Por detrás das paredes

São exatos 42 dias de agonia. Desde a noite de 29 de março, quando Isabella Nardoni foi encontrada no gramado do edifício London, em São Paulo, somos bombardeados por notícias quase ininterruptas sobre o assunto. O auge da busca desenfreada por informações aconteceu durante a semana, quando o casal Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, acusado pela polícia e pelo Ministério Público de ter assassinado a menina de 5 anos, se entregou após ter sua prisão preventiva decretada.

As emissoras de televisão interromperam sua programação para acompanhar, por todos os ângulos, a chegada do casal a um distrito policial de São Paulo. A TV Globo chegou a perder o primeiro gol do São Paulo na partida da Copa Libertadores contra os uruguaios do Nacional. Uma repórter da Rede TV! trocou empurrões com Anna Carolina na entrada da delegacia. Tudo para não perder uma só imagem na disputa pela audiência.

Mas por que todo este desespero? Qual o motivo das emissoras de TV (e os jornais, e as rádios, e os sites de internet) abdicarem até de alguns princípios éticos para tentar descobertas sobre o caso Isabella?

O motivo está do outro lado da tela. Somos todos nós, que repudiamos com veemência as atitudes da imprensa, mas seguimos ávidos para saber alguma novidade da história de terror. Estamos interessados em saber qual será a reação das prisioneiras de Tremembé quando Anna Carolina chegar; queremos ver em qual cela Alexandre passou a noite antes de ser transferido; batemos palmas quando os apresentadores sensacionalistas bradam por melhora na segurança.

Fazemos isso com um certo sadismo, aquele desejo recôndito de acompanhar situações trágicas, como parar na frente do prédio onde há um cidadão querendo se jogar lá de cima, ou diminuir a velocidade do carro para ver o acidente com mais calma, ou mesmo lotar as calçadas para ver a reconstituição de um crime, como aconteceu há dois domingos.

Mas, perguntados, reclamamos dos excessos e lutamos pela melhoria na cobertura da imprensa. Estamos escondidos atrás de uma parede, mas com um aparelho de TV ligado.

Torcendo, lá no fundo, que Isabella descanse em paz.

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