De início cumpre esclarecer que os princípios surgem como conseqüências de uma verdade universal e estabilizada, que exprime por si só seu conteúdo. O conceito de princípio pode ser visto sob dois enfoques. O ontológico, que segundo Aristóteles, é aquilo pelo qual uma coisa existe ou se conhece; e o lógico, como sendo aquilo que nos possibilita conhecer a coisa como existente. O sentido lógico é o que destina-se ao conhecimento e é o que nos interessa. Assim, no plano jurídico, princípio é o conhecimento primeiro e máximo de um determinado objeto de conhecimento jurídico e dele servindo de fonte.
Vários são os princípios existentes como supedâneos do direito e do Estado Democrático de Direito, entretanto cabe aqui analisar o princípio de acesso a justiça e sua efetiva garantia no âmbito processual com relação a barreira financeira imposta pelo próprio Estado, devido principalmente pelo elevado valor das custas processuais.
A Constituição Federal em sua art. 5.º, XXXV, garante que não haverá lei alguma capaz de excluir da apreciação do Poder Judiciário a oportunidade de apreciar lesão ou ameaça de lesão a direito. Este artigo visa garantir ao cidadão o direito de provocar o pronunciamento jurisdicional acerca de um litígio. Ele visa garantir que não haverá restrição de acesso à justiça. Pois.
Em contrapartida, no nosso dia-a-dia não é o que ocorre. Não raramente nos deparamos com barreiras difíceis de serem transpostas em virtude do elevado valor das custas processuais cobradas pela serventia judicial. O problema se estabelece, pois eis que, de um lado temos a Carta Magna assegurando o acesso à justiça, e de outro lado o cidadão, impossibilitado de exercer seu direito de ação em virtude desta barreira econômica, que não raro deixam de pleitear seus direitos por não terem condições de arcar com as custas processuais. Este tipo de problema atinge como sempre, aqueles que mais necessitam da tutela jurisdicional: os fracos e oprimidos.
O princípio constitucional de garantia do Acesso à Justiça é, por sua vez, garantido por outro preceito constitucional, qual seja, o do art. 5.º, LXXIV – “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.” Ora, este outro preceito também não vem sendo cumprido. Digamos que, apesar de ter o apoio da sociedade organizada, através das faculdades de direito ao oferecerem assistência jurídica gratuita com os alunos dos cursos de graduação supervisionados pelos advogados, este tipo de serviço, apesar de muito nobre não é capaz de atender toda demanda da população necessitada. É preciso também restabelecer e organizar a Defensoria Pública e captar bons profissionais interessados neste ramo da carreira jurídica.
Ainda, além disso, é preciso acima de tudo, rever qual é o real objetivo dos ofícios do foro judicial, que com certeza não é meramente comercial, ou pelo menos não deveria sê-lo. A finalidade do artigo 3.º da Constituição Federal deve ser atendido, e esta é uma das maneiras de promover uma sociedade livre, justa e solidária. Sem condições de acessar a justiça, em razão de barreiras financeiras não é possível atender aos princípios constitucionais do Acesso à Justiça, e tantos outros como por exemplo o da isonomia.
Os responsáveis por qualquer tipo de mudança na maneira de organizar as serventias judiciais não podem ser tímidos, pois em outros Estados os cartórios funcionam tanto quanto no nosso, e não cobram horrores pelos serviços, são estatizados e não privados. Ainda cabe aqui ressaltar que além deste serviço ser cobrado, não raro nos deparamos com pessoas capazes de achar que estão prestando um favor ao advogado ou à parte, tratando-os com falta de atenção e desdém.
Por isso é que ao buscarmos na constituição as garantias para fazer valer os direitos de todos os cidadãos não podemos deixar de lembrar que uma sociedade só será justa se proporcionar meios para se buscar a justiça e com isso alcançar os fins sociais a que o Estado se propõe.
Milken Jacqueline Cenerini
é advogada, especialista em Direito Processual Civil e Direito Civil (CIES). Twenty-two points, plus triple-word-score, plus fifty points for using all my letters. Game’s over. I’m outta here.