Em ano eleitoral, a Lavagem do Bonfim, maior festa religiosa da Bahia, que recebeu nesta quarta-feira, 15, o título de Patrimônio Imaterial Nacional do governo federal, costuma ser um termômetro da popularidade de governantes e candidatos da Bahia.

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Os políticos prestigiam o cortejo de oito quilômetros entre as Basílicas de Nossa Senhora da Conceição da Praia e do Senhor do Bonfim, na Cidade Baixa de Salvador, por onde passam mais de 1 milhão de fiéis, para fazer corpo-a-corpo com os eleitores e tentar colher aplausos e cumprimentos – apesar de, rotineiramente, receberem vaias. Os partidos aproveitam a exposição para definir posições políticas e, por vezes, lançar ou firmar candidaturas.

Foi logo após o cortejo de dois anos atrás, observando a reação da população, por exemplo, que as oposições ao governo petista de Jaques Wagner no Estado fecharam questão em torno da candidatura do então deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM) à prefeitura de Salvador. ACM Neto acabou eleito, ao fim de 2012, vencendo a disputa contra o petista Nelson Pelegrino, no segundo turno.

Este ano, porém, a política acabou ofuscada no cortejo, nesta quinta-feira, 16, por causa de duas novidades introduzidas no evento pela própria administração de ACM Neto. A primeira foi a criação de um cortejo católico antes do início do tradicional, de origem nas religiões de matriz africana. A outra foi a fiscalização rigorosa da proibição de faixas, painéis, placas e blimps publicitários no cortejo – como são proibidos em quaisquer festas públicas na capital baiana desde 2000, de acordo com um decreto que nunca havia sido, de fato, obedecido na cidade.

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Com esta última novidade, os políticos que participaram do evento acabaram sendo “camuflados” no cortejo. Sem faixas e blimps de partidos e coligações ao redor, não passavam de mais algumas pessoas vestidas de branco no meio da multidão. Só quem estava perto e notava a movimentação dos seguranças conseguia percebia a presença deles. “Acho que ficou melhor assim, sem as faixas e os cartazes”, comentou o governador Wagner. “A campanha de verdade começa em junho ou julho.”

Já a criação do cortejo católico, realizado antes da caminhada comandada pelas baianas tipicamente trajadas, causou uma situação inusitada. Em um evento que reuniu o governador baiano, uma ministra (Marta Suplicy, da Cultura), prefeitos de dezenas de cidades, centenas de políticos, entre eles todos os principais pré-candidatos ao governo baiano – Rui Costa (PT), Lídice da Mata (PSB), Geddel Vieira Lima (PMDB) e Paulo Souto (DEM) – e até um pré-candidato à presidência (o senador do Amapá Randolfe Rodrigues, do Psol), o principal personagem foi um padre.

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Responsável pela paróquia do Bonfim, Edson Menezes não iniciou sua tradicional mensagem de boas-vindas aos fiéis até que o cortejo liderado pelas baianas se juntasse ao católico, que havia chegado à frente da basílica uma hora antes. “Vamos mostrar que este é um espaço de união, não se segregação”, discursou, da varanda superior da igreja, em aparente crítica à medida de separar as celebrações. “Só vamos começar quando as baianas estiverem aqui na frente. O Senhor do Bonfim abraça a todos.”

Atalho

Entre os políticos, chamou a atenção o fato de o governador Wagner, que já não havia participado do cortejo no ano passado, preferir não enfrentar a caminhada. Acompanhado da ministra Marta Suplicy, ele deixou o trajeto pouco depois do início e seguiu, de carro, até a Colina Sagrada, no topo da qual fica a basílica do Bonfim.

Coube ao pré-candidato petista ao governo, Rui Costa, e ao vice-governador – e virtual candidato da coligação ao Senado -, Otto Alencar (PSD), puxar o bloco governista do cortejo. “Ele (Wagner) teve uma fissura no tornozelo e o médico recomendou que ele não caminhasse todo o trajeto”, justificou o vice-governador.

Aproveitando a ausência do governador, o prefeito ACM Neto (DEM), liderando o bloco de oposição ao governo – acompanhado, entre outros, por Geddel (PMDB) e Paulo Souto (DEM) -, aproveitou para cumprimentar os fiéis. Animado, deixou o grupo várias vezes e driblou a segurança para distribuir abraços e apertos de mão aos potenciais eleitores.

Desta vez, porém, a oposição ao governo petista não conseguiu aproveitar a lavagem para firmar posição sobre se marchará unida em torno de um representante ou se lançará múltiplos candidatos na eleição. “A festa não é momento de escolher candidato”, disse o prefeito. “Aqui, está todo mundo mais motivado pela fé que pela política.”