No depoimento mais aguardado até aqui da CPI da Covid do Senado, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello buscou em diferentes momentos blindar o presidente Jair Bolsonaro.
O general evitou atribuir ao presidente a responsabilidade pelas decisões no enfrentamento da pandemia do coronavírus, inclusive negando tentativa de interferência do chefe do Executivo para ampliar o uso da hidroxicloroquina questão apontada à CPI pelos seus dois antecessores no cargo.
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O presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), decidiu suspender a sessão com o depoimento de Pazuello, que, durante intervalo, sofreu uma perda de consciência momentânea e precisando ser atendido pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que é médico.
Ao deixar a sessão, no entanto, Pazuello afirmou que não passou mal. Caminhando normalmente, o ex-ministro apenas disse que estava bem e que a sessão foi adiada por causa do início da ordem do dia no plenário do Senado.
Aziz postou em suas redes sociais que suspendeu a sessão por causa do início da sessão plenária do Senado e que a CPI ainda tinha 23 inscritos. Por isso, a retomada da CPI foi para esta quinta-feira (20) às 9h30.
Mais cedo, Pazuello participou da sessão da CPI nesta quarta-feira (19) trajando roupas civis e não militares, após adiar sua primeira participação na comissão, ao alegar contato com infectados pelo coronavírus.
Aos senadores o general respondeu todas as perguntas feitas pelo relator, apesar de contar com um habeas corpus do STF (Supremo Tribunal Federal) que permitia a ele o direito ao silêncio em perguntas que poderiam incriminá-lo.
O general Pazuello mentiu em ao menos quatro vezes durante o seu depoimento, como ao afirmar que não recebeu ordem de Bolsonaro relacionada à compra da vacina chinesa Coronavac. Também teve momentos de rispidez ao responder perguntas do relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL).
Na CPI, o general também afirmou que nunca recebeu ordens específicas de Bolsonaro nem mesmo a respeito da hidroxicloroquina. Em hipótese alguma. O presidente nunca me deu ordens diretas para nada, respondeu a Renan.
Pazuello também buscou tirar o foco da comissão dos filhos do presidente. Em depoimentos anteriores, surgiram indícios de um ministério paralelo para aconselhar Bolsonaro na pandemia, fora da estrutura do Ministério da Saúde.
Não havia nenhuma influência dos três filhos políticos do presidente e volto a colocar: Eu achava que eu ia me encontrar mais com eles, tanto com o próprio presidente, mas não houve isso, afirmou.
Até o início da tarde, Pazuello havia mentido ao menos quatro vezes na CPI.
Ele disse, por exemplo, que nunca recebeu ordens de Bolsonaro para não comprar a vacina Coronavac, produzida pelo Butantan e alvo de disputa do governo federal com o governador João Doria (PSDB), de São Paulo.
A fala de Pazuello contraria vídeos públicos do próprio presidente que havia mandado cancelar acordo de intenção de compra.
Em outubro, por exemplo, o Ministério da Saúde anunciou que compraria 46 milhões de doses da Coronavac. No dia seguinte, o presidente falou a apoiadores que não iria comprar, e a pasta voltou inicialmente atrás na negociação.
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Vou explicar para o senhor: uma postagem na internet não é uma ordem. Uma ordem é uma ordem direta verbal ou por escrito. Nunca foi dada. Nunca, afirmou à CPI.
Pazuello afirmou que o Brasil só adquiriu junto ao consórcio Covax Facility vacinas para apenas 10% da população porque o “risco era muito grande”. “A Covax Facility não nos dava nem data, nem cronograma e nem garantia de entrega”, afirmou o general.
O ex-ministro também afirmou que o preço inicial das vacinas era muito alto, em torno de US$ 40 a dose, que acabou caindo posteriormente para US$ 10. “Quem responde a órgãos de controle, não pode achar que o preço é irrelevante”, afirmou. O Brasil adquiriu 42 milhões de doses junto ao Covax Facility.
Além disso, Pazuello afirmou que não se reuniu com funcionários da Pfizer para negociar vacinas porque ministro não pode receber as empresas. Porém, ele se encontrou com o empresário Carlos Wizard, principal defensor da vacinação privada.
Ele disse à CPI que o empresário era um amigo pessoal a quem vem “ouvindo de maneira informal ao longo da vida” e que o ajudou durante um mês no ministério, sem remuneração.
O general também esteve reunido, em maio do ano passado, com empresários em São Paulo para pedir ajuda na compra de equipamentos e de estruturas para a prevenção e o combate do novo coronavírus no Brasil.
Pazuello também afirmou que TCU (Tribunal de Contas da União), CGU (Controladoria-Geral da União), AGU (Advocacia-Geral da União) e todos os órgãos de controle disseram que a proposta da Pfizer para o fornecimento de 8,5 milhões de doses no primeiro semestre não deveria ser assinada. Mandamos para os órgãos de controle, a resposta foi: não assessoramos positivamente. Não deve ser assinado”, disse.
Porém, em nota, o TCU negou a afirmação e disse que em nenhum momento seus ministros se posicionaram de forma contrária à contratação da empresa Pfizer para o fornecimento de vacinas contra a Covid, e tampouco o tribunal desaconselhou a imediata contratação em razão de eventuais cláusulas contratuais.
Sobre a iminência da falta de oxigênio em Manaus, o general disse que só foi informado no dia 10 de janeiro deste ano à noite. Porém ele admitiu no dia 18 de janeiro que soube da possibilidade no dia 8 de janeiro, uma semana antes do dia mais grave de mortes por asfixia em leitos do estado.
“No dia 8 de janeiro, nós tivemos a compreensão, a partir de uma carta da White Martins, de que poderia haver falta de oxigênio se não houvesse ações para que a gente mitigasse este problema”, disse Pazuello em uma entrevista em que respondeu perguntas de apenas quatro jornalistas em janeiro.
Senador pelo Amazonas, Eduardo Braga (MDB) rebateu o ex-ministro, afirmando que mortes por falta de oxigênio foram registradas até o fim do mês.
“O senhor estava lá e viu com seus olhos, os amazonenses morrendo por falta de oxigênio”, afirmou. “Antes a gente ficava dependendo da ajuda do Gusttavo Lima, do Paulo Gustavo”, completou.
O ex-ministro também contrariou informações divulgadas à CPI pelo ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten e pelo gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, em relação à oferta de vacinas.
Pazuello afirmou que a carta com oferta de vacinas da empresa não permaneceu parada por dois meses. Afirmou que a negociação se deu a todo momento e que há documentação no Ministério da Saúde que comprova esses contatos.
O general disse que a pasta que comandava sugeriu alterar a legislação para superar os obstáculos previstos em cláusulas de alguns laboratórios, em especial a Pfizer. No entanto, afirma que outros órgãos do governo recusaram.
“Fizemos a proposta de medida provisória, mas ali na parte jurídica do governo não houve consenso. Decidiram que a [iniciativa] não deveria partir de uma MP nossa. Não havia consenso dos ministérios em mantê-lo e isso foi retirado”, afirmou, em referência à retirada do dispositivo do texto de medida provisória a respeito de vacinas.
Em fevereiro, por iniciativa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), um projeto de lei autorizou o governo a assumir as cláusulas previstas e em seguida o primeiro contrato com a Pfizer foi assinado.
Pazuello também atribuiu à secretaria Mayra Pinheiro, conhecida como “capitã cloroquina”, a criação da plataforma TrateCov, que recomendava uso de cloroquina até para bebês. O aplicativo é um dos pontos mais polêmicos da gestão de Pazuello, e um dos motivos pelos quais ele é alvo de inquérito. Mayra será ouvida nesta quinta (20) pela CPI, e deverá ser questionada sobre isso.
Houve momentos de tensão na sessão desta quarta. Pazuello entrou em bate-boca com senadores da CPI depois de subir o tom ao ser indagado pelo relator sobre a demora na negociação das vacinas com a Pfizer.
Pazuello se irritou ao dizer que não poderia participar diretamente das reuniões com a empresa e disse que Renan “sabe disso”.
“Não posso negociar com a empresa. Ministro jamais poderia receber uma empresa, o senhor sabe disso. Recebo socialmente, junto com a administração, mas a negociação é feita pela equipe”, disse.
Ao receber críticas dos demais senadores, Pazuello disse que retiraria a frase, mas subiu o tom novamente e disse que Renan estava “conduzindo a coversa”. “O senhor precisa compreender a pergunta que fez”, afirmou o general, gerando uma nova discussão.
O ex-ministro justificou o atraso no acordo das vacinas dizendo que sempre houve respostas, mas que a negociação “intensa e direta” envolvia questões como a flexibilização de pedidos e auxílio com a logística de entrega.
O general chegou a pedir que perguntas “simplórias” não fossem feitas a ele durante a oitiva, após ser alertado pelo relator de que alguns questionamentos eram mais diretos, portanto desejava que as respostas também fossem dessa forma.
“Perguntas simplórias gostaria até que não fossem feitas”, disse Pazuello, afirmando que gostaria de contextualizar suas respostas para esclarecer os fatos.
Nesse momento, acabou repreendido pelo presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM). “Vossa excelência não vai dizer o que temos de perguntar ou não”, rebateu o presidente da comissão.
Apesar de contar com um habeas corpus que garante o direito de silenciar em algumas perguntas, para evitar incriminar a si próprio, Pazuello falou que vai responder todos os questionamentos. “Vou responder todas as perguntas, sem exceção”, afirmou.
Em entrevista a jornalistas durante a pausa na sessão, Renan afirmou que ficou claro que Pazuello estava blindando Bolsonaro. “Foi tudo que ele tentou fazer, inclusive divagando, faltando com objetividade nas respostas das perguntas que fazíamos”, disse.
“Ele, infelizmente, mentiu em várias oportunidades e em outras ocultou aquilo que a pergunta queria”, completou o senador. No entanto, ao contrário do que aconteceu durante depoimento de Wajngarten, Renan descarta pedir a prisão do depoente. Afirma que vai reunir as mentiras e incluir em seu relatório final da CPI.