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Não ousem contestar, diz Bolsonaro em recado ao STF de que irá barrar eventual lockdown nos estados

Foto: Agência Brasil.

Em meio ao segundo dia de depoimento na CPI da Covid do Senado, que apura ações e omissões do governo na pandemia, o presidente Jair Bolsonaro voltou nesta quarta-feira (5) a ameaçar editar um decreto contra medidas de isolamento social tomadas por governadores e prefeitos.

O objetivo, segundo o presidente, seria garantir a realização de cultos e a “liberdade para poder trabalhar”.

Bolsonaro ainda afirmou, em recado ao STF (Supremo Tribunal Federal): “Não ouse contestar, quem quer que seja”.

A fala de Bolsonaro ocorreu em evento no Palácio do Planalto, um dia depois de o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta ter apontado que ele contrariou orientações do Ministério da Saúde baseadas na ciência para o combate à pandemia.

“Nas ruas já se começa a pedir que o governo baixe um decreto. Se eu baixar um decreto, vai ser cumprido, não será contestado por nenhum tribunal”, declarou Bolsonaro, em evento de abertura da Semana das Comunicações.

“O que está em jogo e alguns [governadores e prefeitos] ainda ousam por decretos subalternos nos oprimir. O que nós queremos do artigo 5º [da Constituição] de mais importante? Queremos a liberdade de cultos, queremos a liberdade para poder trabalhar, queremos o nosso direito de ir e vir, ninguém pode contestar isso”, declarou o presidente.

“Se esse decreto eu baixar, repito, [ele] será cumprido. Juntamente com o nosso Parlamento, juntamente com todo o poder de força que temos em cada um dos nossos atualmente 23 ministros”, completou​.

Especialistas ouvidos pelo jornal Folha de S.Paulo afirmam que, apesar da insistência nesses pontos de retórica, não houve alteração no cenário das leis e da pandemia que permitam a Bolsonaro dar “canetadas” sem aprovação do Congresso ou barrar a autonomia de governadores e prefeitos na condução do combate à Covid que inclusive já foi reconhecida pelo STF.

No entanto, eles veem com preocupação o uso frequente desses termos como se fossem equivalentes ao toque de recolher.

Na avaliação de alguns deles, ao banalizar as figuras do estado de sítio e do estado de defesa, apontando que os governadores estariam lançando mão delas, Bolsonaro estaria buscando preparar terreno para legitimar a tomada desse tipo de medida no futuro.

Nesta quarta-feira, em outro momento de seu discurso, sem citar o Supremo, Bolsonaro disse que o reconhecimento da competência de estados e municípios para a adoção de medidas de controle sanitário é uma “excrescência”.

O STF julgou que estados e municípios, assim como a União, têm atribuição para a tomada de decisões referentes ao controle do vírus, entre eles o fechamento de comércios.

Bolsonaro afirmou que, com a proibição de cultos em alguns estados —outra ação avalizada pelo Supremo— “pastores e padres passaram a ser vilões no Brasil”.

Há meses Bolsonaro se mantém em conflito com o Supremo em relação às medidas tomadas em meio à pandemia. Desde o início da crise, o STF tem imposto derrotas ao presidente, que, em declarações, testa os limites da corte.

Um dos casos recentes ocorreu em abril passado quando o ministro Luís Roberto Barroso mandou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), instalar uma CPI da pandemia da Covid-19. A decisão foi uma derrota para a base aliada de Bolsonaro no Congresso, que vinha tentando barrar a comissão para investigar a condução da pandemia.

Em meio à perdas, Bolsonaro repete a ameaça de “baixar um decreto” para que a população voltasse ao trabalho. Também já criou a campanha “O Brasil não pode parar”, que foi proibida pelo STF por colocar a população em risco.

O presidente também tentou blindar dados da pandemia, mas o Supremo derrubou a medida provisória editada por ele, que restringia a Lei de Acesso à Informação (LAI). Ao mudar a forma de divulgar os números de mortes e de contaminados, o STF foi acionado novamente.

Recentemente, a corte trouxe novas imposições ao governo, e obrigou o Executivo a adotar uma série de medidas para conter o avanço do novo coronavírus em aldeias indígenas. O ministro Gilmar Mendes ainda derrubou uma série de vetos de Bolsonaro ao projeto de lei aprovado pelo Congresso que torna obrigatório o uso de máscaras em locais públicos.

As ameaças do presidente ocorrem no dia em que outro ex-ministro da Saúde é ouvido pela CPI no Senado. Na manhã desta quarta, Nelson Teich, oncologista que ficou menos de um mês no cargo, responde a perguntas de parlamentares.

Ainda no discurso desta quarta, Bolsonaro defendeu um de seus filhos, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), citado na véspera por Mandetta como participante de reuniões no Planalto sobre a pandemia.

“São pessoas perseguidas o tempo todo como se tivessem inventado um gabinete do ódio. Não têm do que nos acusar, é o gabinete da liberdade, da seriedade”, disse, mencionando também seu assessor especial Tércio Arnaud, que também atua na estratégia do presidente nas redes sociais.

No final de abril, por exemplo, Bolsonaro já havia feito ameaça semelhante em Manaus. Em mais uma ofensiva contra governadores, afirmou que o Exército pode ir “para a rua” para, segundo ele, reestabelecer o “direito de ir e vir e acabar com essa covardia de toque de recolher”.

A fala do presidente ocorreu em entrevista à TV A Crítica, concedida durante visita do mandatário a Manaus. Nas declarações, Bolsonaro atacou medidas de isolamento social tomadas por prefeitos e governadores e afirmou que pode determinar uma ação das Forças Armadas contra elas.

“O pessoal fala do artigo 142 [da Constituição], que é pela manutenção da lei e da ordem. Não é para a gente intervir. O que eu me preparo? Não vou entrar em detalhes, [mas é para] um caos no Brasil. O que eu tenho falado: essa política, lockdown, quarentena, fica em casa, toque de recolher, é um absurdo isso aí.”

“Se tivermos problemas, nós temos um plano de como entrar em campo. Eu tenho falado, eu falo ‘o meu [Exército]’, o pessoal fala ‘não’… Eu sou o chefe supremo das Forças Armadas. O nosso Exército, as nossas Forças Armadas, se precisar iremos para a rua não para manter o povo dentro de casa, mas para reestabelecer todo o artigo 5º da Constituição. E se eu decretar isso vai ser cumprido”, acrescentou.

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