Quinze anos depois de fracassar na tentativa de acabar com o nepotismo na Câmara dos Deputados, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Nelson Jobim, conseguiu uma vitória no Poder Judiciário e, por tabela, poderá influir na decisão dos outros poderes de proibir a contratação de parentes. No embalo do Judiciário, que pôs fim ao nepotismo nos tribunais de todo o País, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), pretende colocar em votação em março a proposta de emenda constitucional que proíbe a contratação de parentes no Legislativo e no Executivo.
Em 1991, a Câmara arquivou um projeto do então deputado Jobim e do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), que acabava com o nepotismo e mandava demitir os parentes empregados na Casa no prazo de 30 dias. Há 15 anos, o então professor de direito da USP e hoje ministro do Supremo, Eros Grau, saiu em socorro de Jobim e também ajudou na defesa do projeto elaborando um parecer considerando constitucional a proposta que foi feita pelos dois deputados por meio de um projeto de resolução.
"Fomos atacados duramente. Os deputados faziam piadas para desqualificar a discussão", afirmou Miro, lembrando que a resistência chegou a ser agressiva. Na época, Miro, coordenava uma comissão especial, criada pelo então presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, para propor mudanças no regimento interno e Jobim era o relator. "Nós atiramos em uma moita achando que iam sair dali coelhinhos, mas saíram dinossauros e jacarés. O que veio de crítica foi impressionante!", recordou Miro, afirmando que as reações também partiam de funcionários da estrutura da Casa e não apenas dos gabinetes.
Dois meses depois de apresentado, o projeto foi considerado inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, sob o argumento de que era uma discriminação com os parentes e uma afronta à igualdade de direitos. "Subsistirá (com o projeto) o grande equívoco de romper-se, na Casa das leis, a própria Lei Maior, em nome de uma pretensa moralização, que não se ampara na moral, porque fere direitos fundamentais", argumentou, na época, o relator na CCJ, deputado Jurandyr Paixão, para rejeitar o projeto.
Para contestar a maioria da CCJ, Jobim lançou mão de uma consulta a Eros Grau. O então professor de direito, além de considerar constitucional o projeto de resolução, argumentou que ele atendia "a verdadeira imposição do princípio de moralidade" consagrado na Constituição. O então líder do PT, deputado José Genoino (SP), contra a decisão da CCJ, ainda tentou um recurso ao plenário da Casa, que, no entanto, acabou arquivando a proposta.
Depois desses 15 anos, Miro acredita que a proposta que aguarda votação pelo plenário da Câmara poderá ser aprovada. "Houve um amadurecimento", afirmou. A proposta de emenda constitucional, que tramita na Casa desde 1996 já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e pela comissão especial. Rebelo disse ontem que pretende levar ao plenário no mês de março a proposta de emenda constitucional (PEC) que proíbe o emprego de parentes no Legislativo, no Executivo e no Judiciário. Aldo lembrou que já conseguiu o acordo da maioria dos líderes partidários para levar a matéria a votação e que, por isso, não deve haver grandes pressões contra a matéria. "Eu creio que a Câmara, ao aprovar a proposta na CCJ e na própria comissão especial, já traz a matéria com a autoridade destes dois órgãos da Casa. Não creio que vá encontrar dificuldade porque todos os líderes consultados concordaram com a votação da matéria", afirmou.
Aldo não tem idéia de quantas pessoas seriam atingidas por uma possível aprovação da PEC 334, que "proíbe a nomeação ou designação para cargos em comissão e função comissionada de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau". "Eu não tenho um balanço, mas acho que a própria proposta de emenda constitucional deve estabelecer todos os parâmetros para os três poderes ", afirmou.
Anteontem, logo depois da sessão do STF que confirmou a constitucionalidade da resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que proíbe o emprego de parentes de magistrados no Judiciário, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que já se reunira com Aldo recentemente para pedir a votação da PEC, voltou a cobrar a votação da matéria, para estender a proibição do emprego de parentes em cargos de confiança a todos os poderes. A PEC tramita na Câmara há dez anos.
AMB sugere ampliar para todos os poderes
Brasília – A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) vai fazer uma representação ao Ministério Público da União e ao Ministério Público dos Estados pedindo que a proibição de contratar parentes no Judiciário, prática chamada de nepotismo, se estenda também aos poderes Legislativo e Executivo.
A afirmação foi feita pelo presidente da entidade, Rodrigo Collaço. A medida foi editada em novembro do ano passado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão cuja função é a de editar normas e recomendações que garantam a autonomia do Judiciário. O prazo para que se efetivassem as demissões de parentes nessas condições terminou na terça-feira, mas vários tribunais nos estados aguardavam a decisão do STF. ?Foi uma vitória do Judiciário, o primeiro a por fim no nepotismo. Ficamos hoje com credibilidade e legitimados para cobrar o fim do nepotismo também nos outros poderes?, afirmou Collaço. Ele disse que a representação será enviada ao Ministério Público até o Carnaval.
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Nelson Jobim, defendeu ontem a aprovação, pelo Congresso, de uma emenda constitucional proibindo o nepotismo nos três Poderes. ?É saudável. Porque afastaria o patrimonialismo típico que nós temos não só no sistema judiciário, como também em alguns setores do Executivo e no próprio Legislativo?, disse.
Segundo Jobim, a decisão tomada anteontem, por 9 votos a 1, pelo plenário do STF, de determinar a demissão dos parentes de juízes de todo o País, fortalece o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que é presidido por ele e tem a função de exercer o controle externo do Poder. ?Ela (a determinação) foi, realmente, histórica para o conselho. Foi histórica inclusive para a Nação?, disse.