O Ministério Público Federal no Ceará (MPF/CE) ingressou nesta terça-feira com recurso para que a Justiça Federal julgue a ação movida contra o governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), no caso da inauguração do Hospital Regional Norte, em Sobral, a 240 quilômetros de Fortaleza. Para o evento, o governo estadual contratou a cantora baiana Ivete Sangalo pagando um cachê de R$ 650 mil.
O procurador da República, Oscar Costa Filho, argumenta no recurso que o MPF-CE “tem legitimidade para atuar em defesa do interesse federal relativo à defesa da moralidade e do patrimônio público e social do Sistema Único de Saúde (SUS)”.
Na ação, Costa Filho leva em consideração problemas enfrentados pela Rede Pública de Saúde, e pede que Cid Gomes restitua os cofres públicos o dinheiro gasto com o show. O procurador quer a verba seja direcionada à área da saúde.
A juíza federal Elise Avesque Frota concluiu que não haveria elemento que indicasse que o pagamento do cachê de Ivete Sangalo teria sido realizado com verba da União Federal e que, portanto, a Justiça Federal não teria competência para julgar o caso. Com base nessa interpretação, encaminhou o processo à Justiça Estadual.
“A decisão da juíza contraria”, segundo o Oscar Costa Filho, “o entendimento anterior do Superior Tribunal de Justiça que reconhece que, quando o Ministério Público Federal, órgão da União, figura como autor da ação, a competência para a causa é da Justiça Federal”. Conforme o procurador, “não se confunde competência com legitimidade das partes. Fixada a competência, cumpre ao juiz apreciar a legitimação do Ministério Público Federal, consideradas as suas características, as suas finalidades e os bens jurídicos envolvidos”.
Para Oscar Costa Filho, “o interesse federal não se reduz ao interesse da União. Vai além do interesse de uma pessoa jurídica para alcançar um entidade de funcionamento sistêmico, como é o caso do SUS, de caráter incontestavelmente federal”. Segundo Oscar Costa, a origem dos recursos públicos (estaduais) aplicados no show é irrelevante para definir a competência, diante do fato de terem sido direcionados à iniciativa privada em detrimento do Sistema Único de Saúde. Para corrigir a imoralidade praticada seria necessário que os recursos públicos fossem direcionados para o sistema público de saúde.
O procurador ressalta que “as verbas de fato não eram do SUS, mas de direito passaram a ser, em virtude do desvio de finalidade. No momento em que o governador priorizou a contratação do show, a saúde pública foi preterida e, em razão disso, é que surge a obrigação de ressarcimento do sistema público de saúde”.
Repercussão nacional
Para justificar a contratação de Ivete Sangalo, Cid Gomes utilizou o fato da cantora ser “uma das artistas nacionais mais consagradas da atualidade”. Assim, a inauguração do hospital teria repercussão nacional sendo “um instrumento de ampla divulgação do Hospital Regional Norte e de todos os serviços públicos”.
Para Oscar Costa Filho, “a saúde pública serviu de pretexto para contratação alheia à finalidade dos serviços oferecidos na área da saúde”. Em outro trecho da ação, o procurador afirma que “o motivo do ato administrativo está totalmente em descompasso com a finalidade do fato de inauguração de um hospital que deve oferecer serviços públicos na área de saúde”.
Ele finaliza o recurso destacando que “a verba utilizada para a realização do evento deve retornar ao patrimônio público e ser direcionada ao Sistema Único de Saúde. O fato de os recursos terem sido estaduais em sua origem é irrelevante na medida em que os desvio de finalidade impõe que eles devem ser direcionados para o SUS conforme o pedido da ação judicial”.