O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) se dividiu nesta quarta-feira, 9, sobre a possibilidade de o governo federal rever e até mesmo anular anistias que haviam sido concedidas a cerca de 2,6 mil ex-cabos da Aeronáutica. De acordo com a Advocacia-Geral da União (AGU), o custo mensal aos cofres públicos com o pagamento da indenização nesses casos é de R$ 31 milhões.
O impacto financeiro projetado para os próximos dez anos, com o pagamento de reparações retroativas considerando juros e correção monetária, pode chegar a R$ 43 bilhões, segundo estimativas do governo. A AGU alega que as anistias concedidas a ex-cabos da Aeronáutica foram fundamentadas apenas em uma portaria de 1964, sem que fossem verificados, na análise de cada caso, os requisitos previstos na lei que instituiu o Regime do Anistiado Político, como a comprovação de perseguição política.
A portaria do Ministério da Aeronáutica, editada em 1964, tratava sobre o tempo de carreira dos cabos. Devido à quantidade excessiva de cabos que integravam a Força Aérea Brasileira na época, o governo editou uma portaria que limitava para oito anos o prazo máximo de permanência deles na FAB. Para a AGU, o ato apenas reorganizava administrativamente o quadro efetivo da FAB, sem caracterizar perseguição política.
“Reconheço o poder-dever da administração pública revisitar seus atos, em procedimento administrativo, com a observância do devido processo legal, como uma manifestação do obrigação de velar pela supremacia constitucional. A revisão das anistias no caso em exame se refere, exclusivamente, àquelas concedidas aos Cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria nº 1.104, editada pelo Ministro de Estado da Aeronáutica, em 12 de outubro de 1964”, frisou o relator da ação, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli.
“No exercício do seu poder de autotutela, poderá a administração pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria nº 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal”, acrescentou o presidente do STF.
Até agora, outros três ministros já acompanharam o entendimento de Toffoli de que o governo pode rever a anistia no caso dos ex-cabos: Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski. Em sentido contrário se posicionaram Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia.
Faltam votar os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e o decano do STF, ministro Celso de Mello.
Análise
Se o Supremo permitir a revisão da anistia aos ex-cabos da Aeronáutica, o entendimento da Corte não derruba automaticamente a indenização concedida aos ex-cabos da Aeronáutica – e sim permitiria que os processos fossem reanalisados caso a caso pela Comissão de Anistia. A palavra final se os pagamentos devem ser mantidos ou não será da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves.
“Aqui não é uma opção de ser politicamente correto, mas de ser correto. Dinheiro que sai da União para pagar qualquer benefício indevido é dinheiro que não vai para o lugar certo. Não é uma questão de ser mais ou menos generoso, é uma questão de se fazer Justiça, inclusive justiça fiscal”, disse Barroso.
“Admitir-se a invalidação de ato de concessão de anistia a quem claramente não é perseguido político não significa que todas as anistias possam ser automática e genericamente anuladas. Significa que é possível a verificação caso a caso se estão presentes os requisitos constitucionais”, acrescentou Barroso.
De acordo com a AGU, o ex-cabos da FAB representam hoje mais da metade de todos os anistiados das Três Forças Armadas, muito embora a Aeronáutica possua um efetivo inferior ao do Exército e Marinha.