Disputa presidencial

Plínio de Arruda Sampaio se lança candidato

Um dos ícones da esquerda brasileira, o promotor de Justiça aposentado Plínio de Arruda Sampaio aceitou o desafio de disputar a presidência da República pelo PSOL e avisa em entrevista a O Estado: “Eu estou na jogada”.

Fundador e velho militante que se afastou do PT, um dos idealizadores do programa de governo de Lula, o especialista em reforma agrária classificou seu ex-partido como da “direita envergonhada”, avaliou os oito anos de
governo Lula como um desastre e disse não ver diferenças ideológicas entre os três principais pré-candidatos: Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV).

O Estado – O que motiva o senhor, aos 79 anos de idade, a aceitar ser pré-candidato à presidência?

Plínio de Arruda Sampaio – Para evitar que esse processo eleitoral seja mais uma farsa sobre o povo brasileiro. Para evitar que eles fixem na mente do povo três coisas: que está bem, que vai melhorar e que não tem alternativa para o capitalismo.

Porque, entre Serra, Dilma e Marina, não há diferença de substância na política, é o discurso de um lado só. Têm evidentemente diferenças, não são os mesmos estilos, as mesmas ênfases, porém, é a mesma política pública.

Os três são neoliberais, acham que o capitalismo resolve tudo e discutem só se a questão é melhorar um pouquinho para cá ou um pouquinho para lá. Então nós vamos mostrar que, primeiro, há um aspecto de melhoria nesse cenário, que é o fato de pessoas pobres estarem começando a consumir como pessoas de classe média.

As casas Bahia estão vendendo como nunca. Mas enquanto o cidadão consegue comprar bens de prestígio, o filho dele está estudando em uma escola horrorosa. Se ele tiver que passar por uma consulta médica vai ter que esperar seis meses.

OE – Qual sua avaliação do governo Lula?

PAS – Os oito anos de Lula são trágicos, porque ele desmobilizou a massa, desarticulou o movimento social, ele cooptou o movimento social e dividiu. Todos eles estão cindidos entre a necessidade de serem fiéis às origens deles e os compromissos assumidos nessa cooptação que o Lula fez.

De modo que eu considero um governo nefasto. Um governo capaz de administrar essa economia, o que ele fez direitinho, mas isso é mérito dos economistas.

OE – E os programas sociais?

PAS – Iguaizinhos aos que a dona Ruth Cardoso concebeu no governo Fernando Henrique. Dona Ruth bolou, com base num velho estudo neoliberal, o seguinte: assistência social é focalizada. Se esse aqui tem chance de ir para frente, então vamos dar um tipo de assistência a ele.

Para o que não tem perspectiva, dá um negocinho qualquer para ele não feder muito, não prejudicar a cidade. A política do Lula é a mesma, com a diferença que ele colocou mais dinheiro. Ele é esperto e colocou mais dinheiro, mas isso é um saco sem fundo.

Essa Bolsa Família, por exemplo, o que ela está gerando? Alimenta? Não, esconde a fome, porque com R$ 100,00 nenhuma família se alimenta, pode comer uma farinha, um macarrão qualquer, mas dizer que se alimenta? A assistência social não mudou o estilo, melhorou a quantidade e o valor, o que é um benefício.

Eu faria completamente diferente. Num primeiro momento, quem estiver passando fome vai precisar de um auxílio, mas, em no máximo seis meses, ele tem que estar na terra e, chegou na terra, o Banco do Brasil vai custear. Quando ele produzir, ele paga o banco. Mas aí é outro mundo, ele é um homem produtivo e não um dependente da bolsa, que tem que ser uma coisa rápida.

OE – Como o senhor avalia a forma como o País enfrentou a crise?

PAS – Por que os capitais estão investindo no Brasil, neste momento? Porque não têm condições de investir no primeiro ,mundo. Então estão vindo para cá, porque pagamos os maiores juros do mundo.

A hora que houver qualquer mudança nesse movimento, este castelo de cartas desmorona. O capitalismo não tem condições de resolver nenhum problema atual da sociedade.

O capitalismo já resolveu muita coisa, multiplicou a produção de maneira extraordinária, mas, agora é parasitário. Não soluciona o problema da imigração, não resolve o problema ecológico, veja o fracasso de Copenhague.

Não resolve o problema das patentes (e aí é ótimo) porque, agora, a dinâmica da produção não é mais o bem material, é o conhecimento. O capitalismo está se metendo numa crise sistêmica e essa crise sistêmica vai provocar crises conjunturais, uma delas está acontecendo agora.

Pela característica dessa crise, alguns capitais fugiram para o Brasil, num primeiro momento, e, por isso, não sentimos tanto e o Lula chamou de marolinha. Se mudar um milímetro lá fora, aqui chega um tremendo tsunami.

OE – E qual a sua proposta macro-econômica?

PAS – Primeiro ponto: Reforma Agrária, mas uma reforma para valer, não esse programinha de assentamento do Lula. Quem coordenou o plano de assentamento do Lula fui eu.

Fizemos uma meta bem modesta: um milhão de famílias em quatro anos. Mas não pôde porque ia de encontro ao superávit primário, um nome novo que deram para corte no orçamento, determinado pelo FMI. Então, cortou pela metade. E não fez nem a metade. Fez menos assentamentos que o Fernando Henrique, o que é uma vergonha.

O ponto inicial da nossa proposta (por enquanto ela é apenas minha, mas estou fazendo aliciamentos terríveis para que seja de todo o partido) é que toda fazenda de mais de 500 hectares poderá ser desapropriada para efeito de assentamento.

Independente de ser produtiva ou não. A ideia é colocar as 6 milhões de famílias pobres sem terra na terra, em 4 anos. Esse é o primeiro lema. E é uma política econômica fortíssima porque isso vai exigir uma remodelação toda do orçamento e exigirá a suspensão do pagamento da dívida pública e o alongamento dessa dívida. Suspende inicialmente e estuda um alongamento.

Então essa é a base da política econômica. Com esse dinheiro, R$ 34 bilhões por ano, vai se financiar a reforma agrária. E financiando a reforma agrária você cria um mercado interno e um estimulo para o desenvolvimento da industria, dos serviços.

É por ai que nós vamos sair da crise. É completamente diferente da receita do José Serra, da receita da Dilma, e eu não sei se a Marina tem receita, mas se tiver é por aí também.

OE – E para a área social?

PAS – O binômio básico é reforma agrária e educação. A idéia que eu vou defender, e ela é polêmica, não sei se vou ganhar dentro do partido, é a seguinte: na educação, três coisas precisam ser defendidas: a igualdade na educação, a liberdade e a qualidade.

É preciso combinar essas três coisas e, para isso, a educação precisa sair do comércio. Ou seja, ninguém poderá investir em educação. Enquanto houver isso, gente vendendo educação, o menino rico vai prevalecer sobre o pobre.

E o menino rico vai se encaminhar para uma carreira rentável, agradável e desafiadora, enquanto o menino pobre vai pegar a carreira rotineira, mal paga, perigosa. Porque na escolinha, com 10 anos, cada um já tem o seu destino, então, não está correto.

O terceiro ponto é socializar a medicina, porque acho terrível o sujeito ter um milhão de dólares e poder investir num loteamento, explorar casas noturnas, que dá dinheiro, ou, já que está dando câncer adoidado, investir no câncer, que é retorno garantido e um lucro danado.

O capitalismo é assim. E eu pergunto. Alguém pode ficar rico com o câncer do outro? Esses são os pontos mais importantes, depois a moradia, acabando com a especulação imobiliária, e a segurança pública.

OE – Quem, o senhor apoiaria em um eventual segundo turno entre Dilma e Serra?

PAS – Não vai ter esse segundo turno, porque eu estou na jogada. Mas respondendo sério, o segundo turno é uma nova eleição. No curso da campanha, a correlação de forças que está hoje, muda, de modo que para o segundo turno teríamos que fazer uma nova análise.

Hoje seria inadmissível o apoio a qualquer dos dois. Hoje, o voto do PSOL, acredito, seria nulo. No segundo turno real, a gente vai ver. Por isso é importante termos vários candidatos, porque, no primeiro turno, você vota com sua consciência e, no segundo, faz a acomodação, do mal menor. Senão, nós votaríamos sempre no mal menor.

OE – O senhor acredita que o projeto Ficha Limpa contribuirá para a moralização da política brasileira?

PAS – Ainda não examinei o texto final. A informação que recebi foi que já fizeram uma brasileirada, uma voltinha para escapar da lei. Ainda vou analisar isso.

Eu acho o Ficha Limpa razoável, se garantir a inelegibilidade de quem for condenado na primeira instância. Porque se você foi denunciado, um promotor já examinou, teu advogado já te defendeu e um juiz te condenou, você, primeiro, tem que cuidar da tua vida, para depois querer cuidar do país.

Mas agora, parece que querem a última instância só. Isso quer dizer o que? Que o Maluf vai poder disputar todas as eleições, pois nenhum processo dele chegou à última instância.

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