Investigações na Noruega apontam para a suspeita de que cerca de R$ 140 milhões tenham sido pagos em propinas para ex-diretores da Petrobrás, agentes e autoridades no Brasil para permitir que empresas do país escandinavo fechassem acordos com a estatal brasileira.

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O envolvimento de empresas norueguesas na Lava Jato tem abalado a credibilidade do setor privado e da indústria do petróleo, em grande parte responsável pela transformação da Noruega em um dos países mais ricos do mundo.

No centro da investigação está a empresa Sevan Drilling. O Estado teve acesso a trechos confidenciais de uma investigação interna da empresa que aponta que, no total, 300 milhões de coroas norueguesas (R$ 141 milhões) podem ter sido enviadas para contas na Suíça, nas Ilhas Virgens Britânicas, no Panamá e em Mônaco. A suspeita é de que parte importante desse dinheiro tenha sido usada para corromper a antiga direção da Petrobrás.

Segundo a apuração, a empresa Sevan Drilling teria usado Raul Schmidt Felippe Junior, representante da companhia no Rio de Janeiro, para fazer os pagamentos.

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Uma auditoria conduzida pelo escritório Selmer, em Oslo, concluiu que “é provável que pagamentos ilegais tenham sido feitos para garantir contratos com a Petrobrás”. Eles seriam para a compra de instalações para estocagem e navios, além de material para perfuração das subsidiárias Sevan Driller e Sevan Brasil. “Tais atos podem potencialmente representar um crime financeiro”, indicou a auditoria.

No Brasil, Schmidt é apontado pela investigação da Lava Jato como “parceiro” de Jorge Zelada, ex-diretor da área de Internacional da Petrobrás. Juntos, mantinham a empresa TVP Solar, com sede em Genebra. A suspeita é de que ele teria feito parte de operações para camuflar recursos desviados da estatal.

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Origem

Tudo começou mais de uma década antes da Lava Jato. Em 2001, a Sevan Marine foi criada, com o objetivo de construir plataformas para a exploração de petróleo na costa brasileira. No Brasil, a empresa formaria uma subsidiária com Raul Schmidt e outros dois empresários.

Em 2005, a Sevan comemorou o seu maior contrato, o que valorizou suas ações na Bolsa de Oslo. Com a Petrobras, construiu a plataforma de Piranema, num acordo de onze anos que valeria à empresa norueguesa US$ 100 mil por dia. Mas parte das comissões, segundo as investigações, teria ido para uma empresa nas Ilhas Virgens Britânicas, a Etesco.

Em 2007, Schmidt deixou a Sevan e abriu sua própria empresa. Mas, um ano depois, os noruegueses assinaram mais um contrato e colocaram a nova empresa de Schmidt, Global Offshore, como agenciadora para contratos da Petrobrás em águas brasileiras. O valor da comissão seria de 3% de contratos de US$ 975 milhões. A partir de 2010, a Global Offshore Service assumiu os compromissos de comissões também da Etesco.

Internamente, os primeiros sinais de que a comissão poderia ter outro fim apareceram em 2010. Naquele ano, a Sevan Drilling e a Sevan Marine se separaram. Schmidt, por meio de seus advogados, enviou uma cobrança por “comissões atrasadas”.

Em Oslo, a empresa já contava com um novo comando, da executiva Siri Hatlen. Ao receber a cobrança do operador brasileiro, a nova companhia exigiu que Schmidt preenchesse um questionário para garantir o destino do dinheiro. Mas os advogados do brasileiro se recusavam a preencher o documento e o pagamento das comissões foi interrompido.

“Nenhum pagamento foi feito pela Sevan Marine dentro do ‘acordo de agente’ depois de 2010”, disse Siri Hatlen, ao receber o Estado em um escritório no centro de Oslo.

Diante da eclosão do caso no Brasil e a citação do nome da empresa nos documentos da Lava Jato, Hatlen conta que decidiu fazer sua própria apuração, apresentando um comunicado à Bolsa de Valores de Oslo e entregando sua auditoria “para as autoridades norueguesas”.

Mas a Sevan admitiu que, em seu trabalho, não tinha o poder de determinar qual havia sido o destino das comissões depois que foram depositadas nas contas de Schmidt. Essa tarefa, inclusive a de saber se o dinheiro beneficiou partidos e políticos, ficou com a Justiça.

Os dados e o informe chegaram até o gabinete da procuradora anticorrupção da Noruega, Marianne Djupesland, uma celebridade no país por revelar que, na sociedade considerada como uma das mais honestas do mundo, multinacionais estavam dispostas a pagar propinas no exterior para garantir contratos em diversos setores.

Em outubro de 2015, ela e Linn Eckhoff Dolva, agente da polícia, lideraram uma operação de busca e apreensão em três cidades diferentes do país escandinavo, confiscando milhares de páginas de documentos e computadores na sede da Sevan Drilling. Djupesland ainda confirmou que diversos membros da direção da empresa foram interrogados, entre eles Jan-Erik Tveteraas, fundador da companhia e ex-CEO.

Ao receber a reportagem, em Oslo, a procuradora confirmou que o caso começa a ser investigado. “Estamos ainda nos estágios iniciais”, disse. “Confiscamos dados em outubro e agora estamos trabalhando com o material”, explicou. Sua estratégia é a de “seguir o dinheiro’ para determinar quem recebeu os recursos nos paraísos fiscais e por qual motivo. Por isso, já iniciou uma colaboração estreita com a força-tarefa da Lava Jato, em Curitiba, e vai enviar cartas solicitando a cooperação de outros países, como a Suíça.

“Estamos colaborando uma série de países, inclusive o Brasil” disse Marianne. Ela e Linn trabalham com outras sete pessoas dedicadas ao caso da Petrobrás. A suspeita é de que parte do dinheiro teria tido como destino o banco suíço Julius Baer, em nome de Zelada.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.