ACIMA DO TETO

TCU encontra foco de 464 marajás no Senado

O Tribunal de Contas da União identificou a existência de nada menos que 464 servidores do Senado que mensalmente recebiam em agosto de 2009 vencimentos que ultrapassavam R$ 24.500,00. Pode parecer simplemente mais uma maracutaia dos homens públicos brasileiros, mas esta é proibida por lei. O teto salarial nas repartações públicas à época era justamente este valor, que era o salário fixado para um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

De acordo com a lei, ninguém poderia ganhar mais do que o teto. Mas na política brasileira, a lei é uma coisa, a prática é outra. O site Congresso em Foco foi atrás de mais esta distorção e conseguiu com exclusividade uma cópia da auditoria do TCU, e publica agora, nome por nome, quem integra essa elite do Senado, detentora dos supersalários. Basta entrar no site do Congresso em Foco e conferir.

O site entende que esta informação diz respeito a todos os brasileiros e por isso publicou a relação. E tem mais: o Congresso em Foco está respaldado por juristas, como o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcanti, e Fábio Konder Comparato. No entanto, a questão do que é ou não é interesse público, atualmente, acabou virando uma discussão apaixonada.

O certo é que na prática, apesar do teto salarial determinado pela Constituição, tem servidores no Senado e em toda a administração pública, no Legislativo, Executivo e Judiciário, que faturam muito mais que os ministros do STF. A auditoria do TCU de 2009 esta servindo de base para uma ação do Ministério Público que quer impedir essa prática tão brasileira.

A partir da ação, que tramita a 9ª Vara Federal de Brasília proibiu o pagamento. Senado e Câmara dos Deputados reagiram e entraram com recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região. E nesta novela que promete se arrastar por um bom tempo, duas decisções foram tomadas recentemente. O presidente do TRF, Olindo Menezes, autorizou o Senado a pagar acima do teto, passando por cima da Constituição.

No entanto, na sequência, a desembargadora Mônica Sifuentes proibiu a Câmara de fazer o mesmo. A polêmica tem rumo certo: vai parar no Supremo Tribunal Federal, onde, segundo apuração do jornal Folha de São Paulo, a tendência é de proibição dos pagamentos acima do teto. Aí o bicho vai pegar.

Os marajás de Brasília

De acordo com o site Congresso em Foco, o relatório de auditoria 629/09 do Tribunal de Contas da União (TCU), ao qual o site teve acesso, trabalhou sobre os salários pagos no Senado, e identificou 464 servidores que ganhavam além do teto constitucional. Outras auditorias investigaram os demais órgãos da administração pública. No Executivo, por exemplo, estimava a existência de mais de mil supersalários. Na Câmara, a auditoria não foi concluída.

No Executivo e no Senado, o prejuízo com o pagamento além do teto soma R$ 307 milhões por ano. No Senado, segundo o anexo 2 do documento, os salários que em 2009 excediam o teto iam de R$ 24.500,47 a até quase R$ 46 mil em um único mês.

O benefício além do teto não é exclusivo de funcionários. Os senadores, incluindo o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), também ganham mais que um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), como revelou o Congresso em Foco na quarta-feira (24). Na avaliação do relator da reforma administrativa do Senado, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), o número de servidores com supersalários hoje pode ser ainda bem maior – ele estima em mais de 700. Dos 464 nomes identificados em 2009 pelo TCU, 130 ingressaram no Senado trabalhando na gráfica e 110, no Centro de Processamento de Dados, o Prodasen.

Quase o dobro

O servidor com a maior remuneração, conforme o levantamento, é o consultor aposentado Osvaldo Maldonado Sanches. Ele continua trabalhando como consultor de orçamentos na Câmara. De acordo com o TCU, seu salário em 2009 era de R$ 22 mil no Senado e de R$ 23.800 na Câmara. Isoladamente, as remunerações não ultrapassaram o teto, mas juntas, chegaram a R$ 45.963,59, quase o dobro do que ganhava um ministro do STF na época.

Sanches escreveu ao Congresso em Foco um texto com seus esclarecimentos, no qual defende a aplicação do teto, mas para todos os agentes públicos, isto é, também para os políticos. Lembra ainda que a Constituição determina que exista “uma clara explicitação de como as normas serão aplicadas para todos e a partir de quando”. 

Média de R$ 26 mil

O grupo de 464 funcionários capitaneado por Sanches tinha salário médio de R$ 26.327. Entretanto, a metade deles, ou seja 232 servidores, ganhava um pouco menos que isso, entre R$ 24.500 e R$ 25.874.

A cúpula do Senado integra o grupo de servidores com supersalários. Constam da lista a secretária-geral da Mesa, Cláudia Lyra, e a diretora-geral da Casa, Dóris Marize Peixoto. Os antecessores delas também figuram na relação: a ex-secretária geral Sarah Abrahão e os ex-diretores Haroldo Tajra, Alexandre Gazineo e Manoel Vilela. O ex-diretor Agaciel Maia não está nessa lista, mas sim a sua mulher, Sânzia Maia.

Alexandre Gazineo recebeu em agosto de 2009 R$ 24.527,02, apenas R$ 27 a mais que o teto da época. Ele disse ao Congresso em Foco que hoje não recebe mais que um ministro do STF e que os valores foram recompostos aos cofres públicos. “Eu nem isso recebo mais”, afirmou Gazineo. “Isso foi estornado.” Em outras duas ocasiões, ele informou que estourou o limite em no máximo R$ 80, mas também foi feito o abate no salário. Como advogado do Senado, Gazineo preferiu não dar sua opinião particular a respeito da legalidade dos pagamentos feitos pela Casa em oposição aos argumentos do Ministério Público e à auditoria do TCU.

De acordo com o TCU, foram pagos R$ 848 mil indevidamente somente naquele mês de agosto de 2009, valor que corresponde a uma despesa pública anual de cerca de R$ 11 milhões. Como a auditoria detectou outras irregularidades na folha, como pagamento indevido de horas extras, os auditores do tribunal chegam à conclusão de que houve perda anual de R$ 157 milhões no Senado. Auditoria semelhante no Poder Executivo apurou prejuízo de R$ 150 milhões por ano. Na Câmara, os valores ainda são analisados pelo TCU.

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