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Romero Britto, artista preferido dos políticos, está ‘triste’

É tanto tempo vivendo fora do País que o artista plástico Romero Britto tem sotaque até por escrito. “Nunca imaginava (sic) que os retratos que eu presenteei fossem um dia ser motivo de tristeza para mim. Eu nunca quis criar obras tristes. Sempre quis criar obras alegres”, escreveu, ao ser perguntado sobre um suposto arrependimento por ter pintado algum político – especialmente os quadros que estavam na casa do ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, em Mangaratiba, apreendidos na Operação Calicute, um desdobramento da Lava Jato, em novembro de 2016.

A Polícia Federal apreendeu três obras, retratos do governador e de sua mulher, Adriana Ancelmo (sorridentes com um coraçãozinho pintado no rosto) e um clássico abstrato e multicolorido do artista. A perícia apontou que, juntos, os quadros valem quase R$ 150 mil. Perto do que o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro já diz ter recuperado de propinas pagas ao ex-governador, cerca de R$ 270 milhões, os “Brittos” na parede de Cabral têm um valor quase simbólico.

Aliás, simbolismo é um artista, conhecido pela “utopia da alegria” e por sua total falta de compromisso com temas sociais, estar entre os preferidos da classe política. “Por ter nascido e crescido no Brasil, todos sempre imaginam o otimismo, o colorido e a alegria dos brasileiros na minha arte”, afirmou.

Britto já homenageou outros políticos. O quadro da ex-presidente cassada Dilma Rousseff, por exemplo, foi pintado em 2011 – e apresentado ao mundo em um anúncio pago pelo próprio artista nas páginas da revista dominical do The New York Times. Na imagem, o mesmo coração colorido no rosto. Em 2008, Britto também presenteou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com um quadro sobre os 450 anos da cidade de São Paulo.

A pintura voltou ao noticiário em 2016, quando Britto presenteou o prefeito de São Paulo João Doria com uma obra parecida – a diferença eram os números 450 espalhados pela tela. Doria, que não criou caso com a semelhança das obras, é, dentre os políticos brasileiros, aquele que parece ter mais identificação com o artista. O prefeito tem obras de Britto em sua casa (uma delas com a família inteira retratada) e em seu gabinete na Prefeitura.

Britto não faz distinção ideológica. Perguntado sobre o assunto, esquivou-se e escreveu “não ter entendido a pergunta”. Já quando questionado especificamente sobre Lula, o artista usa tintas mais fortes: “Como poderia admirar a situação que a administração do presidente Lula e seu partido deixou o Brasil…” E suaviza: “Mas tudo que se passou no Brasil não é só do partido do Lula, mas também de outros partidos”.

Na lista de políticos que ainda não entristeceram o pintor estão personalidades americanas. “O ex-senador Teddy Kennedy, por exemplo, prometeu me fazer um omelete. Fui para um café da manhã na residência de amigos e ele preparou um omelete para mim. Foi uma grande honra.” Britto também cita a família Obama e os Bush como políticos que acredita.

E no Brasil? “Acho que o João Doria será a salvação para este momento tão complicado brasileiro. Acho isso por ele não ter uma história na política suja brasileira, que está quase que todos os dias nos jornais, um escândalo atrás do outro…”, escreveu. “Acho que ele poderá trazer esperança e credibilidade para o Brasil – e em particular para a economia e aos investidores nacionais e internacionais que estão com muito cuidado com tanta instabilidade. Acho que o João Doria é muito preparado para representar o Brasil.”

Romero Britto será homenageado pela Casa da Moeda do Brasil com o lançamento de uma medalha comemorativa. Serão 10 mil medalhas – 8 mil em bronze, 600 em prata e 1.400 em bronze dourado. Os preços vão variar entre R$ 70 e R$ 245. A data do lançamento depende da agenda do artista e de uma vinda dele ao Brasil.

Visitas rápidas e pontuais não são problema para o artista. Isso não significa que voltar a morar no País esteja em seus planos. “Já moro nos Estados Unidos há mais de 30 anos. Tenho saudade e adoro o Brasil, mas viver no Brasil como artista é difícil, especialmente pelo fato que o mercado de arte quase não existe – e em particular o de pop arte. No Brasil, poucos apoiam e valorizam as artes.”

Britto começou sua carreira vendendo quadros nas ruas do Recife. Aos 23 anos, foi tentar a sorte nos Estados Unidos. Antes de vender seu primeiro quadro, trabalhou como lavador de carros e entregador de pizza. Suas obras começaram a ser expostas em uma pequena galeria – onde sua primeira venda teria sido forjada. O artista deu US$ 300 nas mãos da namorada para que ela comprasse um quadro dele e impressionasse o dono da galeria.

A sorte mudou em 1989, quando o presidente da marca de vodca Absolut conheceu seu trabalho e montou uma campanha publicitária com as cores do artista brasileiro. A marca já tinha trabalhado com artistas como Andy Warhol e Roy Linchenstein. O mercado publicitário abraçou então o brasileiro.

A arte de Britto parecia estar conectada com o que Miami gostaria de vender como imagem. Não demorou para que o artista se tornasse um ícone oficial da cidade. Assim, as celebridades e políticos não demoraram a grudar sua imagem na dele. Em sua terra natal, ele conseguiu passar a imagem do brasileiro vencedor e de otimismo.

Nos últimos anos, principalmente por meio das redes sociais, o artista tem sido contestado e seu trabalho considerado “menor” ou “cafona”. Britto nunca se deixou abalar e responde esse tipo de crítica comparando-se ao pintor espanhol Picasso.

Políticos das mais diversas cores e partidos viram na arte de Britto algo positivo (e inofensivo) para suas próprias imagens. Por outro lado, o artista não cobra os retratos que faz dos políticos e sempre os retrata como figuras sorridentes e confiáveis – reflexo, talvez, dos muitos anos longe do País. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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