Sistema eleitoral do Brasil em discussão

O Brasil deve mudar de sistema eleitoral e adotar outro mais representativo? Para responder esta pergunta especialistas se reuniram ontem em Curitiba no II Congresso da Rede de Participação Política, que prossegue hoje numa promoção da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep) e da Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Paraná (Faciap).

“Nosso propósito é formular uma proposta, endossada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), com vistas a promover uma mudança no sistema eleitoral brasileiro e melhorar a representatividade política, especialmente na Câmara dos Deputados”, afirmou o presidente da Fiep, Rodrigo da Rocha Loures, na abertura do evento.

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Dotti: “É necessária uma mudança na relação entre eleitores e candidatos”.

Rocha Loures disse que a Fiep é partidária do voto distrital, em que os eleitores votariam apenas em candidatos de sua região. “Mas dentro de uma proposta viável, que precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional, consideramos que o voto distrital misto é uma boa solução”, disse.

No sistema do voto distrital misto, metade das vagas é distribuída pela regra proporcional, idêntica à adotada atualmente. A outra metade, porém, é definida pela votação nos distritos, criando maior proximidade entre os eleitores e seus representantes.

Para o presidente da Faciap, Ardisson Naim Akel, o Brasil ainda vive uma democracia imperfeita. “As pessoas com mais dinheiro ou mais exposição na mídia têm mais espaço para se expressar na estrutura eleitoral brasileira”, afirmou.

“Precisamos de uma forma democrática mais autêntica, que possibilite ao cidadão a participação na vida política. Queremos uma reforma possível, baseada na ética e no respeito à sociedade”, disse.

Nos debates à tarde, especialistas consideraram que a adoção do voto distrital misto precisa superar obstáculos técnicos e políticos para ser realidade. Eles alertaram que qualquer alteração sofreria resistência dos deputados, já que mudaria a forma como serão eleitos e a distribuição de forças no sistema político brasileiro.

Além disso, existe a dificuldade de se estabelecerem os limites dos distritos para a implantação do novo modelo. “Os desafios são muitos”, disse o jurista René Dotti, presidente da Comissão nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Defesa da República e da Cidadania.

“Mas é necessária uma mudança na relação entre eleitores e candidatos. A eleição precisa ser vista como uma procuração para o candidato. O voto distrital misto é um caminho para essa mudança”, disse.

Para o cientista político David Fleischer, professor da Universidade de Brasília (UnB), a instituição do voto distrital misto seria um aprimoramento do modelo eleitoral brasileiro.

Nesse sistema, cada eleitor vota duas vezes para eleger os deputados. Um voto é para um candidato de sua região, e o segundo para o partido de sua preferência. “De certa forma, as eleições no Brasil já funcionam assim na prática, porque muitos deputados federais e estaduais têm bases de apoio concentradas em determinadas regiões”, explicou Fleischer.

Para ele, além de aproximar eleitores e representantes, o voto distrital misto fortaleceria os partidos e a necessidade de eles apresentarem projetos de longo prazo para o País.

O modelo atual adotado pelo Brasil é o proporcional, com lista aberta. Nele, as vagas no Legislativo são distribuídas aos candidatos mais votados dos partidos com o maior número de votos.

Entre os problemas desse sistema estão a eleição de pessoas com poucos votos e o distanciamento do eleitor, já que a escolha é pulverizada por um Estado inteiro.

“Esse sistema foi consolidado na Constituição de 1988 po,rque beneficiava o multipartidarismo”, disse Márcio Rabat, especializado em legislação eleitoral. A cientista política Rachel Meneguello, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), apesar de não descartar as vantagens do voto distrital misto, chamou a atenção para as dificuldades de implementação do projeto. “A engenharia institucional seria imensa para desenhar os distritos e a resistência dos deputados em aprovar a ideia seria grande”, afirmou.

Ela disse que seria mais fácil adotar o voto distrital misto em um universo menor, como nas eleições municipais, para testar o modelo. O cientista político Lúcio Rennó, da Universidade de Brasília (UnB), acha que a experiência internacional não traz indicações sobre como o formato das eleições influencia o comportamento dos políticos e a relação entre os poderes. “O Chile adota o voto distrital e mesmo assim seus parlamentares são tão mal avaliados quanto os brasileiros”, comentou.

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