Um mês antes do estouro da Operação Lava Jato, o laboratório Labogen – carro-chefe do esquema de lavagem de R$ 10 bilhões, segundo a Polícia Federal -, divulgou anúncio em jornais da região de Indaiatuba, onde fica sua sede, informando o sumiço de dez livros contábeis da empresa.

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A nota endereçada “ao mercado em geral, para os devidos fins” foi publicada no dia 18 de fevereiro na cidade do interior de São Paulo. Sob o título “Comunicado de extravio de livros’, o laboratório, registrado com o nome Labogen S/A Química Fina e Biotecnologia, destaca que naquela data foi constatado o extravio dos livros da companhia – documentos que incluem atas de assembleias gerais, registro de ações nominativas e livros razão (agrupamento de anotações contábeis).

A Lava Jato foi deflagrada na madrugada de 17 de março. Os investigadores estranham o desaparecimento da papelada, que coincidiu com o avanço da operação. Suspeitam que a ocorrência pode ter sido forjada para tentar despistar que o verdadeiro controlador do laboratório é o doleiro Alberto Youssef.

A PF descobriu que Youssef tentou emplacar contrato milionário no Ministério da Saúde, na gestão do então ministro Alexandre Padilha, no âmbito de Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDPs).

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Em setembro de 2013, os investigadores interceptaram comunicações que mostram como estava adiantada a negociação entre a organização liderada por Youssef e a pasta.

No dia 9 daquele mês, Raquel Damasceno Pinheiro, em nome do ministério, enviou e-mail para o administrador do Labogen, Leonardo Meirelles. “A pedido do dr. Eduardo Jorge Valadares Oliveira, diretor do Departamento do Complexo Industrial e Inovação em Saúde, encaminho para seu conhecimento cópia do ofício 237/13, emitido em 6 de setembro/2013.

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O ofício mencionado no e-mail era subscrito pela diretora substituta do Departamento do Complexo Industrial – órgão do Ministério da Saúde -, Nadja Naira Valente Bisinoti, que solicitava um “agendamento de visita técnica na unidade fabril desta empresa em 20 de setembro de 2013, das 14h30 às 17h30”. O objetivo da inspeção era “verificar a viabilidade do laboratório (Labogen) em atuar em PDPs”.

A PF captou troca de e-mail entre Meirelles e um advogado da organização logo após a notícia do agendamento da visita do Ministério da Saúde. Para os investigadores, o conteúdo dessas correspondências confirma que o Labogem era fachada.

“Vamos todos pra lá a partir de quarta”, afirmou Meirelles. O advogado respondeu. “Se precisar eu boto o capacete e o macacão e caio pra dentro da obra tb. Retroceder nunca, render-se jamais.”

O negócio, que acabou não sendo fechado, não seria executado pelo Labogen, mas por uma indústria farmacêutica de grande porte que fecharia parceria com o laboratório.

A PF não tem dúvidas de que o doleiro exercia o domínio do laboratório. Um investigador suspeita que o extravio dos livros contábeis pode ser uma tentativa da organização de Youssef em afastar a alegação de que o Labogen é de fachada. “Eles querem arrumar um argumento para justificar que não são de fachada”, avalia.