mesmo quando o ente federativo não demonstre sua viabilidade ou racionalidade econômica nem ofereça ao contribuinte a justa retribuição.
A instituição de um tributo deve ser orientada por uma motivação bem conhecida do público e a ela inexoravelmente atrelada. Devemos pensar o país como um grande condomínio, onde todos têm a obrigação fundamental de colaborar com o custeio e manutenção do patrimônio comum e dos serviços de interesse da coletividade, de acordo com sua capacidade econômica. Por outro lado, os recursos devem ser administrados e empregados de acordo com sua razão de estar nos cofres públicos, de maneira republicana e por meio de instrumentos democráticos.
Embora o conceito de sujeição tributária esteja sedimentado, é preciso também sobre ele tecer uma reflexão filosófica. Atualmente, na nomenclatura legal, o sujeito ativo da relação tributária é o ente público e o sujeito passivo é o contribuinte. Ora, sendo (ou devendo ser) esta uma relação bilateral, é preciso que sejam explicitadas, também, as obrigações, na prática, dos entes tributantes, que se referem a uma justa contraprestação, na forma de bens e serviços públicos, pelo pagamento dos tributos que exigem em virtude de lei aprovada através de processos constitucionais.
Em síntese, o sistema tributário, como um todo, e em particular, o CTN deve voltar seu foco não somente no tributo, mas, também, e, sobretudo, nos direitos do contribuinte e na harmonia e equilíbrio da relação entre este e os diversos órgãos em que se subdivide o Estado brasileiro. Nem mesmo com um sentido estritamente técnico pode-se admitir tal precedência do Estado sobre o cidadão-contribuinte, como hoje vigora, num tempo em que, cada vez mais, a economia brasileira é afetada pela maneira como são aplicados os recursos que o fisco retira da sociedade.
Roberto Carlos dos Santos e Leandro Tripodi são técnicos da Receita Federal filiados ao Sindireceita (Sindicato Nacional dos Técnicos da Receita Federal).
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