Com hotéis lotados e grande expectativa, a cidade gaúcha de São Borja convive desde esta terça-feira, 12, com peritos e autoridades envolvidos na exumação do corpo do ex-presidente João Goulart, morto em dezembro de 1976 em uma de suas fazendas, na Argentina. Do lado de fora do Cemitério Jardim da Paz, um esquema de segurança bloqueava o acesso de jornalistas de várias partes, enquanto dentro dele eram decididos os últimos detalhes da cerimônia marcada para esta quarta, 13, às 7 horas da manhã.
“Já são seis meses de trabalho compartilhado entre especialistas brasileiros e estrangeiros, isso não começa hoje, nem termina amanhã. A exumação representa só uma etapa dentro uma investigação maior”, disse o delegado Amaury de Souza Júnior, do Instituto Nacional de Criminalística (INC), órgão da Polícia Federal. O instituto terá a custódia do material colhido nos restos mortais, no período em que análises periciais tentarão desvendar se Jango morreu por envenenamento, vítima de um plano de eliminação da Operação Condor, ou em consequência dos problemas cardíacos que de fato tinha.
O pedido de exumação foi feito em 2011 pela família Goulart à ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos. Mas, em 2007, os filhos de Jango, Denise e João Vicente, já haviam protocolado pedido de investigação junto ao Ministério Público do Rio Grande do Sul para apurar as circunstâncias da morte do pai. Testemunhos e novos documentos começaram a vir à tona nos últimos anos, comprovando que o ex-presidente sempre foi monitorado por agentes a serviço da ditadura brasileira, nos 12 anos em que permaneceu no exílio, vivendo como fazendeiro entre o Uruguai e a Argentina.
“Disso não temos dúvida, por isso cobramos hoje que esses ex-agentes sejam ouvidos e documentos, desclassificados, não só no Brasil e países vizinhos, mas nos Estados Unidos. Quanto à exumação, com certeza consideramos os indícios de assassinato”, afirmou nesta terça o médico João Marcelo Goulart, neto de Jango, que está acompanhando o trabalho dos peritos.
Para Nadine Borges, representante da Comissão da Verdade do Rio de Janeiro, informações coletadas sobre o monitoramento de Jango no exílio já têm caráter comprobatório: o ex-presidente sempre esteve na mira dos militares brasileiros.
Jazigo
O jazigo da família Goulart, especialmente visitado na data do aniversário de morte do ex-presidente (6 de dezembro), guarda também os restos mortais dos pais de Jango, Vicente Goulart e dona Tinoca, seus irmãos Ivan e Neusa, e seu cunhado, o ex-governador Leonel Brizola (que foi casado com Neusa). O medo da população de São Borja de que agora os despojos de Jango sigam rumo a Brasília, para perícia, e não retornem mais, fez com que o prefeito da cidade, Farelo de Almeida (PDT-RS), tombasse o jazigo, com tudo o que há dentro dele – em decreto assinado semanas atrás. Mas a ministra não só o tranquilizou como afirma publicamente que os restos voltarão a São Borja, no mês que vem, quando Jango deverá ter enterro de chefe de Estado.
Na noite de terça, a comunidade de São Borja reuniu-se em um Centro de Tradição Gaúcha (CTG) para debater a exumação com autoridades, como os ministros Maria do Rosário e José Eduardo Cardozo (Justiça). Cardozo reafirmou a necessidade de prestar as honras de Estado devidas a Jango: “O Brasil jamais esquecerá aqueles que ajudaram a construir a sua democracia”. Garantiu que a presidente Dilma Rousseff fará isso a partir de agora. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.