A edição desta semana da revista IstoÉ/Dinheiro revelou que 35 mil nomes integram a lista de pessoas que teriam enviado recursos para fora do País pelo Banestado ou, em outra hipótese, recebido dinheiro no exterior por meio das contas usadas no esquema.
De 1996 a 2000, a agência do Banestado em Nova York movimentou cerca de US$ 30 bilhões. As informações divulgadas pela revista foram extraídas do relatório do delegado responsável pelo rastreamento das contas, José Castilho Neto. O documento é a principal matéria-prima da CPI do Banestado, instalada na última quarta-feira, no Congresso Nacional.
As investigações dos procuradores não se limitarão às transferências de recursos do Banestado para políticos e empresários. Outras instituições instaladas em Foz do Iguaçu, como os Bancos Rural e Araucária, também serão rastreadas. Os procuradores pretendem, segundo a IstoÉ, abrir os arquivos do Interbanco (ligado ao extinto Banco Nacional), que também atuava no processo de remessas de dinheiro para o Exterior por Foz do Iguaçu.
De acordo com a IstoÉ, Foz do Iguaçu sempre foi o “paraíso dos doleiros”. Os esquemas suspeitas investigados por Castilho e o Ministério Público Federal, segundo a revista, sempre passavam pelo Banestado e por outros pequenos bancos de Foz, como o Araucária. Segundo a IstoÉ, Foz do Iguaçu foge à regra das operações de remessas de dinheiro ao exterior. Em outras cidades, o Banco Central exige identificação de quem remete o dinheiro e, nas operações legais, a origem dos recursos tem de ser comprovada à Receita Federal.
“Nos grandes centros, é muito pouco comum fechar negócios com dólares em espécie. Em Foz do Iguaçu, ao contrário, muitas operações são feitas em cash, com recursos provenientes do caixa dois dos financiadores de campanhas políticas ou do crime organizado. Uma mala repleta de dólares não causa surpresa por lá. É esse dinheiro, muitas vezes sem origem legal, que faz girar a economia local e a roleta dos cassinos da região. A cidade paranaense, além das cataratas, é conhecida por ser o ninho dos doleiros no Brasil. E, na caça aos US$ 30 bilhões, já foram também rastreados, além dos 35 mil nomes, 1,5 milhão de transações financeiras suspeitas”, diz a reportagem.
Mapeamento
De acordo com a revista, Castilho Neto fez uma busca nos arquivos do Banestado do Brasil e da agência de Nova York que resultou em um mapa do funcionamento do esquema de lavagem de dinheiro no país. Entre os 35 mil nomes, estão políticos e grandes empresários brasileiros. Uma força-tarefa da Procuradoria da República, liderada pelo procurador Luiz Francisco de Souza, está preparando os inquéritos civis públicos. Autoridades, políticos e governantes que estiverem envolvidos nas irregularidades serão denunciados por improbidade administrativa.
A IstoÉ informa ainda que, em Curitiba, um outro grupo de oito procuradores, liderado por Vladimir Aras, está encarregado de preparar os inquéritos criminais. Conforme a revista, há ainda um procurador em Cuiabá, Pedro Taques, auxiliando nas investigações. Isso porque, nas planilhas, haveria um número significativo de autoridades do Mato Grosso na lista. A reportagem menciona que o procurador Celso Antônio Três, que iniciou as investigações sobre as CC-5 e hoje está lotado em Santa Catarina, tem trabalhado como consultor do grupo.
A lista de 35 mil nomes suspeitos de envolvimento no esquema de lavagem de dinheiro foi repassada também à Receita Federal, que terá trinta dias para informar se estas pessoas declararam os valores ou não. Quem não tiver declarado os recursos mantidos no Exterior será denunciado pelo crime de sonegação fiscal. O Ministério Público também vai cruzar os 35 mil nomes com a relação de todos os candidatos a cargos eletivos desde 1996, período em que o volume de remessas começou a aumentar consideravelmente.
Roteiro
A IstoÉ mostra que a planilha montada pelos policiais começa pelo que os investigadores americanos chamam de smurfs accounts (contas de anões) os “smurfs”, aqueles anões azuis dos desenhos animados, são, nos Estados Unidos, o que se conhece no Brasil como “laranjas”. Com CPFs falsos, os tais smurfs abriam contas na agência do Banestado em Foz do Iguaçu, na fronteira com o Paraguai e a Argentina. Em seguida, pediam autorizações para movimentar contas CC-5, aquelas que permitem remessas para o exterior sem que seja declarada a finalidade.
Os dólares então seguiam para vários correntistas da agência do Banestado em Nova York e, de lá, para outras contas em bancos americanos. Uma das contas que mais chamou a atenção da Polícia Federal e dos procuradores da Polícia de Nova York e era denominada de “Tucano”, registrada na agência de NY do banco JP Morgan Chase. Entre 1996 e 1999, passaram pela conta US$ 176,8 milhões. Esses recursos, segundo a revista, foram distribuídos para 70 empresas em paraísos fiscais.
A Polícia Federal teria indícios de que a conta “Tucano” tenha sido usada na última campanha presidencial do PSDB. Uma das operações que levantou a suspeita foi a transferência de US$ 18,2 mil para a jornalista Valéria Monteiro, que apresentou os programas eleitorais do partido e a campanha do candidato a presidente da República José Serra, no ano passado. A Polícia Federal, segundo a IstoÉ, acha que há envolvimento de Ricardo Sérgio de Oliveira, tesoureiro das campanhas presidenciais do PSDB, e ex-diretor da área internacional do Banco do Brasil.
Investigação começou no Paraná
A CPI do Banestado instalada na Assembléia Legislativa no início do ano não se restringe a análise das Contas CC-5 e às suspeitas de que tenham servido à lavagem de dinheiro. Investiga também operações consideradas irregulares, inclusive as que envolvem a Banestado Leasing e a compra dos chamados “títulos podres” apontados pela CPI dos Precatórios do Senado Federal, e o processo de saneamento e privatização do banco, que ocorreu em outubro de 2000, com sua compra, via leilão, pelo Banco Itaú.
Foram ouvidos ex-diretores e ex-presidentes do banco, um grande número de gerentes, a ex-diretora de Fiscalização do Banco Central, Tereza Grossi, o procurador da República Celso Três, o delegado da Polícia Federal José Francisco Castilho Neto e o perito da Polícia Federal, Renato Rodrigues Barbosa. Eles atuaram também na Operação Macuco, que começou a levantar as irregularidades em Foz, após as denúncias de Celso Três. Os dois e o procurador Celso Três trouxeram as principais informações sobre a lavagem de dinheiro e alertaram as autoridades estaduais para a remontagem do esquema passando pelo Paraná e sob o comando de alguns dos cabeças do esquema anterior.
Castilho Neto e Barbosa, desde o depoimento que prestaram á comissão há duas semanas passaram a assessora-la na questão das contas suspeitas. Por sugestão dos dois, a CPI requereu a quebra do sigilo bancário de toda a documentação levantada pela força-tarefa que atuou nos Estados Unidos e que se encontra em Curitiba, sob a guarda do Ministério Público Federal. Nesses relatórios, segundo Castilho e Barbosa, está contido um verdadeiro mapa da corrupção no País. Segundo o presidente da CPI estadual, deputado Neivo Beraldin (PDT) tão logo fique pronto, o relatório com a conclusão dos trabalhos será encaminhado à CPI mista do Congresso.