O subprocurador da República Augusto Aras admitiu, em sabatina no Senado, que assinou sem ler um manifesto da Associação de Juristas Evangélicos que defende “valores cristãos” e a “cura gay” e não reconhece famílias constituídas a partir de relações homoafetivas. O caso, revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo, se tornou a primeira “casca de banana” a Aras, que encontrou um clima favorável no início da sessão que analisa a sua indicação ao comando Procuradoria Geral da República (PGR).
“Eu sou delegado de polícia há 27 anos, eu sou professor de Direito há 20, estou senador da República. Eu tenho muito orgulho da minha família, eu tenho um filho. O senhor não reconhece a minha família como família? Eu tenho subfamília? Porque esta carta diz isso, senhor procurador. E diz mais: estabelece cura gay. Eu sou doente, senhor procurador?”, questionou Fabiano Contarato (Rede-ES) sendo aplaudido por senadores como Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
A carta assinada por Aras foi revelada em reportagem publicada no último dia 10. O documento expõe argumentos contra questões como o aborto, sobre tributação de igrejas, sexualidade, refugiados e ensino, entre outros temas. Entre eles o não reconhecimento de família, na esfera pública, composta por uma união homoafetiva. “A instituição familiar deve ser preservada como heterossexual e monogâmica.”
“Não quero dizer a Vossa Excelência nem a ninguém que não tenha família”, afirmou Aras dizendo que não “leu a pauta inteira” que assinou da associação.
“Minha única ressalva é de ordem formal. Eu me sentiria muito mais confortável por mim e por meus amigos e amigas que têm casamento em todos os sentidos com pessoas do mesmo sexo com uma legislação e com uma norma que eu não leia ‘homem e mulher’, mas leia ‘pessoa, cidadão, cidadã’.”, afirmou Aras.
“A nossa dificuldade aqui e meramente formal. No mais, os meus respeitos à vossa família, aos vossos filhos, que são tão iguais quantos os meus, de hipótese alguma. E nem acredito em cura gay também.”, completou o subprocurador.
Na respostas, Aras defendeu que, no tema identidade de gênero, “cada cidadão possa escolher, na idade adequada, sem influência de quem quer que seja, fazer sua opção de gênero. A tese é contrária a que defende o presidente Jair Bolsonaro que fez da “ideologia de gênero” uma das bandeiras eleitorais.
Contarato rebateu a classificação como uma “opção”. “Quero fazer uma correção. Ninguém me deu o cardápio para eu escolher o que ser ou não. Isso é condição”. Após as falas, os dois se cumprimentaram na mesa da CCJ.
O clima favorável na sabatina na CCJ fez com parte dos 19 parlamentares inscritos deixassem de falar. O senador Wellington Fagundes (PL-MT) chegou a entregar as perguntas a presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS), para que fossem feitas depois.
A situação pró-Aras levou a presidente da CCJ, a pedido dos senadores, abrir o painel de votação para que os parlamentares que quisessem votar saíssem antes de terminar a sabatina.
O governo não mandou nenhum representante. Nem mesmo o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), compareceu nas primeiras horas de sabatina. O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) ficou pouco mais de 40 minutos, votou, e abandonou a sessão no período da manhã.
Família
Augusto Aras chegou ao Senado acompanhado da esposa, a subprocuradora-Geral da República Maria das Mercês de Castro Gordilho, e dois assessores de imprensa apenas dez minutos antes do horário previsto para sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), marcada para às 10h. Sem falar com a imprensa, se dirigiu ao Plenário 2.
Os primeiros senadores a dirigir os questionamentos a Aras – Eduardo Braga (MDB-AM), Esperidião Amim (PP-SC), Rogério Carvalho, Marcos Rogério (DEM-RO) e Major Olimpio (PSL-SP) – elogiaram o nome e fizeram perguntas confortáveis. Apenas Contarato o criticou.
O Plenário 2 da CCJ, que tem espaço para 68 pessoas sentadas ficou lotado durante toda a manhã. Pelo menos 30 senadores passaram pela sala, além de deputados da bancada da Bahia, que estavam acompanhados do presidente do Tribunal de Justiça local; o corregedor do Conselho Nacional de Justiça, Humberto Martins; e representantes de outros órgãos ligados à Justiça.