O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aproveitou a posse do procurador Ricardo Tadeu Marques da Fonseca como desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 9.ª Região (PR) para fazer um discurso contra o preconceito.
Lula, que esteve em Curitiba, ontem, para prestigiar a posse do primeiro magistrado cego do País, lembrou que também foi vítima de preconceito, mas destacou que o Brasil é exemplo de luta contra a discriminação.
“Talvez a minha deficiência seja de origem diferente da do desembargador Ricardo Tadeu, a minha é a deficiência intelectual. Mas como o Paraná dá exemplo ao empossar o primeiro juiz cego, o Brasil também deu exemplo ao eleger o primeiro presidente da República sem diploma universitário”, declarou.
Lula comparou sua trajetória à do novo desembargador, que há 10 anos foi reprovado no concurso para juiz no TRT de São Paulo por conta da deficiência. “Foi reprovado porque entenderam que ele não poderia ler e nem identificar as expressões dos réus e testemunhas, mas esqueceram que ele compreende a variação vocal de um depoimento com muito mais facilidade que os que enxergam. Afinal, não é preciso ter a visão perfeita para se enxergar a verdade e a justiça”, declarou.
Lula lembrou que o Brasil incorporou o tratado da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre inclusão de pessoas com deficiência como texto constitucional. “Criamos uma agenda social de inclusão, para essa parcela de 14,5% da população brasileira. E uma das principais preocupações é com o acesso dessas pessoas ao mercado de trabalho”, disse.
Lula, que alegou nunca participar de posses de desembargadores fora de Brasília, comentou que fez isso pela primeira vez “pelo simbolismo da conquista, pela mensagem que o TRT do Paraná está dando de que não existe espaço para preconceito”.
Ele comparou a nomeação de Ricardo Tadeu com a indicação de Joaquim Barbosa como o primeiro ministro negro do Supremo Tribunal Federal (STF). “Mas o preconceito segue muito forte e aparece no anonimato do cotidiano, de forma sutil. Quem tem preconceito talvez não saiba que ele sim é o portador de uma doença”, afirmou.
“Vejam, no início de mandato, o presidente (Barack) Obama recebe quatro vezes mais ameaças de morte que o (George W.) Bush recebia. Por que? Por puro preconceito, porque é negro. No país mais rico do mundo (os Estados Unidos), o preconceito ainda está nesta proporção, imagina no Brasil”.
O desembargador Ricardo Tadeu, que foi indicado por Lula a partir de uma lista tríplice enviada pelo TRT, agradeceu a confiança do presidente “que não se ateve a minha limitação e sim a minha capacidade”.
O novo desembargador classificou o momento como um júbilo. “A aceitação de um cidadão cego como desembargador deste tribunal representa um fato histórico. Representa que a sociedade brasileira está um pouco menos deficiente”, declarou.
Lula, que desembarcou no final da tarde em Curitiba e antes da posse no TRT participou do lançamento de uma medalha em comemoração ao centenário do Coritiba Football Club, não falou com a imprensa em nenhum momento de sua visita à capital paranaense.
O senador Osmar Dias (PDT), que viajou com o presidente, disse que ele não conversou com ninguém sobre política. “Falou de questões do Paraná, de economia, de agricultura. Sugeri a indicação do Fachin (jurista paranaense Luiz Edson Fachin) para a vaga no Supremo Tribunal Federal”, disse.