Previdência em xeque

A respeito da previdência pública brasileira há duas teorias distintas. A quase unanimemente acatada por este e os governos que o antecederam é de que beneficiário do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) deve ganhar pouco, mesmo tendo contribuído durante uma vida inteira de trabalho. E se tiver habilidades de faquir, precisa tentar não passar fome. Há uma solução muito comum nas grandes cidades. Vestir-se de cartazes, um na frente e outro atrás, e sair fazendo propaganda disso ou daquilo. Aí, arruma mais alguns trocados para amainar a miséria que lhe inflige a aposentadoria ou a pensão.

A outra teoria é que a clientela da Previdência é culpada por suas próprias vicissitudes; que não contribui com dinheiro suficiente para manter o sistema, que é altamente deficitário, e o governo não tem nada com isso. Lava as mãos como Pilatos, enquanto crucificam velhinhos e doentes, que, afinal de contas, não prestam mais para a vida laboral e incomodam, com suas doenças, nas imensas filas do INSS.

Existe uma pequena corrente revolucionária a entender que o governo tem responsabilidade com o que acontece. Que a Previdência não pode nem deve ser auto-sustentável. Que o poder público tem de bancá-la, pelo menos parcialmente, e tal não é favor algum. É dever do Estado, pois entre suas obrigações está prover para que haja bem-estar social. Se a Previdência tira dinheiro do Tesouro, não comete crime. Pelo contrário, tira o que este lhe deve. Ou melhor, até muito menos do que deve. Seria obrigação de qualquer governo voltado de fato para o social.

Temos um novo ministro da Previdência, o senador Romero Jucá. Sua nomeação representa a única reforma do ministério, tão discutida e comentada nos meios políticos. Mas parece que entrou no governo com pé esquerdo. Uns dizem que começou com o rabo preso, devendo explicações à Justiça por negócios particulares duvidosos, praticados antes de ser ministro. Ele diz que seu rabo não está preso e promete prová-lo. Mas já começa sob suspeitas.

Continua no cargo e, para mostrar serviço e reduzir o déficit do sistema, decidiu mudar as regras do auxílio-doença. Mandou recalculá-lo, através de medida provisória, dificultando o acesso do trabalhador a esse benefício. O trabalhador recebeu a conta das supostas e até possíveis maracutaias que são feitas com o benefício. A grita foi geral e Jucá voltou atrás. Reconheceu o erro, para não dizer, a burrada.

Agora, vem mais um capítulo da por enquanto curta passagem de Romero Jucá pelo Ministério da Previdência. Os funcionários do INSS entraram em greve de advertência, protestando contra maus salários, falta de pessoal, de plano de carreira, rejeição a um aumento de vencimentos de 0,1% e não-cumprimento de promessas antes já feitas. E, de outro lado, milhares de pobres beneficiários desse serviço previdenciário batendo com a cara na porta, sem atendimento, mesmo que indispensável e urgente. Uma greve que, mesmo parecendo justa, é inadmissível em se tratando de serviço público essencial. Em matéria de Previdência, estamos colhendo os frutos de décadas de imprevidência.

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