Segundo turno adia votação do Código Florestal

A “onda verde” que alavancou a candidatura de Marina Silva (PV) e as negociações políticas para o segundo turno da eleição para presidente frearam a tramitação do projeto que altera o Código Florestal Brasileiro na Câmara dos Deputados. A pressão política e a guerra entre ambientalistas e ruralistas devem causar ainda substitutivos ao projeto relatado pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) na comissão especial criada para alterar a lei ambiental de 1965, bem como a uma série emendas à proposta.

Lideranças do PV já afirmaram, logo após o término do primeiro turno, que as alterações no Código Florestal, criticadas por ambientalistas, certamente entrarão na barganha política com Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) no segundo turno. Entre as principais críticas ambientalistas ao Código Florestal estão a anistia a agricultores que desmataram até 2009, a redução da distância mínima da área de preservação permanente (APPs) até a margem de rios e ainda a inclusão dessas APPs na soma para o cálculo da área mínima de reserva legal em propriedades rurais.

A possibilidade de novas alterações no projeto do novo Código Florestal serem incluídas na negociação de um cobiçado espólio de quase 20 milhões de votos de Marina Silva causa temor nos ruralistas.

Mônika Bergamaschi, diretora da Associação Brasileira de Agribusiness (Abag) dá como certa a barganha do apoio do PV e dos ambientalistas a qualquer um dos dois candidatos em troca dessas mudanças na proposta. “Acho que deverão (barganhar) e é aí que mora todo o perigo”, disse a executiva, uma das principais articuladoras da indústria e do setor ruralista para as alterações na lei ambiental. Sem poder fazer muita coisa ao menos até novembro, a principal entidade do agronegócio brasileiro estuda propostas de emendas ao próprio projeto que seguiu ao plenário.

Na Câmara, deputados davam como certa a vitória de Dilma no primeiro turno e firmaram um acordo de lideranças para que a proposta fosse votada já a partir desta semana, quando os trabalhos dos parlamentares teoricamente voltariam ao normal. Relator do projeto, o deputado reeleito Aldo Rebelo (PCdoB-SP) admitiu que o assunto está relegado a um segundo plano diante da batalha eleitoral entre Dilma e Serra. “Isso tudo fica para depois da eleição. Ninguém tem tempo nem cabeça para pensar em outra coisa”, comentou.

Já o deputado reeleito Moacir Micheletto (PMDB-PR), presidente da comissão especial que avaliou as alterações do Código Florestal, afirmou que o acordo entre as lideranças dos partidos vale também para que se votasse o tema logo após o segundo turno. Micheletto admite que a votação do projeto possa ser postergada para 2011 por pressão dos ambientalistas, mas adota um discurso no qual tenta mostrar força da bancada ruralista. “Pode até ser que o assunto não passe pelo plenário este ano, mas há o acordo e nós (favoráveis ao projeto de Rebelo) somos a maioria”, afirmou.

Para ele, ainda que a estratégia dos contrários à votação seja a de mover forças para adiá-la, os favoráveis ao documento não medirão esforços para encaminhar o projeto ao plenário logo após o segundo turno. Duarte Nogueira (PSDB-SP), outro deputado ruralista reeleito, lembra que as mudanças precisam, necessariamente, ser votadas até 11 de junho de 2011, prazo final dado pelo governo para que sejam aplicadas as punições previstas ao atual Código. “Se isso ocorrer e se não houver mudanças, 90% dos agricultores passarão a ser criminosos”, afirmou.

Reeleito como os colegas, mas com uma postura divergente, o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) disse ter ficado satisfeito com o atraso causado pela realização do segundo turno no embate sobre o Código Florestal. “Tomara que a necessidade do segundo turno atrapalhe o plano de votação, pois os ruralistas tinham enorme pressa para poderem ganhar suas bases na agricultura”, disse.

Posicionamento

Além da pressão da “onda verde” sobre o tema, na avaliação do parlamentar Dilma e Serra precisarão se posicionar de forma mais clara sobre as mudanças na lei. Segundo ele, diferentemente da defesa de parlamentares do PSDB, como Nogueira, Serra teria se comprometido a não levar a votação adiante. “Acredito que, para ganhar o apoio de Marina, Dilma fale tudo, até que é contra o novo Código”, ironizou.

Até mesmo o Ministério do Meio Ambiente (MMA) – contrário a alterações no Código desde os tempos em que Marina, ainda no PT, era ministra – deseja que o assunto seja levado para 2011, a tempo de amadurecer as discussões no Congresso. “Será precipitada se a votação for concluída em dois ou três meses, no final do governo”, analisou o diretor do Departamento de Floresta do MMA, João de Deus Medeiros.

A pasta já tem desenhada uma proposta substitutiva ao projeto de Rebelo. Segundo Medeiros, a proposta foi detalhada entre as várias secretarias do ministério e com a própria ministra Isabela Teixeira durante esta semana. “A ideia é disponibilizar o documento, que visa ao aprimoramento do Código, para a bancada do governo”, comentou.

O ponto central é a reserva legal. O documento de Rebelo mantém a necessidade de reservas, mas apenas para propriedades acima de quatro módulos fiscais. Isso significaria, segundo cálculos do ministério, abrir mão de uma área, passível de ser desmatada, de 43 milhões a 45 milhões de hectares em 96% dos estabelecimentos agrícolas. “É delicado retirar a responsabilidade de proteger o ambiente de uma parcela tão significativa de proprietários, é algo que entra em conflito com a sociedade”, disse Medeiros.

A anistia aos produtores é outro item central dessa questão para o ministério, que prefere apresentar alternativas para o processo de regularização ambiental. “Existe um passivo grande, pois a lei foi pouco observada nos últimos 40 anos”, comentou. A ideia, segundo o diretor, é abrir um canal para o proprietário que tenha interesse em regularizar suas terras de forma mais fácil. Entre as facilidades que o MMA quer oferecer estão linhas de financiamento, distribuição de sementes e mudas e até negociação de prazos.

O deputado Rebelo, no entanto, mostrou certo incômodo em relação à confecção da proposta de projeto substitutivo do Ministério do Meio Ambiente, além da intenção de levar à discussão para 2011. “Quando querem, rapidinho fazem decreto e Medida Provisória… São ligeirinhos”, criticou.

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