Se a lei que torna inelegível o político com pendências na Justiça fosse aprovada pelo Senado e entrasse em vigor antes das eleições deste ano, de 15% a 20% dos candidatos registrados teriam problemas para participar do pleito. A estimativa é do secretário-geral da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), juiz Paulo Henrique Machado, com base nos números preliminares colhidos junto aos 3.200 juízes eleitorais do País.
A associação vem solicitando a todos os juízes eleitorais as informações sobre os registros de candidatos a prefeito e vice-prefeito e as certidões criminais de cada candidato para divulgar à sociedade a lista dos políticos com ?ficha suja? que vão disputar prefeituras neste ano. A AMB promete disponibilizar a lista no dia 15 de agosto. Com os dados recebidos até agora, Paulo Henrique Machado aponta que um em cada cinco candidatos tem problemas com a Justiça.
A lei atual determina que um político só se torna inelegível se condenado em última instância – quando não é mais possível recorrer. Na última terça, porém, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou projeto que altera esta lei. Pelo texto, que ainda precisa ir a votação no plenário da Casa e na Câmara, fica proibida a candidatura de políticos condenados – ainda que em primeira instância – por crimes eleitorais, corrupção, improbidade administrativa ou com penas superiores a dez anos de detenção.
O tema voltou à tona no início de junho, quando, respondendo a consulta, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) manteve, por 4 votos a 3, o entendimento de que as candidaturas de políticos com ?ficha suja? devem ser permitidas, a menos que eles já tenham sido condenados sem possibilidade de recorrer.
A AMB entrou com liminar no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão. O texto deve ir a votação no Supremo em agosto. A comissão do Senado, então, decidiu votar o projeto de lei a respeito, que há anos tramita na Casa.
A secretário-geral da AMB revelou que tem havido algumas dificuldades para receber as informações, inclusive por pressões políticas locais. ?Há um receio, uma preocupação com a divulgação, o que não faz sentido, já que é uma questão de garantir o acesso a informações que são públicas?, diz o magistrado.
O juiz rebate o argumento de que impedir a candidatura antes da sentença final seria uma ?condenação prévia?. Segundo ele, ?é preciso fazer uma ponderação de valores. Qual dano seria maior? Uma pessoa não poder se candidatar, apesar de ainda não ter sido condenada em definitivo, ou essa pessoa ser eleita e cometer danos irreparáveis??. ?O cidadão comum não pode prestar um concurso para policial se tiver inscrição no Serasa, e o político vai ao tribunal e diz: ?Estou resolvendo isso, ainda não há uma condenação definitiva?, e fica tudo bem?, compara Machado.
Comissão do Congresso pendurada no STF
Congresso em Foco
Uma das comissões mais importantes do Congresso Nacional, que tem a responsabilidade de examinar e emitir parecer sobre os gastos da Presidência da República e os programas que recebem verbas federais, a Comissão Mista do Orçamento (CMO) tem metade de sua mesa diretora envolvidas em processos no Supremo Tribunal Federal (STF).
Com a nomeação do senador Marconi Perillo (PSDB-GO) para o posto de primeiro vice-presidente, a CMO terá dois assentos da presidência do colegiado composta por parlamentares com processos na corte responsável pelas denúncias que envolvem deputados e senadores devido ao foro privilegiado.
O senador – que integra pela primeira vez a CMO – responde a três inquéritos abertos no STF por crimes contra a administração pública, licitação pública, corrupção ativa e passiva. Além dos inquéritos, também tramita no STF uma petição em que o parlamentar é investigado por crimes eleitorais cometidos em 2006. Todos os quatro processos correm em segredo de Justiça.
O senador Gim Argello (PTB-DF), que assumiu que ocupa o cargo de terceiro vice-presidente é o outro integrante da presidência da comissão às voltas com a Justiça. Contra o petebista tramita inquérito no STF em que é acusado de crime contra o patrimônio e apropriação indébita. Peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele classifica o processo como acusações com objetivos políticos, ocorridas às vésperas das eleições de 2002.
Argello assumiu o cargo de senador após renúncia de Joaquim Roriz (PMDB-DF), acusado de participação em um esquema de desvio de recursos do Banco de Brasília (BRB), investigado pela Operação Aquarela, da Polícia Civil do Distrito Federal e do Ministério Público Federal. Gim Argello também é suspeito de participar do esquema.
Mais casos no Congresso
Mas o fato de ter parlamentares que respondem a processos na Justiça não é uma prerrogativa da presidência da CMO. Levantamento do site Congresso em Foco mostra ainda que quase metade dos congressistas escolhidos para elaborar os relatórios setoriais – que irão compor o relatório final – da proposta orçamentária da União para 2009, também responde a processos na alta corte. Dos dez relatores setoriais, quatro são acusados de terem cometido crimes contra o patrimônio e o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e apropriação indébita.
Além deles, outros seis integrantes da comissão, composta por 30 deputados e dez senadores titulares, também são alvo de investigação. Na relação, constam três membros dos comitês criados no âmbito do colegiado para fiscalizar a execução orçamentária, avaliar a receita e a admissibilidade das emendas parlamentares.
Para a deputada Luciana Genro (RS), líder do Psol na Câmara, ter um parlamentar com processo na Justiça na presidência das comissões do Congresso não causa espanto. ?Para mim não me surpreende, o Senado já mostrou que não está preocupado com a conduta ética de seus integrantes quando absolveu Renan Calheiros (PMDB-AL). Mas isso também acontece aqui na Câmara?, disse, referindo-se aos seis processos arquivados no Senado, em 2007, contra o senador alagoano.
A deputada lembrou que o Psol tem feito a sua parte apresentando denúncias ao Conselho de Ética do Senado apontando possíveis quebra de decoro. Mas ela lamentou que o Conselho, que já havia absolvido Renan Calheiros, arquivou a denúncia contra Marconi Perillo.