Dez anos de poder levaram à existência de dois PTs: o “eleitoreiro, parlamentar, o PT dos dirigentes”, e o partido da “base, igualzinho ao que era em 1980”, contrário às alianças política, mas ciente que, para ganhar, “tem que fazer acordos políticos”. A análise é do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criador da legenda que nasceu num colégio católico, em bairro nobre paulistano, e agora “precisa voltar a acreditar em valores (…) que foram banalizados por conta da disputa eleitoral”, mas sem ser “sectário como no começo”.
As declarações do “principal protagonista” do PT fazem parte do livro 10 Anos de Governos Pós-Neoliberais no Brasil: Lula e Dilma, coletânea de 23 artigos organizada pelo sociólogo Emir Sader que será lançada no dia 13, em seminário no Centro Cultural São Paulo com participação da filósofa Marilena Chauí e do economista Marcio Pochmann, além do próprio Lula. Assinam os textos o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, o assessor especial da Presidência Marco Aurélio Garcia, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo e o físico Luiz Pinguelli Rosa, entre outros.
O livro também traz uma entrevista inédita do ex-presidente, concedida em 14 de fevereiro. Estão lá não só frases de elogios aos mandatos petistas – como “outros países não conseguiram, em 30 anos, fazer o que nós conseguimos fazer em dez anos” -, mas também uma análise de Lula do quanto a chegada ao poder mudou o PT, e o que o partido deve fazer a respeito.
Nas 20 páginas da entrevista, só o próprio Lula menciona a palavra mensalão e cita “problemas com os companheiros” que tiveram de deixar o governo. Tanto os entrevistadores – Sader e o diretor da Faculdade de Ciências Sociais da América Latina (Flacso), Pablo Gentili – quanto o ex-presidente veem atuação política em setores da mídia brasileira.
Em meio à defesa de ações de sua gestão, como a criação de universidades federais, o aumento do salário mínimo e a “revolução na política externa” do País, o ex-presidente reconhece “tropeços” e “medidas erradas”, como o programa do primeiro emprego. “Concluímos que essas coisas fictícias não funcionam. Pode ficar muito bom no discurso, mas o patrão só vai contratar um trabalhador se precisar dele. Nem o Estado contrata se não precisa”, diz.
Carta de 2002. Ao lembrar a campanha de 2002 e a escolha do empresário José Alencar como vice, Lula afirma ter sido contra a Carta ao Povo Brasileiro – documento no qual se comprometia a manter contratos e a controlar a inflação e os gastos públicos -, mas admite sua importância para a vitória. “Eu era radicalmente contra a carta porque ela dizia coisas que eu não queria falar, mas hoje eu reconheço que ela foi extremamente importante.”
Lula diz ter provado “que era plenamente possível crescer distribuindo renda” – o que seria, na linha mestra que conduz a coletânea, o principal contraponto aos oito anos de PSDB no poder. Procurada, a direção do PSDB não quis comentar a definição de governo neoliberal dada pelo livro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.