Introdução
A aprovação da Lei n.º 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que tornou obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira nos níveis fundamental e médio, especificamente a luta dos negros no Brasil, não só preenche uma lacuna existente desde os primeiros textos da história nacional e da intelectualidade brasileira, como revela a necessidade de investigar para conhecer a existência de muitas Áfricas no Brasil.
Esta necessidade de aprofundamento sobre o tema justifica a realização deste trabalho que tem como objetivo analisar a participação social africana à luz da percepção dos alunos das 7.ª e 8.ª séries da Escola Estadual Rosa Frederica Johnson do turno matutino, situada à Rua João Antunes de Lara, 47, bairro Cachoeira, Almirante Tamandaré-PR. A pesquisa foi realizada entre os dias 22 e 23 de julho deste ano.
Fundamentação teórica
Nas últimas décadas os estudos historiográficos brasileiros sobre a escravidão têm trazido novas contribuições para o entendimento da sociedade brasileira na qual se manifestam as muitas faces da África. Diversos autores têm se dedicado à análise desse sistema e de suas implicações. Alguns interpretam a partir da ótica senhorial, outros a partir de uma visão mais crítica.
Para Gilberto Freyre, a escravidão é tida como um sistema de trabalho compulsório, humanizado pela benevolência do senhor. Essa visão foi criticada por autores como Sílvia Lara pois criou no país a imagem da relação mansa e bondosa entre senhores e escravos devido à sua concepção poética da escravidão no Brasil.
Elciene Azevedo destaca Luiz Gonzaga Pinto da Gama o mais renomado advogado abolicionista da capital paulista, que fez da lei e das letras suas armas na luta pela liberdade. Defendeu os quatro escravos que mataram o seu senhor e depois se entregaram à Polícia, por analisar que a escravidão é um crime. Portanto, o escravo que contra a escravidão se insurgia não poderia ser considerado criminoso.
Mônica Lima enfatiza que até agora pouco se estudou da história do negro. Os antigos historiadores ignoraram a participação africana. No século XIX, em alguns livros o escravo aparece como agente de cultura popular, para o samba, a capoeira, etc., mas em geral é considerado pessoa oprimida. Estudos recentes mudam essa visão. No entanto, muitos professores não conhecem sua história e nem a história da África; outros consideram a própria África um lugar atrasado. Trata-se de resgatar a África e resgatar a história do Brasil.
Resultados
Dos 88 alunos entrevistados, 17 (19,31%) afirmaram que existe preconceito contra os negros em sua comunidade, 33 (37,51%) admitiram que não existe preconceito e 38 (43,18%) disseram que às vezes existe. Nesta pergunta ficou evidenciada acentuada taxa de discriminação, uma vez que somente um terço dos estudantes afirmou que o negro vive sem preconceito.
Mas quando a pergunta abordou se existia preconceito contra o negro rico, 13 (14,78) alunos disseram que sim, 54 (61,36%) disseram que não e 21 (23,86%) escolheram às vezes. Aqui a fala de Aramis Chain, livreiro e professor de História, está correta: no Brasil, a segregação se dá por dinheiro. Existe uma falsa moral na sociedade.
No tocante ao negro ter fácil acesso ao emprego, 17 (19,31%) optaram por sim, 70 (79,56%) disseram não e o restante (1,13%) não responderam. Sem dúvida, os estudantes observaram a não preferência por parte dos empresários em admitir o negro o que comprova racismo exacerbado.
Quanto aos professores tratarem de assuntos de interesse dos negros na escola, 24 (27,27%) alunos disseram sim, 15 (17,04%) disseram não e 49 (55,69%) optaram por às vezes. Os dados mostram ainda que a escola e o professor estão falhando no resgate da cultura negra.
Considerações
O quase total desconhecimento sobre o negro é facilmente identificado neste trabalho, o que é lamentável, pois ele é uma de nossas matrizes. Embora a Lei 10.639 esteja aí para ser cumprida, ainda falta muito amadurecimento para aceitar o negro como sujeito social. O trabalho da jornalista Fernanda da Escóssia confirma isso. Aos 20 de novembro de 2003, o jornal Folha on-line trazia a seguinte manchete: “Brancos detêm 74% da renda brasileira”. No primeiro parágrafo da matéria a jornalista frisava que de cada R$ 4,00 de rendimento produzido no Brasil, quase R$ 3,00 “são recebidos por pessoas brancas. Ou seja, de todo o rendimento, somando salário, aposentadoria, programas de renda mínima e aplicações financeiras, 74,1% ficam com os brancos”. O resultado deste percentual foi coletado pela ONG-Organização Não-Governamental Observatório Afro-Brasileiro que teve como referência os dados do Censo 2000 do IBGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Enquanto houver diferenças dessa natureza, o País continuará disperso, atrasado. O crescimento de alguns só é real se todos crescerem, principalmente no respeito à diversidade étnica.
Jorge Antonio de Queiroz e Silva é pesquisador, professor, historiador. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.
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