O juiz Sérgio Moro autorizou o compartilhamento de provas descobertas na Lava Jato envolvendo a Cemig, estatal mineira de energia, e empreiteiras investigadas na operação com a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). “O compartilhamento com a Assembleia legislativa de Minas Gerais é viável e atende ao interesse público”, assinalou Moro no despacho.
O compartilhamento envolve um documento encontrado pela força-tarefa da Lava Jato na sede da Galvão Engenharia em São Paulo que indica que um consórcio liderado pela Andrade Gutierrez em parceria com a Odebrecht e outras três construtoras teria buscado “interesse político” e “boa vontade” da Cemig para ser contratado em 2002 para as obras da usina hidrelétrica de Irapé, em Grão-Mogol, cidade mineira localizada no norte do Estado.
O material foi encontrado na 7ª etapa da operação, em novembro de 2014, e voltou à tona após um pedido da Assembleia Legislativa de Minas Gerais para ter acesso às investigações da Lava Jato com o intuito de apurar eventuais irregularidades envolvendo a estatal mineira e as empresas investigadas na Lava Jato.
A hidrelétrica com potencial de 399 MW foi construída pelo consórcio que aparece no documento. As obras começaram em 2002 e foram concluídas em 2006 ao custo total de R$ 1,2 bilhão. O documento de quatro páginas intitulado “Breve histórico de UHE Irapé”, traz detalhes do pré-contrato assinado com o consórcio em 1998 e o andamento das negociações com a Cemig antes de ser assinado o contrato com as empreiteiras, em 2002, bem como as metas do consórcio para o período.
Chamou a atenção da força-tarefa da operação a tabela com as “Metas Imediatas” no documento onde aparece a expressão “criar interesse político na contratação do nosso consórcio EPC (sigla para Engineering, Procurement & Construction, uma modalidade de contratação de empresas para empreendimentos) obtendo ‘boa vontade’ (as aspas estão no documento) da Cemig”.
Diante disso, o MPF defendeu o compartilhamento do material com a ALMG “considerando os indícios relativos a negociações e contratos firmados entre empresas participantes do cartel, ora investigadas, e a concessionária CEMIG”, aponta a Procuradoria da República em parecer encaminhado ao juiz Sérgio Moro, que ainda vai decidir se acata ou não o pedido de compartilhamento com a Almg. Questionada sobre as expressões, a Cemig afirmou desconhecer qualquer pressão política, pagamento de comissão ou favorecimento do referido consórcio.
A Galvão, que não participou do consórcio responsável pela construção, não explicou porque o documento estava em sua sede e disse não reconhecer a autoria do material. Já a Cemig confirmou para a reportagem que o consórcio construtor Irapé, formado pelas empresas citadas no documento, foi contratado sem licitação para as obras.
Segundo a estatal, o contrato se deu por meio da Lei 9.074/95, que prevê dispensa de licitação para estatais que participem de concorrência – no caso da hidrelétrica a Cemig, participou do leilão da Aneel – para levantarem preços de bens e serviços a serem contratados para a referida obra.
Além da contratação do consórcio formado por Andrade Gutierrez, Odebrecht, Ivai, Hochtief e Voith Siemens, outra meta do documento foi atingida, que era a contratação do consórcio, sem licitação, para a construção da estrada de acesso ao sítio de obras, bem como para as obras de melhoria da estrada que liga Grão Mogol ao município vizinho de Lelivéldia. Segundo a Cemig, no contrato firmado com o consórcio em 2002 estava prevista a execução destas obras, com o custo total de R$ 11,2 milhões.
Na época que o documento envolvendo a Cemig veio à tona, com exceção da empresa Ivaí Engenharia, que não retornou aos contatos da reportagem, nenhuma das empreiteiras do consórcio quis comentar o teor do documento. A assessoria da Andrade Gutierrez informou que a empresa não comentaria o caso.