O senador Renan Calheiros (PMDB/AL) pediu absolvição sumária da acusação de integrar o “quadrilhão” do seu partido no Senado. Em defesa preliminar de 100 páginas entregue ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, o advogado do peemedebista fustiga a acusação do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot que atribuiu a Renan e a outros caciques do partido – Romero Jucá, José Sarney, Edison Lobão, Jáder Barbalho e Waldir Raupp – o papel de líderes de organização criminosa que se teria instalado no Senado para recebimento de propinas milionárias.
Luís Henrique Machado, o defensor de Renan, alerta para o que classificou de “consequências desastrosas” da experiência italiana da Operação Mani Pulite, que inspirou a Lava Jato.
Não é necessário dizer que rotular partidos políticos, bem como os membros que integram a sua cúpula, de organização criminosa é um ato gravíssimo, podendo gerar sequelas indeléveis à jovem democracia brasileira. Sabendo disso, importante relembrarmos a experiência italiana, resultante da Operação Mani Pulite, e as consequências desastrosas para o País, fruto da tirania das “boas intenções” de alguns agentes do estado”, destacou Machado.
O advogado pede a absolvição sumária de Renan “tendo em vista que os supostos atos ilícitos narrados na denúncia padecem de tipicidade objetiva e subjetiva, não configurando os delitos de organização, associação ou quadrilha”.
Subsidiariamente, Machado pede a rejeição da acusação de Janot.
“O que se vê na denúncia é uma narração, cansativa e deformada, de fatos políticos, na sua grande parte públicos e notórios. Nesse giro, o ex-procurador-geral tenta atrelar o requisito da permanência ao mandato parlamentar ou a influência política, forçando, assim, a existência de uma pseudoestabilidade do grupo denunciado”, segue Machado.
Na denúncia do “quadrilhão”, Janot sustenta que Renan e os outros senadores faziam parte do “núcleo político da organização criminosa, vinculados ao PMDB, com objetivo de arrecadar vantagem indevida dos cofres da administração pública federal e do Senado Federal, a partir dos contratos firmados com empresas que tinham interesse em negócios no âmbito do Governo Federal”.
Janot acusa que no âmbito da Petrobrás, Renan agiu especialmente nas Diretorias de Abastecimento e Internacional, focos de corrupção na estatal petrolífera no período entre 2004 e 2014.
Um episódio apontado pelo ex-procurador-geral envolve Paulo Roberto Costa, então diretor de Abastecimento da Petrobrás. Renan teria dado apoio à permanência de Costa no posto “em troca de recebimento de propina de R$ 800 mil”, via deputado federal Aníbal Gomes (PMDB/CE), aliado do ex-presidente do Senado.
Entre 2006 e 2007, aponta Janot, os senadores Renan e Jader e o ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT/MS), “solicitaram e receberam de Nestor Cerveró, à época diretor da área Internacional da Petrobrás, US$ 6 milhões, por este ter facilitado a contratação da empresa Samsung para a construção do navio-sonda 10.000”.
O ex-procurador-geral incluiu no pacote de crimes do “quadrilhão” um suposto “apoio político a Sérgio Machado na presidência da Transpetro, com o fim de arrecadar o maior volume possível de recursos ilícitos das empresas contratadas pela sociedade de economia mista, tanto para as campanhas eleitorais, quanto para outras finalidades”.
A denúncia de Janot cita, ainda, a delação premiada de Cláudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, que afirmou ter pago aproximadamente R$ 22 milhões em propinas a integrantes do PMDB do Senado, “sendo R$ 20 milhões destinados à Renan Calheiros e Romero Jucá”.
O criminalista Luís Henrique Machado, constituído por Renan, fulmina ponto a ponto as acusações do algoz do senador. “É de se reconhecer a forma perigosa como a denúncia expõe os fatos ao dizer que se formou uma organização criminosa no âmbito do PMDB do Senado. Construir ilações de que o senador recebeu doação eleitoral ilícita em troca de conceder apoio político a diretor da Petrobrás, ou acusar que um determinado parlamentar agia em seu nome sem qualquer base empírica, só se pode chegar à conclusão pela forma irresponsável que se buscou expor, indevidamente, o senador Renan Calheiros.”
Adiante, Machado assinala. “Necessário, portanto, atentar-se sobre essa nova forma de denúncia que confunde fatos públicos e acontecimentos políticos notórios com uma suposta affectio de uma organização criminosa. Não é difícil reparar que a denúncia força esta hipótese a todo momento.”
O advogado observa que “fatos do cotidiano político, como almoços e jantares, sendo que alguns deles sequer contou com a participação do denunciado (Renan), são eventos tidos como criminosos para o Ministério Público”.
Luís Henrique Machado sugere que Janot agiu movido “por nítido propósito político de macular a imagem e denegrir a reputação dos senadores denunciados, mormente levando em consideração a proximidade das eleições”.
“É insensato o que fez o ex-procurador-geral da República ao rotular e, consequentemente equiparar o PMDB do Senado a uma organização criminosa, tal como se faz com a máfia, facções, milícias e grupos de extermínio”, adverte o advogado. “Portanto, parece não restar dúvidas que a denúncia oferecida, por constituição de organização criminosa, no apagar das luzes do mandato do ex-procurador-geral, tem um nítido propósito político.”
O advogado não poupa Janot. “A denúncia não se desincumbiu em demonstrar de forma concreta a permanência e a estabilidade da pretensa organização, nem antes e muito menos depois que a Lei 12.850/2013 entrou em vigor. Na verdade, para fins de permanência e estabilidade, a denúncia narra eventuais fatos episódicos, distanciados temporalmente entre um ato e outro, sem nem sequer descrever ou provar minimamente qualquer animus associativo entre os denunciados, vinculando o conceito em análise tão-somente ao tempo de mandato dos parlamentares.”
Na avaliação de Machado, “este ponto é fundamental, porque resta claro que a exordial busca a todo momento a criminalização partidária ao acusar que “ante a forte atuação parlamentar e responsabilidade por outras indicações políticas, as quais ainda perduram os denunciados continuam praticando delitos até os dias de hoje”.”
“Imbuído de um espírito estranho de assepsia da classe política, o ex-procurador-geral não utiliza qualquer critério sério e idôneo para atestar uma possível estabilidade da suposta organização formada”, ataca o advogado de Renan.
“Evidentemente, a denúncia confunde os conceitos de societas delinquentium e societas in crimine, nem sequer se esforçando para realizar qualquer diferenciação”, seguiu o advogado. “Isto é, para o ex-procurador-geral, Rodrigo Janot, enquanto perdurar o mandato parlamentar, ou a influência política, restará configurado o requisito da permanência e estabilidade, mesmo sem fazer qualquer prova concreta sobre os ilícitos enunciados na exordial.”