Os quatro ministros que integram a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – Hamilton Carvalhido, Paulo Gallotti, Paulo Medina e Nilson Naves -, podem proferir nesta terça-feira (dia 15), a decisão sobre o habeas corpus impetrado por Tony Garcia, que paralisou, liminarmente, o julgamento da ação criminal contra três dirigentes do Consórcio Nacional Garibaldi, acusados de fraudes contra o Sistema Financeiro Nacional.
O ministro Paulo Gallotti, na qualidade de relator, já deu seu parecer contra a concessão da ordem. O ministro Paulo Medina está com vista ao processo e deve dar o seu voto na sessão de terça-feira, no que será acompanhado pelos outros dois ministros da turma. Com o habeas corpus negado no mérito, a vara criminal federal especializada de Curitiba poderá dar andamento à ação, ouvindo testemunhas de acusação e finalmente julgando Tony Garcia, Agostinho de Souza e Rui Libretti, denunciados como responsavéis por um rombo de mais de R$ 40 milhões.
O advogado de Tony Garcia, Roberto Bertholdo (que foi nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o Conselho de Administração da Itaipu Binacional), tentou evitar o julgamento do habeas corpus, ao pedir o sobrestamento da ação, sob o argumento de que havia ingressado, no próprio Superior Tribunal de Justiça, com um recurso especial na pretensão de provar, em sede de ação civil pública, que Tony “jamais controlou ou administrou o Consórcio Nacional Garibaldi”. O ministro Gallotti não acolheu o pedido e ofereceu seu parecer contra a concessão do habeas corpus.
Outras ações
A Justiça Federal vem julgando várias ações envolvendo o Consórcio Garibaldi, enquanto aguarda o pronunciamento do STJ. A 2.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, especializada em crimes de lavagem de dinheiro e contra o Sistema Financeiro Nacional, julgou, em janeiro e fevereiro últimos, onze ações penais contra ex-empregados ou pessoas ligadas aos dirigentes do Consórcio Garibaldi, condenando nove denunciados a penas de reclusão, substituídas por penas alternativas.
No início deste mês de junho, a mesma vara criminal federal recebeu nova denúncia do Ministério Público, desta vez contra Sérgio Amílcar de Aguiar Maia, que teria atuado como gestor do consórcio, como superintendente de todo o grupo empresarial capitaneado por Tony Garcia.
Três nomes, a mesma pessoa
Antônio Celso Garcia ou Tony Garcia ou Anthony Garibaldi. Três nomes, a mesma pessoa. Tony ele adotou ao retornar ao Brasil, depois de uma temporada nos Estados Unidos. Anthony Garibaldi era o nome que usava nos EUA. Ele e o irmão Marco Antônio resolveram trocar o Garcia por Garibaldi para fugir da discriminação contra mexicanos e seus descendentes, muito forte na Califórnia, em especial na região de Los Angeles, onde os dois foram tentar a vida, no início dos anos 80.
Marco, o irmão mais velho, deu-se bem: começou a namorar a viúva do cantor Elvis Presley, Priscilla, em 1986. Em 1.º de março de 1987, nasceu o filho de Marco com Priscilla. Foi registrado com o sobrenome que a mãe achava que era do companheiro: Navarone Anthony Garibaldi. Anthony em homenagem, provavelmente, ao tio Tony.
Voltando ao Brasil, Tony Garibaldi preferiu trocar São Paulo, sua terra natal, por Curitiba, Nos primeiros tempos, dividiu apartamento com um jornalista e começou a namorar uma das filhas do então governador Ney Braga, Nice Maria. Passou a viver com ela, nascendo um filho, que recebeu o nome do tio “americano”, Marco Antônio.
Valtec
Com a ajuda do sogro, conseguiu emprego numa agência de publicidade de Curitiba, onde atendia a conta do governo do Estado. Em seguida, ingressou na Valtec – Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários, tendo como sócio Newton Coutinho Filho. A Valtec quebrou em 1984 e o Banco Central tornou indisponíveis os bens dos dois sócios.
Tony Garcia acabou recebendo a pena de inabilitação permanente para o exercício de cargos de direção na administração ou gerência de instituições na área de fiscalização do BC. Ele recorreu e a punição acabou reduzida de permanente para oito anos. Suspensa a intervenção do Banco Central, os bens da Valtec foram comprados por Antônio Eduardo de Souza Albertini, que viria, mais tarde, a ser o comprador do prédio que serviu de sede do Consórcio Nacional Garibaldi.
Hoje, Albertini atua na Eldorado Importação e Exportação, dedicada a importar super-carros, como Porsche e Mercedes Benz 500. A empresa tem um mesmo conhecido endereço: Alameda Carlos de Carvalho, 1441.
Ex-deputado era controlador
Agostinho de Souza, Márcio Rodrigues Libretti, Roberto Ângelo de Siqueira, Dervail Gribaldo e Rui Rodrigues Libretti. Estes eram os sócios do Consórcio Nacional Garibaldi, empresa fundada em outubro de 1989, que faliu cinco anos depois, deixando centenas de consorciados lesados. Estes eram os nomes que constavam nos papéis da empresa.
Na verdade, conforme ação civil pública movida pelo Ministério Público, o verdadeiro controlador era o ex-deputado Tony Garcia. Os indícios são muitos – é um verdadeiro “conjunto de evidências”, aponta a ação. Tony Garcia aparece, por exemplo, como procurador de Márcio Rodrigues Libretti na 34.ª alteração contratual feita no consórcio.
A procuração em que Libretti outorga poderes de transferência a Garcia, no entanto, não tem data, o que caracteriza irregularidade. Seria, segundo o MP, um “contrato de gaveta”, prestes a ser utilizado a qualquer momento – como de fato foi, para transferir 90% das cotas supostamente pertencentes a Márcio Libretti para Dervail Gribaldo, tio de Tony Garcia e de Roberto Ângelo de Siqueira, assessor político de Garcia. Estranhamente, essa transferência é datada de 19 de julho de 1991 – exatamente um dia após a morte de Libretti.
“Corporação”
Outro indício de que Tony Garcia era sócio do consórcio são fotos em que aparece um quadro “Corporação Garibalddi”, com os nomes das seguintes empresas: Consórcio Nacional Garibalddi S/C Ltda., Modello Passagens e Turismo Ltda., Ipiranga Participações Ltda., Ramo Corretora de Seguros S/C Ltda., Distribell – Distribuidora de Eletrodomésticos Ltda., e TGR Incorporadora Imobiliária Ltda. Tony Garcia é sócio da Ramo Corretora e da Modello Turismo. Nas demais, os sócios são parentes dele em primeiro grau.
Tony Garcia tinha um bom motivo para não constar como sócio do Consórcio Garibaldi. Ele estava legalmente impedido de atuar administrativamente em empresas financeiras. Uma outra empresa da qual era sócio, a Valtec DTVM, tinha quebrado pouco antes da inauguração do consórcio.
Liquidação ocorreu em 1994
O Consórcio Garibaldi foi liquidado pelo Banco Central em outubro de 1994, por fraudes que atingiram R$ 40 milhões. Durante dois anos, a Procuradoria da República no Paraná analisou a documentação levantada por auditores do Banco Central, três inquéritos policiais, declarações de imposto de renda dos três indiciados, procedimento realizado pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) contra o consórcio, além de estatutos de oito empresas ligadas aos acusados, e acabou oferecendo denúncia contra os três diretores do consórcio, Tony Garcia, Agostinho de Souza e Rui Libretti, em 25 de outubro de 1996.
Os procuradores federais os enquadraram em diversos dispositivos da Lei 7.492, que trata do Sistema Financeiro Nacional, e do Código Penal Brasileiro, por desvios de recursos, abonos irregulares, quitações simuladas de parcelas de consórcios em prejuízo dos grupos, cobrança irregular de sobretaxa de administração de seguro e outras taxas, contabilidade paralela nas contas bancárias, informações falsas na contabilidade, troca de bem objeto, atuação como seguradora e reajuste irregular de saldo de caixa.
“Todos esses procedimentos fraudulentos, adotados pelos denunciados no decorrer de sua gestão à frente da Administradora de Consórcios Garibaldi, demonstram à sociedade que a empresa foi constituída e gerida no intuito único de desviar ilicitamente, em proveito próprio e de terceiros a eles ligados, o numerário auferido através da captação de recursos populares. Com prejuízos de vulto a um número significativo de consorciados fraudados”, destacou a denúncia do Ministério Público Federal.